Uma arma na luta contra o coronavírus nos bebês a partir dos seis meses deve ser liberada em breve no país. Após aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o uso da Pfizer para crianças acima de seis meses a quatro anos depende agora de análise do Ministério da Saúde e aval do titular da pasta, Marcelo Queiroga. Pais interessados em vacinar filhos a partir dos seis meses contra a covid-19 precisarão aguardar mais algumas semanas até que haja a recomendação oficial.
Entre os países que já vacinam crianças a partir dos seis meses, estão Estados Unidos, Austrália, Canadá. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estima haver cerca de 14,6 milhões de crianças de zero a quatro anos - destas, 698 mil no Rio Grande do Sul.
— Os dados são inequívocos sobre a necessidade de vacinação da faixa etária. Países que já introduziram a partir dos seis meses de idade, como Estados Unidos, que já vacinaram mais de 2 milhões de crianças, não tiveram praticamente nenhum efeito colateral grave. Ainda temos muitos casos de covid, não é o momento de interromper a vacinação — afirma o médico infectologista pediátrico Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP e integrante da Câmara Técnica Assessora de Imunizações do Ministério da Saúde.
Apesar de crianças desenvolverem menos casos graves, a mortalidade por coronavírus é considerável. Entre janeiro e 10 de setembro deste ano, 439 crianças de zero a cinco anos morreram em consequência da doença no Brasil, segundo o boletim epidemiológico mais recente do Ministério da Saúde. Em jovens de seis a 19 anos, foram 281 mortes.
O médico Juarez Cunha, presidente da SBIm, salienta que inúmeros estudos mostram que, em qualquer faixa etária, o risco é maior para não vacinados do que para quem já se imunizou.
— As consequências sempre são piores em não vacinados, o que inclui crianças. No Brasil, nossa mortalidade por covid é maior do que todos os países, em todas as faixas etárias. Temos motivos de sobra para vacinar. Neste ano, crianças menores de cinco anos tiveram mais de 12 mil hospitalizações por covid — diz Cunha.
O risco é maior justamente entre crianças com menos de um ano. Médicos também alertam sobre o risco de covid longa e de síndrome multissistêmica pediátrica (SIM-P), inflamação que atinge todo o corpo da criança e que pode resultar em internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Segundo o Ministério da Saúde, de janeiro ao início de setembro, foram 1.857 casos no país - ou cinco por dia. No Rio Grande do Sul, foram 141.
A aplicação da Pfizer na faixa etária foi analisada e recomendada à Anvisa pelas entidades médicas especializadas na área: Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI), Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Trâmites até o início da imunização
Neste momento, a liberação da aplicação aguarda aprovação do Comitê Técnico Assessor em Imunizações do Programa Nacional de Imunizações (PNI), formado por especialistas e representantes de entidades médicas brasileiras. A próxima reunião é esperada para ocorrer na sexta-feira da semana que vem (30), e a expectativa é de liberação, uma vez que a comunidade científica é a favor da vacinação pediátrica.
Em seguida, o assunto será analisado pela Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), pelo Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública do Ministério da Saúde e por Queiroga, que dá a palavra final. Por fim, a pasta emite nota técnica que dá o aval institucional para Estados e municípios.
As secretarias da Saúde do Rio Grande do Sul e de Porto Alegre, aliás, afirmaram a GZH que aguardam justamente nota técnica do governo federal orientando a vacinação de seis meses a quatro anos com Pfizer.
Fontes do Ministério da Saúde afirmaram ao jornal O Globo que há dúvidas sobre o Ministério da Saúde liberar a vacina antes das eleições - alguns integrantes da pasta e do governo federal são contrários à aplicação em crianças, a despeito de estudos mostrando a segurança e eficácia do produto.
Vacina liberada para crianças a partir dos três anos
No Brasil, a vacinação infantil está liberada para crianças a partir dos três anos, com uso da CoronaVac, mas foi interrompida por falta de doses em centenas de cidades. Prefeituras iniciaram a aplicação do imunizante com uso fracionado do estoque reservado a adultos que não compareceram aos postos de saúde, mas mesmo essas vacinas remanescentes acabaram.
Até o momento, 12,3% das crianças gaúchas de três a quatro anos tomaram a primeira dose. Entre a faixa etária de cinco a 11 anos, 48% tomaram duas doses, segundo dados da SES-RS. Em Porto Alegre, a aplicação foi suspensa desde o fim de agosto. O último lote enviado pelo governo federal ao Rio Grande do Sul foi em março. Na segunda-feira (19), o Ministério da Saúde recebeu 1 milhão de doses pediátricas. Até o final de setembro, o Butantan deverá produzir outras 2,5 milhões de vacinas.
A falta de CoronaVac ocorre por atraso do governo federal em comprar novas doses e há risco de haver falta também de Pfizer, aponta Ana Brito, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Pernambuco e representante da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) no Comitê Técnico Assessor em Imunizações do Ministério da Saúde.
— Temos assistido a um retardo do Ministério na aquisição de vacinas da Pfizer, a exemplo da CoronaVac, que aprovamos para uso em crianças de três a seis anos e hoje há falta. Dados do Chile e da aprovação pela agência reguladora americana e por outras agências do mundo mostram que a vacina da Pfizer é segura. Não tem registro de miocardite na faixa etária de seis meses a cinco anos nos Estados Unidos e na comunidade europeia — afirma Ana.
O Ministério da Saúde informa que tem contrato com a Pfizer para fornecimento de todas as vacinas aprovadas pela Anvisa que integram o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO). Segundo a pasta, “havendo recomendação pela área técnica, as vacinas serão disponibilizadas para todo o Brasil, como já ocorre com as demais faixas etárias”.