O Ministério da Saúde quer substituir a gotinha usada no reforço da vacina da poliomielite para um esquema totalmente injetável. A pasta pautará o tema em uma reunião da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização em julho. Atualmente, o esquema vacinal da pólio já utiliza três doses injetáveis e apenas o reforço é feito com as gotinhas. A justificativa é alinhar a rotina vacinal brasileira com o que é recomendado por organizações internacionais e reduzir a circulação do vírus.
A transição para o esquema total injetável já vinha sendo feita de forma gradual e, de acordo com fontes, a pasta pretende colocar a mudança totalmente em prática a partir do ano que vem. Ainda que as doses orais sejam substituídas, integrantes do ministério garantem que o mascote "Zé Gotinha" continuará sendo o símbolo do Programa Nacional de Imunizações.
A pasta tem ampliado a participação do personagem em eventos para reforçá-lo como símbolo de todas as campanhas de vacinação feitas pela pasta. A intenção do Ministério da Saúde de substituir as gotinhas foi antecipada pela Folha de S.Paulo e confirmada pelo Estadão.
A visão é de que a extinção das gotinhas é uma recomendação científica consistente e significaria um avanço no sentido de interromper a circulação do vírus no país. Isso porque, enquanto a versão injetável utiliza o vírus inativado, as gotinhas utilizam uma versão atenuada do vírus, que acaba voltando para o meio ambiente por meio das fezes das crianças. Atualmente, o esquema vacinal contra pólio é ministrado aos dois, quatro e seis meses de vida por meio de uma injeção e, depois, reforçado aos 15 meses e aos quatro anos com as doses orais.
Apesar da tendência de mudança, a supressão das gotinhas é objeto de ponderações. Ainda que parte dos especialistas considerem a transição natural, há aqueles que destacam a possibilidade de que a utilização de doses injetáveis possa derrubar ainda mais a cobertura vacinal.
No ano passado, a cobertura vacinal contra a doença ficou na casa de 77,1%, bem distante da meta de 95%. Outro fator preponderante, é a dificuldade de obter número suficiente de doses injetáveis no mercado. Integrantes do Ministério da Saúde afirmam, no entanto, que esse não seria um obstáculo já que as negociações começariam em tempo hábil.
Especialistas destacam que embora haja recomendação de organismos internacionais para transição, há ressalva de que a mudança seja feita com cautela, considerando inclusive os índices atuais de cobertura.
— A retirada do uso da pólio oral é um tema ainda controverso e que divide opiniões. A própria OMS entende que os países devem ter muito cuidado na suspensão do uso da gotinha oral especialmente nos lugares onde a cobertura oral com vacina injetável não é boa, que é o nosso caso. No primeiro ano de vida temos só 70% das crianças com três doses. Corre o risco de reduzir mais ainda essa cobertura vacinal — pondera Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e membro da CTAI, que segue:
— Por outro lado, continuar usando pólio oral continua colocando vírus vivos no ambiente e correndo risco deles sofrerem mutações e causar paralisia também. É um tema controverso, que divide opinião de especialistas e o cenário precisa ser debatido com muita profundidade num país tão diverso quanto o nosso, com tantas realidades de coberturas vacinais como a nossa.
Em nota, o Ministério da Saúde informou que as estratégias de vacinação adotadas no Brasil, assim como os imunizantes indicados para cada público, levam em conta o avanço tecnológico do setor e novas evidências científicas, sempre discutidos no âmbito da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunizações (CTAI). "A substituição da vacina oral contra a poliomielite por uma versão mais aprimorada do imunizante deve ocorrer gradualmente a partir do próximo ano e após avaliação da CTAI"