Frente ao aumento de índices de criminalidade – retratado pelo assassinato de uma mãe ao buscar os filhos no colégio – e à carência de efetivo policial, o governador José Ivo Sartori deve pedir ao presidente interino Michel Temer o envio de tropas da Força Nacional ao Estado.
A ideia vinha sendo rechaçada pelo governo estadual desde 2015. A maioria dos gaúchos, porém, quer o pedido de ajuda federal, segundo levantamento do Instituto Index. Em uma pesquisa com cerca de 2 mil pessoas feita em fevereiro, 77,6% disseram querer a vinda da Força Nacional.
Criada em 2004, a divisão existe para atender a chamados emergenciais e pedidos de reforço urgentes na segurança dos Estados. Porém, é preciso um pedido oficial do governador. A 3,5 mil quilômetros daqui, Alagoas contou, por cinco anos, com a presença das tropas federais. Mais do que pedir a ajuda emergencial (o reforço sempre é autorizado para situações específicas e por tempo determinado), os profissionais treinados estão lá há mais de cinco anos, com renovações do pedido a cada 90 dias. Os índices de criminalidade entre os dois Estados estão longe de se equipararem – a taxa de assassinatos em 2014, de quando são os levantamentos mais recentes, foi três vezes maior em Alagoas: 61,9 a cada 100 mil habitantes, frente a uma taxa de 20,9 no RS, conforme dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
O principal ponto é que, enquanto o índice alagoano de homicídios tem caído, o gaúcho se multiplicou. Parte disso, na avaliação do presidente do Conselho Estadual de Segurança Pública de Alagoas, o advogado Antônio Carlos Gouveia, é atribuída à chegada da Força Nacional àquele Estado.
– Não podem fazer milagre, mas são estratégicos – aponta Gouveia.
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Ele se refere à pequena proporção do reforço: em fevereiro, cerca de 150 policiais da Força Nacional atuavam em Alagoas, que possui um efetivo de 7,3 mil PMs.
– Eles (agentes da Força Nacional) trazem a bagagem de experiência de atuação em áreas de conflito, em favelas, em presídio. São profissionais mais treinados e com vontade de servir – esclarece.
Além do policiamento ostensivo, os aproximadamente 170 agentes – o número exato não é informado pelo Ministério da Justiça por estratégia de segurança – atuam nas delegacias, na perícia e nos bombeiros. Nesses locais, têm autonomia para fiscalizar, investigar e prender, conforme o planejamento da Secretaria de Segurança.
Inchaço na folha não permite novas contratações
O "pouco" que a Força Nacional acrescenta no quadro de servidores de Alagoas é comemorado: a Lei de Responsabilidade Fiscal, conforme Gouveia, impede o governo de realizar novas contratações, já que o limite de gastos com pessoal está no limite. Além do efetivo, os convênios assinados por meio do Brasil Mais Seguro garantiram recursos na casa dos milhões, incluindo novas viaturas, equipamentos, Instituto Médico Legal e até presídio.
A Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) acredita que o efetivo – quase metade do ideal, que seria de 37 mil – é justamente um dos motivos que o governo teria para chamar a Força Nacional. A falta de PMs ainda é agravada pela transferência de policiais do Interior para a Região Metropolitana, aumentando a fragilidade nos pequenos municípios. Caso a Força viesse, alerta a Famurs, seria necessário replanejar a distribuição do policiamento.
Em nota, o secretário executivo do Gabinete de Gestão Integrada do RS, tenente-coronel Alexandre Aragon, que comandou a Força Nacional, o programa Brasil Mais Seguro obedece critérios, como maiores índices de criminalidade, e o Rio Grande do Sul não se encontra entre os Estados prioritários, como é o caso de Alagoas. Para Aragon, a violência em Alagoas é cultural, originada da própria formação do Estado, "em que pouco mais de uma dezena de famílias dominam o crime" e por isso a necessidade de uma "força externa".
A vinda de tropas da Força Nacional não deve ser vista como uma solução mágica, segundo o o ex-secretário nacional de Segurança Pública e consultor José Vicente da Silva Filho. Para ele, o envio de um reforço ao Rio Grande do Sul não teria efeito na redução da criminalidade "nem que viessem 500 policiais, o que é difícil" – já que o efetivo atual da Brigada Militar passa de 20 mil.
– A Força Nacional não tem capacidade de gerar uma mudança. É um blefe que estão vendendo. Houve uma reestruturação das polícias em Alagoas, isso fez a diferença.
Apoio à iniciativa se deve à sensação de insegurança
O que explicaria o apoio maciço à presença da Força Nacional no Estado, na opinião dos especialistas, é a sensação de insegurança dos gaúchos.
– Do jeito que as coisas estão, qualquer coisa que se apresente como remédio vai ser apoiado. Mas isso não quer dizer que, atendendo a esse desejo da população, o problema vai ser resolvido. É preciso melhorar a gestão, o planejamento estratégico – conclui José Vicente da Silva Filho, ex-secretário nacional de Segurança Pública.
Sócio-diretor do Instituto Index, Caco Arais encontra nas respostas de outras perguntas da mesma pesquisa a razão para o apoio à Força Nacional. Para ele, o contexto leva a isso: quase 69% responderam que já foram assaltados, cerca de 50% não confiam na Brigada Militar e na Polícia Civil, 48% acham que a falta efetivo é o maior problema da segurança e 72% acham que a violência vai aumentar.
– A pessoa pensa: estou com medo, estou sendo assaltado, não confia na polícia e a situação vai piorar, então ter mais soldados fardados na rua vai ajudar – avalia Arais. – Se tivesse uma pergunta que fosse sobre colocar a Guarda Municipal a prender criminosos, a resposta provavelmente seria sim.
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