A comercialização de doses da vacina contra a covid-19 da AstraZeneca pode começar em breve na rede privada de saúde, pois, segundo a Associação Brasileira de Clínicas de Vacinas (ABCVAC), alguns estabelecimentos já estão recebendo o produto. Em clínicas particulares de Porto Alegre, entretanto, a disponibilização desse imunizante ainda está sendo analisada, sem previsão para o início das vendas. Entre os empecilhos observados, estão o preço, a embalagem multidoses e o fato de que a vacina é a mesma fornecida pela rede pública, porém importada diretamente da fabricante.
Em texto divulgado nesta segunda-feira (30), a ABCVAC informa que a vacina que está disponível na rede privada é da AstraZeneca e que o preço de venda do produto na fábrica é de R$ 151, conforme definido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED). Mas, devido a custos com logística, armazenamento, seguro e aplicação, a entidade estima que o consumidor pague, em média, entre R$ 300 e R$ 350 — sendo que cada clínica compõe o preço pelo serviço de aplicação, o que pode variar de acordo com a região.
A AstraZeneca afirmou, por meio de nota, que tem “negociações avançadas com empresas do setor privado” para a disponibilização do seu imunizante e que as primeiras doses “devem ser entregues às instituições ainda em maio”, mas ressaltou que a disponibilização ao público final, “fica a cargo de cada instituição”. Em relação à quantidade de vacinas, a fabricante disse que há cerca de dois milhões de doses em seu centro de distribuição, que poderiam ser negociadas com as clínicas de forma imediata.
De acordo com a ABCVAC, a oferta de vacinas pela rede privada ocorre neste momento "devido à queda da Lei 14.125/2021, que inviabilizava a venda de doses”. O texto em questão estabelece que, “enquanto perdurar a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), declarada em decorrência da infecção humana pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), ficam a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios autorizados a adquirir vacinas”. Já pessoas jurídicas de direito privado, “poderão adquirir diretamente vacinas contra a covid-19 (...) desde que sejam integralmente doadas ao SUS, a fim de serem utilizadas no âmbito do Programa Nacional de Imunizações (PNI)”.
A “queda da Lei” citada pela associação refere-se ao fim do estado de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin), que entrou oficialmente em vigor em 22 de maio deste ano. No entanto, após o anúncio da medida, ainda em abril, o Ministério da Saúde estava elaborando uma medida provisória (MP), que tem força de lei assim que publicada no Diário Oficial da União, para autorizar a comercialização na rede privada. Questionada se a venda de vacinas por clínicas particulares já está autorizada diante do fim do Espin ou ainda depende da MP, a pasta não retornou até a publicação desta reportagem.
Vendas em Porto Alegre
Das 12 empresas privadas consultadas pela reportagem de GZH, somente uma afirmou ter interesse na comercialização das vacinas contra a covid-19. Mas, antes de fechar um pedido com a AstraZeneca, a clínica MDC Vacinas, na Capital, está verificando qual seria a quantidade de clientes.
Na última semana, o estabelecimento passou a anunciar nas redes sociais a possibilidade de adquirir doses do imunizante e vem montando uma lista com interessados. Isso porque, segundo a MDC, há um pedido mínimo e a ideia é evitar o desperdício, já que os frascos são multidoses e há prazo para aplicação depois de abertos. A injeção custaria R$ 287, informa a empresa.
A embalagem com mais de uma dose foi inclusive apontada por outras duas clínicas como um problema. Na Immunize Clínica de Vacinas, o produto da AstraZeneca não será adquirido neste momento, afirma a biomédica e sócia-proprietária do local Priscila Malta Soares Lima:
— A vacina é a mesma oferecida pelo SUS e o próprio SUS não está atingindo as metas de vacinação. A apresentação da vacina em frasco multidoses também não é interessante para a rede privada, pois ela tem tempo para ser aplicada depois de aberta, se não, tem que colocar fora. E pelo valor, que não é tão acessível, não vimos motivo para oferecer na clínica.
Outras sete clínicas disseram que ainda não têm previsão para comercializar as doses, ainda estão discutindo a possibilidade ou ainda não sabem se vão adquirir o produto. Já a rede de farmácias São João informou que, neste momento, o fornecimento da vacina está em avaliação, enquanto a Panvel disse não ter nenhuma definição sobre o assunto.
Como será a aplicação na rede privada, segundo a ABCVAC
De acordo com o texto divulgado pela ABCVAC nesta segunda, a vacina produzida pela AstraZeneca disponível na rede privada é a mesma aplicada na rede pública, porém é importada diretamente do fabricante. A embalagem do imunizante, entretanto, será específica para a venda, ou seja, diferente daquela utilizada no produto que é aplicado nas unidades de saúde.
A indicação do imunizante seguirá o seguinte esquema: como terceira dose para todos acima de 18 anos, desde que tenha tomado a segunda há pelo menos quatro meses; como quarta dose para pessoas acima de 60 anos e imunossuprimidos ou acima de 18 anos com prescrição médica, que tenham tomado a terceira há pelo menos quatro meses; e para todos acima de 18 anos que ainda não receberam nenhuma injeção.
Os estabelecimentos deverão checar as doses que o paciente já tomou e as doses aplicadas deverão ser registradas no programa de informações do governo federal, o ConecteSUS, como já acontece com outras vacinas. A associação também afirma que cada paciente deverá entrar em contato com sua clínica de confiança, se informar e fazer o agendamento da aplicação conforme a disponibilidade de doses, “pois os frascos após abertos têm 48 horas de validade”.
A ABCVAC informa que não sabe quantas clínicas já estão aplicando a vacina, pois não compra, nem faz intermédio comercial dos imunizantes. Mas diz saber que “que algumas clínicas já estão recebendo doses”.