A ampliação da validade de quatro lotes de um quimioterápico via oral utilizado no tratamento de leucemia linfoide aguda garantiu que hospitais de Porto Alegre pudessem reestabelecer o fornecimento aos pacientes. As unidades remanescentes da droga - chamada Mercaptopurina - no mercado tinham data de vencimento para 31 de outubro deste ano e a falta de novos produtos fez com que a distribuição fosse interrompida em algumas instituições de saúde.
De acordo com a farmacêutica Aspen Pharma, que é responsável pela distribuição do medicamento no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a prorrogação do prazo de validade dos lotes 8155, 8156, 8157 e 8158 para 48 meses, “uma vez que haviam estudos que comprovam a estabilidade do medicamento durante este período”. Assim, esses remédios poderão ser utilizados pelos pacientes até 31 de outubro de 2023, independente da data impressa na embalagem.
O desabastecimento de novos lotes da droga ocorre devido a uma recente alteração em sua formulação, que ainda não foi aprovada no Brasil. Em nota, a Aspen explicou que a fabricação da Mercaptopurina é feita na Alemanha e que o fornecimento de um dos ingredientes utilizados na produção da versão já aprovada pela Anvisa foi interrompido. Conforme a farmacêutica, a alteração já foi submetida para aprovação da agência e encontra-se em fase final de aprovação.
Ainda em outubro, preocupada com a situação, a Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) encaminhou um ofício à Anvisa pedindo a ampliação da validade dos lotes que expirariam no final do mês passado. Com a autorização, o Hospital da Criança Santo Antônio, que integra o complexo da Santa Casa de Porto Alegre, que enfrentaria a falta do medicamento para seus pacientes já nesta semana, conseguiu na quarta-feira (16) a compra de urgência de 2,5 mil comprimidos de um dos lotes que teve o prazo de validade estendido. Isso, segundo Laura Garcia de Borba, hematologista do Serviço de Oncologia Pediátrica da instituição, garante a distribuição às crianças com leucemia por até 60 dias.
No Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), os lotes que estavam em estoque e venceram no final do mês passado foram guardados. Mayde Torriani, farmacêutica do setor de Hemato Oncologia da instituição, explica que, normalmente, os medicamentos vencidos são logo descartados, mas como existia a possibilidade de extensão da validade, as unidades foram separadas até que viesse a resposta da Anvisa.
— Como a equipe sabia que ia vencer, passamos a reduzir e dar o número de comprimidos exato até o vencimento. Também já adquirimos o medicamento substituto (Tioguanina), e aí substituímos um pelo outro. Ficamos umas três semanas distribuindo Tioguanina e assim que autorizou a extensão dos lotes que tínhamos, voltamos a distribuir a Mercaptopurina. Nenhum dia nenhum paciente ficou sem o medicamento — ressalta.
Mayde explica que os medicamentos represados com os fornecedores voltaram a ser entregues e, por isso, agora a instituição conta com estoque para mais de três meses. Segundo ela, o consumo do hospital é de mil comprimidos por mês.
O Hospital Nossa Senhora da Conceição informou que não houve interrupção de fornecimento aos pacientes e que, agora, eles estão recebendo os medicamentos com validade estendida, conforme autorizado pela Anvisa. O mesmo ocorre no Hospital São Lucas da PUCRS, que tem em estoque a Mercaptopurina de um dos lotes com prazo prorrogado, e no Hospital Moinhos de Vento.
Autorização excepcional para importação
A Aspen Pharma também solicitou uma autorização excepcional para importação do remédio registrado e comercializado na Alemanha, para abastecimento emergencial do mercado — que foi atendida pela Anvisa, conforme a farmacêutica. A empresa destaca que as medidas já estão em vigor desde o início desta semana e que os medicamentos estão em processo de distribuição para hospitais e pacientes.
“Vale ressaltar que a Anvisa, durante todo esse processo, atuou de forma célere e diligente, concedendo as autorizações necessárias para evitar o desabastecimento do mercado”, enfatiza a nota da Aspen.
