Problemas de saúde decorrentes do cigarro eletrônico vêm sendo uma queixa cada vez mais comum entre pacientes que procuram atendimento na área da pneumologia. No Rio Grande do Sul, especialistas já observam diferentes casos de complicações, hospitalizações e até mortes pelo uso dos dispositivos conhecidos como vapes. Os profissionais alertam que existe uma dificuldade maior para largar o vício nesses produtos, devido à quantidade de nicotina que liberam.
O debate em relação aos cigarros eletrônico voltou à tona nas últimas semanas, em função da possibilidade de votação do projeto de lei que permite sua comercialização no Brasil. O texto estava na pauta da reunião de terça-feira (20) da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, mas a discussão foi novamente adiada – a nova data prevista é 3 de setembro.
De acordo com Manuela Cavalcanti, pneumologista da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e presidente da Sociedade de Pneumologia e Tisiologia do Rio Grande do Sul (SPTRS), o cigarro eletrônico foi apresentado para a população como uma alternativa para parar de fumar o cigarro tradicional, sem que houvesse nenhum estudo comprovando sua segurança. A ideia de que seria “mais seguro” surgiu porque não havia a queima do cigarro, mas, com o passar do tempo, foi percebido que os dispositivos também estão associados a muitos riscos:
— Entre eles, dano pulmonar e cardiovascular, doença respiratória crônica. E isso ocorre mesmo para fumantes passivos. Pessoas que convivem com quem utiliza esses dispositivos têm mais sintomas respiratórios do que quem não convive.
O cigarro eletrônico é considerado pior do que o convencional porque a quantidade de nicotina presente no primeiro é muito maior: um pod (dispositivo descartável com número limitado de tragadas) chega a equivaler a cinco carteiras de cigarro e há pessoas que fumam até dois pods por dia, afirma a pneumologista. É isso que faz a dependência aos dispositivos ser tão grande, tornando ainda mais difícil parar de usar.
Manuela esclarece que os caminhos para largar a dependência são os mesmos do cigarro convencional, porque não há nenhum tratamento específico que já tenha sido testado para os dispositivos eletrônicos.
Há medicações de auxílio que podem ser utilizadas, como a nicotina em forma de adesivo ou para consumo oral –gomas de mascar e pastilhas de uso sublingual. Além de remédios que modulem os sintomas da síndrome de abstinência, como antidepressivos.
Marcelo Basso Gazzana, pneumologista e chefe do Serviço de Pneumologia e Cirurgia Torácica do Hospital Moinhos de Vento, acrescenta que a terapia cognitivo-comportamental também é bastante utilizada, já que alguns pacientes apresentam uma “dependência comportamental e psicológica”. O especialista também comenta que as terapias precisam ser adaptadas para a população que está em tratamento – no caso do vape, costumam ser pessoas mais jovens.
— Em termos de recomendação, seguimos as mesmas etapas usadas para abandonar o cigarro tradicional. É preciso ver em qual estágio o paciente está, se ele está prevendo parar no próximo mês ou nos próximos meses. Depois, tem suplementação de recaída. O que é um pouco diferente, às vezes, é a questão do cálculo que normalmente se usa para reposição de nicotina — esclarece Gazzana.
Os especialistas reforçam a importância de realizar um acompanhamento multidisciplinar e de estabelecer uma data específica para parar de usar. O pneumologista do Moinhos de Vento também recomenda que se evite comportamento paralelos, que possam ser “gatilhos”. Um exemplo é o café, quando a pessoa sempre usa o dispositivo enquanto toma a bebida.
Dicas dos especialistas
- Para Gazzana, o primeiro ponto é evitar experimentar o cigarro eletrônico, já que as chances de causar dependência são altas, sobretudo em pessoas mais novas
- Diante da dependência, se conscientize sobre a importância de parar de fumar
- Procure um profissional de saúde que possa auxiliar nessa transição – algumas pessoas conseguem espontaneamente, mas outras, precisam de apoio
- Escolha um dia próximo para parar de fumar. Às vezes, ajuda se for uma data importante, como seu aniversário, e começar a reduzir antes de chegar o dia estabelecido
- Avise aos familiares e amigos que vai parar em determinada data, isso faz com que você assuma um compromisso consigo e com os outros
- Evite comportamentos que estejam associados ao uso do dispositivo. Tente identificar os “gatilhos” e fuja deles
- Busque fazer outras atividades quando sentir vontade de fumar. Exercícios físicos e momentos de lazer são boas opções
- Especialmente no início do processo, evite ficar perto de pessoas que utilizem o dispositivo
- Busque acompanhamento psicológico – grupos de apoio também podem ajudar nesse processo