O planejamento de estratégias de controle do câncer de mama por meio da detecção precoce é fundamental para salvar vidas, mas a falta de investimentos e ações preventivas muitas vezes torna mais longo o caminho até o diagnóstico de pacientes. É o que apontam especialistas convidados para painel do evento Tá Na Mesa, realizado nesta quarta-feira (11) pela Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul).
Entre as populações mais vulneráveis, que não contam com cobertura de plano de saúde, conseguir atendimento médico e acesso a exames muitas vezes representa um desafio. A Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama) alerta que a neoplasia tem até 95% de chances de cura se detectada em estágios iniciais. A presidente da Femama, mastologista Maira Callefi, destaca a importância de procedimentos de rastreamento para o diagnóstico precoce.
— Há dificuldade no processo de fazer com que as pessoas venham realizar exames, em primeiro lugar. Na Secretaria Municipal da Saúde dizem que sobra mamografia, mas por outro lado as mulheres não conseguem fazer a mamografia, tem filas — critica, citando a necessidade de reduzir a burocracia.
Conforme dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), são estimados 73.610 novos casos da doença somente neste ano no país. No Rio Grande do Sul, o número deve alcançar 3,7 mil. Do total, Porto Alegre deve registrar 670 novos casos, ou seja, 18%. Em 2022, foram 1.432 mortes de mulheres pela doença no Estado.
— A doença avançada custa muito mais, chega até sete vezes mais do que a doença inicial. O que está faltando é gestão, vontade política, um programa e financiamento — avalia Maira.
O oncologista Gilberto Schwartsmann afirma que existe uma diferença abismal entre a cobertura de mamografia das mulheres que têm convênio e planos de saúde privados e as que são atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
— Isso implica em vários desdobramentos que a gente vê na realidade médica. Qualquer coisa que vamos olhar de indicador de sucesso, vamos ver que é sempre muito menor em populações mais vulneráveis e de baixa renda — destaca.
Professor de Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Schwartsmann afirma que é necessário reforçar as ações de prevenção e detecção precoce para reduzir a mortalidade.
— No Rio Grande do Sul, metade das mortes ocorre por causas cardiovasculares e câncer. Antes era mais cardiovascular e a segunda era câncer. Hoje é igual, mas vai aumentar o número de casos de câncer, porque os cardiologistas estão cada vez melhores na detecção precoce e prevenção — explica.
Dificuldades pelo SUS
Conforme Schwartsmann, cerca de 75% da população brasileira é atendida via SUS, o que representa uma grande desafio para os médicos. Se, por um lado, há mais instrumentos para diminuir a mortalidade, os profissionais ainda carecem de condições para fazer isso bem e para todos.
Diretor médico do Hospital São Francisco e da Criança Santo Antônio, da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, o cirurgião cardiovascular Fernando Lucchese defende ações preventivas, mas avalia que o setor passa por mudanças importantes, com novas redes de convênios e planos de saúde.
— Está havendo uma mercantilização muito forte. Cada convênio está se verticalizando, tendo seu próprio hospital. Tudo capenga, pequeno, mal estruturado. E quem sofre com isso é o usuário — destaca.
Segundo Lucchese, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) enfrenta dificuldades para impor limites e adotar novos procedimentos. Ao mesmo tempo, reforça que os custos com saúde aumentaram muito.
— Cerca de 70% dos nossos pacientes são SUS. Atendemos 1 milhão de pacientes por ano, mas no ano passado o SUS gerou um déficit de R$ 153 milhões, que temos que absorver com convênios de outros tipos — diz, apontando ainda os atrasos nos repasses do IPE Saúde — Chegou a dever R$ 45 milhões para a Santa Casa, pagando com cinco meses de atraso — completa.