No Brasil, ela é muito utilizada para simbolizar ambientes, materiais e serviços voltados à população idosa. Fica ali, na mão do bonequinho curvado para frente, na indicação do assento preferencial nos ônibus urbanos ou no metrô. Mas, ironicamente, a bengala que remete à decrepitude é uma aliada na busca por autonomia, jovialidade e segurança para quem já tem certa idade ou enfrenta algum problema crônico ou momentâneo de mobilidade. Por fatores culturais, esse objeto é bastante desprezado.
– As pessoas associam à velhice e à incapacidade e, muitas vezes, preferem andar menos e viver com dor do que adotá-la. Perdem os benefícios que ela oferece – comenta Jamil Natour, professor de reumatologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
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Há alguns anos, Natour coordenou uma pesquisa sobre o uso da bengala por pessoas com artrose de joelho que ajudou a quebrar o paradigma de que o acessório exigia mais gasto de energia. Muito da desistência das pessoas em adotar esse apoio, explica Natour, ocorre pela falta de um período de adaptação adequado, e alguns médicos até ficam com receio de indicá-lo para pacientes que têm restrição a esforços, como cardiopatas. Sim, usar a bengala exige mais energia, mas só inicialmente. Depois da adaptação, o gasto energético se equivale. O estudo, que envolveu 64 pacientes, foi publicado na revista Annals of the Rheumatic Diseases, uma das mais respeitadas na área de reumatologia.
– Se a pessoa não quiser usar a bengala ao menos por um mês, ela não vai se adaptar – ressalta o professor.
Em uma das etapas da pesquisa, observou-se que a dor havia diminuído de 20% a 30% entre os voluntários que utilizaram a bengala, e o consumo de analgésicos havia sido menor entre esses indivíduos quando comparado ao grupo que não usou o apoio. Também houve uma melhora de 20% na capacidade funcional entre os que adotaram o acessório.
Mau uso pode trazer prejuízos
Segundo um documento da Área Técnica de Saúde da Pessoa com Deficiência, do Ministério da Saúde, as bengalas aumentam a base de apoio e reduzem em até 20% a sobrecarga nas pernas, melhoram o equilíbrio, ajudam a compensar déficits de força e mantêm o padrão recíproco da marcha. Para o geriatra Newton Luiz Terra, professor do Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUCRS, os benefícios vão além do aspecto físico.
– Ela (a bengala) permite que essas pessoas vivam com mais independência e autonomia e que sejam incluídas, mesmo aquelas com muitas limitações – diz.
Mas para seguir um caminho saudável ao lado dessa "companheira", os especialistas atentam para alguns cuidados. O material deve ser leve, e a regulagem da altura, de fácil manuseio. O mais indicado é buscar orientações de um profissional habilitado – como fisioterapeutas e fisiatras – para que o acessório seja adaptado de acordo com a necessidade de cada pessoa e também para que ocorra treinamento e período de adaptação. O uso incorreto, alerta Terra, pode acarretar em lesões na coluna e nas articulação e piora em quadros já problemáticos, sem contar que o que poderia evitar quedas pode ser o causador desses acidentes se não for bem utilizado.
– A bengala pode até melhorar a dor articular, servindo como analgésico, mas o que mais vejo é pessoas usando-a de forma errada. Por isso é importante orientação – conclui Terra.
O que observar
– Para que realmente funcione bem, a bengala deve estar numa altura adequada. Para apoio, o indicado é que o cotovelo fique em um ângulo de 30 graus. A bengala de equilíbrio pode ser um pouco mais alta. O importante é buscar a orientação de um especialista, como o fisioterapeuta, na hora de ajustar o objeto às necessidades.
– Deve ser conduzida ao lado e não na frente do corpo. Assim, evita-se tropeços no objeto.
– Ao contrário do que muita gente faz, a bengala deve ser conduzida no lado oposto ao da lesão. Por exemplo, se você tem um problema no joelho esquerdo, deve conduzi-la com a mão direita.
– O cabo no formato semelhante aos dos guarda-chuvas não tem sido muito indicado, porque pode tencionar o punho. A dica é usar o mais plano possível, para que a pressão seja distribuída de maneira uniforme.
– Sabe aquelas cordinhas usadas nas máquinas fotográficas e que prendemos ao punho? Nas bengalas, essas cordinhas também ajudam a evitar que o objeto caia em um eventual descuido.
– As bengalas costumam já vir com ponteiras de borracha ou outro material antiderrapante, mas é importante lembrar que, periodicamente, ela precisa ser trocada, porque se desgasta. Não é recomendado andar com bengalas em chão molhado ou tapetes.