Um surto do vírus Marburg foi confirmado nesta segunda-feira (13) na Guiné Equatorial, país da África central, o que pôs autoridades da Organização Mundial da Saúde (OMS) em alerta. A doença é da mesma família do ebola e, até agora, há uma morte confirmada, mas 16 casos e outros oito óbitos em análise. É improvável que o Marburg se espalhe pelo mundo a ponto de gerar uma pandemia, mas sua letalidade e fácil contágio exigem atenção das autoridades sanitárias, dizem especialistas ouvidos por GZH.
O vírus foi documentado pela primeira vez em 1967, após 31 casos surgirem nas cidades alemãs de Marburg e Frankfurt depois que cientistas tiveram contato com animais infectados. Desde então, a doença já acumula 16 surtos, quatro deles com casos fora do continente africano. Ao longo das décadas, a mortalidade variou entre 22% e 88% dos infectados.
— O risco de virar pandemia é bem menor, mas isso não impede que surjam surtos fora do continente africano, como presenciamos no passado. Macacos foram infectados nas cavernas, levados para a Europa para experimentação animal e pessoas em contato com eles pegaram a doença — diz o médico infectologista Julio Croda, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT).
Muito infeccioso devido à sua carga viral alta, o Marburg é transmitido pelo contato direto, via secreções como sangue, saliva, suor, urina ou fezes. Ele ataca os tecidos de órgãos e vasos sanguíneos, o que causa uma febre hemorrágica agressiva, que é semelhante a provocada pelo ebola. O vírus também pode ser transmitido de morcegos e macacos silvestres para seres humanos.
— Como é um contato que precisa ser relativamente direto com secreções e normalmente a doença é muito grave, o que vemos são surtos localizados. Isso não exime a necessidade de todos os países estarem preparados caso alguém, de repente, desenvolva uma doença similar, ou que tenha passado por essas regiões, para atender e fazer o diagnóstico — diz o médico veterinário Fernando Spilki, virologista da Feevale e membro da Rede Vírus-MCTI, que assessora o governo federal no combate a viroses emergentes.
O Marburg pode virar uma pandemia e chegar ao Brasil?
A probabilidade da doença de Marburg se tornar uma pandemia é baixa, mas a doença tem potencial para causar surtos localizados ao redor do mundo. Isso exige uma vigilância atenta dos países para o caso de viajantes ou mesmo para animais traficados que podem ser recipientes do vírus.
— É preciso uma vigilância ativa e sensível que detecte rapidamente casos para implementar uma resposta de contenção rápida. Não só para a Marburg, mas também para futuras doenças emergentes que vão surgir — afirma Croda.
Quais os sintomas do vírus de Marburg?
De acordo com a OMS, os pacientes com suspeita do vírus na Guiné Equatorial apresentaram febre, fadiga, vômito com sangue e diarreia. O período de incubação do vírus varia entre 2 e 21 dias, segundo o Centro de Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA.
— O vírus de Marburg leva a uma síndrome hemorrágica com perda de líquidos via trato digestivo, então a pessoa vai ter problemas renais ao desidratar. Também terá sangue sendo eliminado por vômitos, fezes, pele e outras secreções. O principal efeito talvez seja uma exaustão do sistema de coagulação, que atinge órgãos internos. Tudo o que sai do indivíduo ou cadáver é extremamente infeccioso, então equipes de saúde precisam ter cuidado — explica Spilki.
Tem vacina ou tratamento?
Ainda não há tratamento aprovado disponível para o Marburg, mas já ha uma vacina para o Ebola, por exemplo. De acordo com a OMS, há tratamentos em início de desenvolvimento que serão avaliados contra a doença. Hoje, médicos tratam os infectados apenas com medidas de suporte.
— Como é uma doença que se restringe ao continente africano, o investimento em terapias específicas é limitado. O tratamento é mais de suporte a pacientes graves. Ou seja: leito de terapia intensiva, já que a letalidade é grave, e aí precisa dialisar, de droga vasoativa e de ventilação mecânica para garantir o suporte de vida — diz Croda.
Qual a causa deste surto de Marburg na Guiné Equatorial?
O crescimento da interação de humanos com ambientes silvestres deve levar a uma maior frequência de surtos e epidemias, por conta das chances de vírus que circulam entre animais serem transmitidos para pessoas. Assim como no caso da covid-19, a doença de Marburg é uma zoonose, uma virose transmitida de animais para humanos.
— A dispersão do Marburg precisa ser investigada. Seja o que for, temos de lembrar que é um vírus re-emergente que aparece causando surtos na espécie humana. Isso denuncia que, com o nível de dano ambiental que temos hoje, um vírus que tinha certo equilíbrio com seus hospedeiros originais pode ser transmitido à nossa espécie — diz Spilki.