As afirmações do secretário de Saúde do Rio Grande do Sul, João Gabbardo dos Reis, de que os exames de detecção do câncer de próstata não são necessários para todos os homens com mais de 50 anos, ditas na Rádio Gaúcha na manhã desta terça-feira, foram contestadas pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU). A organização defende a estratégia de rastreamento populacional da doença como forma de redução da mortalidade.
Em entrevista ao Gaúcha Atualidade, Gabbardo defendeu que os exames só eram necessários para homens cujos familiares de primeiro grau tiveram a doença ou aqueles com sintomas de irregularidade na urina, como perda de força do jato urinário, dificuldade para urinar, urinar várias vezes durante a noite ou urinar e ainda ficar com a sensação de que a bexiga está cheia.
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A tese do secretário é de que o rastreamento provoca procedimentos invasivos desnessesários nos pacientes, como biópsias e cirurgias. Elas são feitas depois que os exames de sangue (PSA) detectam irregularidades, os resultados chamados de "falso positivo" por Gabbardo. O secretário ainda acrescenta que esses procedimentos podem causar danos aos pacientes:
- Foram acompanhados durante mais de 10 anos pacientes que fizeram o rastreamento e que não fizeram. Ao final do trabalho, o número de pessoas que morreram por câncer de próstata foi exatamente o mesmo, não tem mudança nenhuma. No entanto, no grupo que fez o rastreamento, teve um número enorme de pessoas que ficaram impotentes ou com incontinência urinária.
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Na visão da SBU, deixar de fazer um ratreamento populacional do câncer de próstata em todos homens a partir dos 50 anos trará prejuízos para a saúde dos gaúchos. A consequência disso, conforme o coordenador do Departamento de Uro-oncologia da SBU, Lucas Nogueira, será o aumento no número de mortes por causa da doença no Estado.
- Existem estudos bem feitos, com populações grandes, principalmente da Europa, que mostram que políticas de rastreamento do câncer de próstata estão associadas a uma diminuição de até 20% nos óbitos pela doença no futuro, em 15 anos.
A SBU também discorda da orientação de Gabbardo para que os homens esperem os sintomas para fazer os exames. Conforme Nogueira, o câncer de próstata na fase inicial ainda não causa sintomas:
- Esperar um homem sentir algo para fazer os exames é tirar dele a chance de cura.
O especialista interpreta as afirmações do secretário como uma estratégia de saúde pública para reduzir custos de fazer exames em toda a população. Segundo o coordenador, o que pode ser buscado é um equilíbrio no rastreamento, com foco nas populações de risco, como os homens com histórico da doença na família e negros - para os quais a SBU recomenda avaliação precoce, aos 40 ou 45 anos.
Sobre os danos de procedimentos invasivos como cirurgias ou biópsias sem necessidade, Nogueira concorda que eles podem ocorrer, mas afirma que o rastreamento salva vidas.
- Já existem estudos hoje que mostram que uma avaliação precoce, aos 40 anos , consegue identificar os pacienets com maior risco (de terem câncer de próstata). Esses pacientes deveriam fazer avaliações anuais, enquanto os com menor risco poderiam fazê-las de forma distanciada, mas nunca deixar de fazer - completa.
Segundo Nogueira, a orientação da secretaria gaúcha se baseia em uma recomendação de um órgão governamental dos Estados Unidos que, em 2011, passou a não recomendar os exames de detecção de câncer de próstata a nenhum homem, a não ser que ele tivesse algum sintoma.
- A consequência disso já começou a aparecer. Tem dois trabalhos deste ano que já mostraram o aumento na incidência de câncer de próstata agressivo nos homens dos Estados Unidos e uma diminuição no diagnóstico do câncer de próstata agressivo, ou seja, o país está deixando de diagnosticar a doença que precisa ser descoberta e tratada.
O especialista ainda completa que as sociedades médicas de urologia e oncologia dos EUA não têm dúvida de que vai haver uma mortalidade maior em decorrência do não rastreamento.
- Esse é o preço a se pagar por esse tipo de política de redução de custos. Os Estados Unidos queriam fazer o mesmo com a mamografia, mas a pressão das mulheres sobre o congresso não deixou isso passar.
Ouça a entrevista na íntegra:
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