Correção: no Brasil, foram consumidos 350 milhões de litros de vinho em 2015. Na França, foram 2,7 bilhões de litros e, nos EUA, 3,3 bilhões, segundo a Wine Consumption. As vinícolas gaúchas venderam, no mercado interno, 296 milhões de litros de vinhos, espumantes e sucos em 2016. Os números errados de consumo e vendas permaneceram publicados entre as 15h10min do dia 8/9/2017 e as 11h do dia 9/9/2017. O texto foi corrigido.
Pode pegar a taça e brindar: cada vez mais pesquisas indicam que beber vinho moderadamente faz bem para a saúde. A bebida feita a partir da fermentação da uva tem sido estudada ao longo das décadas e seu fator de proteção ao coração tem ficado mais evidente. Mas, apesar dos resultados otimistas, ainda é preciso uma dose de parcimônia por parte dos consumidores para não passar do limite sutil entre benefício e prejuízo.
O primeiro estudo a impactar o mundo com informações sobre as vantagens do vinho foi feito na década de 1980. Intitulada Paradoxo Francês, a pesquisa relacionou o consumo da bebida à menor taxa de mortalidade por problemas cardiovasculares entre a população da França. Os estudiosos buscaram entender por que os franceses, mesmo consumindo muita gordura, tinham índice de morte por fatores cardíacos semelhante ao de países mediterrâneos, nos quais a dieta é rica em vinho – e a ingestão da bebida foi apontada como resposta.
Mas o levantamento foi alvo de muitas críticas: por tratar-se de um estudo de observação não controlado – no qual uma determinada população foi observada por um período para apontar as diferenças entre o começo e o fim da pesquisa –, ele tem algumas limitações. Estilo de vida, menos estresse e prática de atividades físicas podem coincidir com o hábito de consumir vinho, interferindo no resultado final.
Leia também:
Assim como vinho, suco de uva é aliado da saúde
Leitores indicam bons roteiros de enoturismo pelo mundo
Dieta com base em gorduras ganha cada vez mais adeptos
Apesar da controvérsia, o Paradoxo Francês foi o ponto de partida para diversos cientistas investigarem e conhecerem mais a fundo as propriedades da bebida. No Brasil, embora o consumo não seja comparável ao francês – aqui, bebe-se 350 milhões de litros ao ano contra 2,7 bilhões no país europeu, segundo dados de 2015 da instituição Wine Institute, dos Estados Unidos –, não faltam iniciativas de pesquisa que apuram os benefícios do vinho e do suco de uva.
Coração protegido
Pesquisador do tema há 18 anos, o professor do Instituto do Coração (Incor) de São Paulo Protásio Lemos da Luz desenvolveu diversos experimentos com o vinho. Um deles, feito com coelhos, mostrou que os animais submetidos a uma dieta rica em colesterol e que ingeriram vinho ou suco de uva tiveram menos placas de gordura na aorta, fator de risco para desencadear um acidente vascular cerebral (AVC) e outros problemas cardíacos, como infarto.
Outra pesquisa, desta vez realizada com humanos, analisou uma amostra composta por um grupo de jovens com colesterol aumentado. Os efeitos do consumo também foram bons.
– Por 15 dias, demos alternadamente para as mesmas pessoas 250 ml de vinho e 500 ml de suco de uva. Concluímos que as duas bebidas aumentam a dilatação arterial, que é extremamente importante – descreve Da Luz.
Bebedores de vinho também demonstraram HDL (colesterol bom) maior e glicemia mais baixa em relação aos abstêmios, de acordo com a conclusão de mais uma investigação que Da Luz coordenou. A pesquisa confrontou o aspecto das coronárias de apreciadores da bebida versus pessoas que não bebiam.
Além disso, o vinho consegue barrar o acúmulo das plaquetas, componentes do sangue que ajudam a interromper o sangramento. O chamado poder antiagregante plaquetário é fundamental para pessoas com doença coronariana, pois evita a acumulação de plaquetas, o que pode levar ao infarto.
De acordo com a biomédica Caroline Dani, que estuda a bebida há mais de 13 anos, o segredo da proteção reside nos polifenois da uva, compostos químicos que funcionam como sistema de defesa das plantas contra os fatores externos, como as intempéries. No processo de elaboração dos derivados da fruta, esses agentes, que ficam na casca e na semente, são transferidos para o produto. Como tem álcool, o vinho mantém mais os polifenois do que o suco, extraído a partir do calor. Essas substâncias têm poder anti-inflamatório, antioxidante e antimicrobiano.
Não bastasse a proteção ao coração, a bebida também parece agir contra a obesidade: testes feitos na China e publicados em 2015 no International Journal of Obesity sugeriram que o resveratrol, um dos componentes da uva, impulsiona a perda de peso.
Leia mais:
Com duas vinícolas renomadas, Pinto Bandeira é atração na Serra
Taxas desejáveis de colesterol ficam mais rígidas com novas diretrizes
Nova técnica de redução de estômago por endoscopia é testada no Brasil
Somente doses moderadas são seguras
A grande polêmica que envolve o tema e provoca divergências entre pesquisadores é a existência de álcool na bebida. Para uns, o vinho é comprovadamente benéfico ao organismo, enquanto que, para outros, não há bebida alcoólica que possa trazer vantagens. O que se sabe até agora é que todos os benefícios comprovados pela ciência estão relacionados a doses moderadas da bebida ingeridas com regularidade.
O pesquisador Protásio Lemos da Luz garante que a porção diária de álcool tolerada pelo nosso organismo é de, no máximo, 30 gramas. Dentro desse limite, segundo ele, não há prejuízos. Caroline Dani completa:
– O consumo seguro de vinho é de 150 ml para mulheres e de 200 ml a 300 ml para homens, por dia. Acima disso, deixam-se os benefícios e passa-se a ter prejuízos. Fica o alerta que uma garrafa inteira no fim de semana não traz nada de positivo. Muito pelo contrário. – Dentro da faixa considerada segura, não há evidências de que faça mal. É como qualquer remédio: se eu tomar diurético demais, por exemplo, vai fazer mal – ilustra Da Luz.
A respeitada American Heart Association, entidade norte-americana formada por cardiologistas que têm como objetivo lutar contra doenças do coração, pondera dizendo que os resultados das pesquisas podem não considerar outros fatores de estilo de vida, como alimentação, atividade física e ingestão de gorduras. A instituição afirma que nenhuma comparação direta foi feita para determinar o efeito específico do vinho ou de outro tipo de álcool no risco de desenvolver doença cardíaca ou infarto.
Dados de 2016 mostram que as vinícolas gaúchas (responsáveis por 90% da produção nacional) venderam no mercado interno mais de 296 milhões de litros de vinhos, espumantes e sucos. As informações são do Cadastro Vinícola, mantido em parceria com Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Irrigação (Seapi-RS).
Em 2015, os registros do Wine Institute, da Califórnia, mostraram os Estados Unidos como líderes mundiais. Por lá, foram bebidos 3,3 bilhões de litros de vinhos, espumante, vinho de mesa e outros fermentados. Nessa lista, o Brasil fica apenas na 16ª colocação. A hermana Argentina ficou na 7ª.