Em nota enviada na tarde desta sexta-feira (18), a Anvisa esclareceu que a autorização excepcional para liberação dos lotes importados foi concedida em 25 de outubro, “considerando o alto risco de desabastecimento do produto, sendo ele único no mercado e com isso evitando que os pacientes que fazem uso do mesmo interrompam seu tratamento”. De acordo com a decisão, essas unidades não poderão ser comercializadas em farmácias e drogarias, e poderão ser utilizadas pelo período de validade indicados na embalagem.
O texto da agência também cita os lotes do medicamento fabricado com a formulação antiga, que tiveram o prazo de validade ampliado para 48 meses, e destaca que, com base no histórico de uso, a expectativa é que os estoques de medicamentos importados e com prazo de validade ampliado sejam suficientes para atender a demanda de cinco a seis meses.
“A Anvisa tem tratado a situação com prioridade e está em contato direto com a empresa (Aspen) para discutir a melhor forma de disponibilização do medicamento com a nova formulação. Além disso, espera-se que nesse período a situação regulatória seja resolvida”, diz o texto.
Confira as notas na íntegra
Aspen Pharma
“Purinethol® é um medicamento registrado pela Aspen Pharma desde 2013. É fabricado na Alemanha e exportado para mais de 40 países, incluindo o Brasil. Devido à interrupção no fornecimento de um dos ingredientes utilizado na fabricação do medicamento, foi necessário realizar uma alteração na sua formulação para substituição desse ingrediente. No Brasil, a alteração foi submetida para aprovação da Anvisa e encontra-se em fase final de aprovação.
Tendo em vista que o estoque produzido se esgotou em outubro 22, como medida emergencial, a Anvisa autorizou a importação excepcional do medicamento comercializado na Alemanha. Além disso, a Anvisa autorizou a extensão da validade dos lotes 008155, 008156, 008157 e 008158 até outubro de 2023, uma vez que haviam estudos que comprovam a estabilidade do medicamento durante este período.
Todas essas medidas já estão em vigor desde o início dessa semana (14/11/22) e os medicamentos já estão em processo de distribuição para hospitais e pacientes.
Vale ressaltar que a Anvisa, durante todo esse processo, atuou de forma célere e diligente, concedendo as autorizações necessárias para evitar o desabastecimento do mercado.
Vanessa Gomes, Diretora de Assuntos Científicos e Regulatórios.”
Anvisa
"Em 25/10/2022 foi concedida autorização excepcional, para liberação dos lotes importados de nº 108148 e 110971 do medicamento PURINETHOL (mercaptopurina) comprimido de 50 mg, considerando o alto risco de desabastecimento do produto sendo ele único no mercado e com isso evitando que os pacientes que fazem uso do mesmo interrompam seu tratamento.
Os lotes de medicamento objeto da solicitação não poderão ser comercializados em farmácias e drogarias, conforme Voto nº 216/2022/SEI/DIRE2/Anvisa (SEI 2076148). Os medicamentos importados poderão ser usados pelo período de validade indicados na embalagem.
Entretanto, os lotes 8156, 8157, 8155, 8158 do produto Purinethol (Mercaptopurina), comprimido de 50 mg, fabricado pela empresa Excella GMBH & CO. KG, Alemanha, com a formulação antiga, tiveram a ampliação do prazo de validade para 48 meses, conforme documentação apresentada pela empresa em solicitação à Diretoria Colegiada.
A solicitação foi aprovada por unanimidade nos termos do voto do relator – Voto nº 205/2022/SEI/DIRE4/Anvisa (SEI 2136908). Sendo assim, o limite de uso desses lotes é até o dia 31 de outubro de 2023.
Com base no histórico de uso, a expectativa é que os estoques do medicamento importados e com prazo de validade ampliado, atendam à demanda por cinco a seis meses. A Anvisa tem tratado a situação com prioridade e está em contato direto com a empresa para discutir a melhor forma de disponibilização do medicamento com a nova formulação.
A princípio, há a expectativa de que os estoques atuais sejam suficientes para uma demanda de cinco a seis meses. Além disso, espera-se que nesse período a situação regulatória seja resolvida."