A permissão para a retomada da produção, da comercialização e do consumo de remédios para emagrecimento vetados no mercado brasileiro desde 2011 tem causado polêmica e intenso debate nos últimos dias. Sancionado pela Presidência da República no dia 23 de junho, o projeto de lei 2.431/2011 autoriza o retorno dos anorexígenos anfepramona, femproporex e mazindol, compostos derivados das anfetaminas que atuam como inibidores de apetite. O sacietógeno sibutramina (que leva à sensação de saciedade) continuou sendo prescrito com receituário especial durante esse período e segue liberado.
Enquanto entidades como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pela proibição de seis anos atrás, lamentam a medida que pode representar "grave risco para a saúde da população", médicos saúdam a maior variedade de remédios disponíveis para combater a obesidade.
Atualmente, existem três drogas à venda no país para a redução de peso: além da sibutramina, o orlistat (Xenical, entre outros nomes comerciais) e a liraglutida (Saxenda). Já aprovado pela Anvisa, o cloridrato de lorcasserina (Belviq) está em fase de tomada de preços e pode chegar em breve às farmácias. Junto dos três anorexígenos que agora ressurgem como uma opção de preço mais acessível – resta saber se haverá interesse da indústria farmacêutica em voltar a produzi-los –, todos são medicamentos indicados para quem não consegue reduzir o peso apenas com dieta e exercícios.
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Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), Alexandre Hohl comemora a liberação e explica que os riscos podem ser minimizados com a correta prescrição e uma firme fiscalização. No passado, era comum que os emagrecedores fossem receitados, com frequência, até por especialistas de outras áreas que não a endocrinologia e a metabologia, para pacientes que não apresentavam sequer sobrepeso e pediam uma receita controlada para o ginecologista ou o clínico geral porque desejavam eliminar alguns quilos incômodos. O uso ficava banalizado e representava riscos desnecessários. Hohl argumenta que há diversos medicamentos com possíveis efeitos colaterais graves em circulação – como a isotretinoína, para a acne – e recorre a uma comparação para explicar seu ponto de vista.
– Temos no Brasil um grave problema de acidentes de carro. É como se o governo tivesse mandado tirar os carros da rua para acabar com o problema. Foi isso que fizeram com os anorexígenos. Não é a solução. A solução para o acidente de carro é faixa de pedestre, sinal de trânsito, educação de motorista e pedestre, cobrar multa. Qual é a solução para os emagrecedores? Fiscalização. Deve ser melhorado o controle sobre a prescrição e a venda nas farmácias, que é responsabilidade da Anvisa – afirma o vice-presidente da Sbem. – A liberação dos derivados de anfetaminas representa a possibilidade de o médico que trata com seriedade a obesidade ter uma ampliação do arsenal terapêutico. A utilização racional é útil no tratamento – completa.
O cardiologista Daniel Souto Silveira, diretor da Sociedade de Cardiologia do Rio Grande do Sul (Socergs), concorda que os anorexígenos podem ajudar os obesos que não obtiverem resultados satisfatórios com regime alimentar e atividade física, mas ressalta a principal ameaça representada por essas drogas: complicações cardiovasculares, como arritmias (inclusive fatais), no caso dos anorexígenos, e pressão alta, situação recorrente com a sibutramina. O paciente que está num estágio de pré-hipertensão pode começar a tomar a sibutramina e, em pouco tempo, tornar-se hipertenso sem nem ficar sabendo – e isso, consequentemente, aumenta o risco de acidente vascular cerebral, infarto e perda da função renal.
Para quem já é cardíaco, é preciso ter ainda mais cuidado, e o recomendado é consultar um cardiologista antes da ingestão de anfepramona, femproporex ou mazindol. Esses anorexígenos podem também interagir de forma prejudicial com medicamentos que o paciente toma para problemas como colesterol alto e hipertensão.
– Não são remédios santos. Muitas vezes, as pessoas não sabem o risco que estão correndo – alerta Silveira.
Emagrecedores disponíveis no Brasil
Anfepramona, femproporex e mazindol
_ São anorexígenos e tiram o apetite _ o paciente se "esquece" de comer. Proibidos pela Anvisa em 2011, saíram de linha. Voltam ao mercado se laboratórios farmacêuticos tiverem interesse em retomar a produção.
Sibutramina
_ É um sacietógeno, que provoca saciedade. Ao comer, o paciente se sente satisfeito antes, ou seja, com uma menor quantidade de alimento e de calorias. Foi prescrito com receituário especial nos últimos anos e continua autorizado pela lei sancionada na semana passada.
Orlistat (Xenical, entre outros)
_ O remédio inibe uma enzina do intestino e faz com que 30% da gordura ingerida pela alimentação sejam expelidos pelas fezes em vez de absorvidos pelo organismo.
Liraglutida (Saxenda)
_ Medicamento que reduz a fome e proporciona saciedade, mostra-se muito eficaz ao promover perda de peso e melhorar a pressão arterial, o nível de glicose e o metabolismo. O ponto negativo é o alto custo (superior a R$ 500 mensais, em média).
Cloridrato de lorcasserina (Belviq)
_ Ativa uma região do cérebro chamada hipotálamo e atua no melhor controle da ingestão de alimentos. Aprovado pela Anvisa, deve chegar logo ao mercado.