O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), proibiu a utilização do canal de denúncias Disque 100, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, fora de suas finalidades institucionais, devendo deixar de estimular, por meio de atos oficiais, o envio de queixas relacionadas a exigência de comprovante de vacinação contra a covid-19.
A decisão também determina que o governo altere notas técnicas dos ministérios da Saúde e da Mulher de forma a fazer constar entendimento da Corte sobre a validade de vedações ao exercício de atividades ou à frequência de certos locais, desde que previstos em lei, por pessoas que não possam comprovar a vacinação.
A decisão atende a pedido incidental formulado pela Rede e foi tomada nos autos da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 754, que trata da vacinação.
O partido sustenta que a pasta comandada por Damares Alves produziu nota técnica em que se opõe ao passaporte vacinal e à obrigatoriedade de vacinação de crianças contra a covid-10 e coloca o Disque 100, principal canal do governo para denúncias de violações dos direitos humanos, à disposição de pessoas contrárias à vacina que passem por "discriminação". Em outra frente, o Ministério da Saúde divulgou em seu site outra nota técnica com argumentos no mesmo sentido.
Para o relator, é grave a possibilidade de desvirtuamento do Disque 100, que, de acordo com as informações do sítio eletrônico do governo federal, “é um serviço de disseminação de informações sobre direitos de grupos vulneráveis e de denúncias de violações de direitos humanos”.
Para Lewandowski, é inadmissível que o Estado aja em contradição com o pronunciamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que garantiu formalmente a segurança da vacina para crianças, e contrarie a legislação e o entendimento consolidado do Supremo sobre a matéria.
Em relação às notas técnicas dos dois ministérios, o ministro observa que foram redigidas de forma ambígua quanto à obrigatoriedade da vacinação e podem estar contribuindo para a manutenção dos índices baixos de comparecimento de crianças e adolescentes aos postos de vacinação. Também podem ferir, entre outros, os preceitos fundamentais que asseguram o direito à vida e à saúde, além de afrontar entendimento consolidado pelo STF no julgamento das ADIs 6586 e 6587 e do ARE 1267879, em que a vacinação compulsória foi considerada constitucional.
“A mensagem equívoca que transmitem quanto a esse ponto, em meio a uma das maiores crises sanitárias da história do país, acaba por desinformar a população, desestimulando-a de submeter-se a vacinação contra a covid-19, o que redunda em um aumento do número de infectados, hospitalizados e mortos em razão da moléstia”, disse o ministro.
As notas técnicas deverão ser reeditadas de forma a constar a interpretação do STF de que a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, e pode ser implementada por meio de medidas indiretas tanto pela União como por estados e municípios.
Contraponto
O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos emitiu uma nota sobre a decisão de Lewandowski
"O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos não foi oficialmente intimado da noticiada decisão liminar na ADPF 754, e aguarda orientações da AGU para se posicionar sobre o mérito. No entanto, informamos:
1. Desde que foi criado, e até o presente momento, o Disque 100 sempre recebeu todas as denúncias de alegadas violações de direitos humanos, sejam elas quais forem, bastando a informação do cidadão de que seus direitos foram desrespeitados.
2. Os atendentes do Disque 100 acolhem todas as denúncias sem fazer juízo de valor sobre seu teor. Sequer dizem ao cidadão se este está certo ou errado em sua demanda. Esta avaliação cabe aos órgãos aos quais as denúncias são encaminhadas.
3. O Ministério reiterou inúmeras vezes, e reafirma, que não é contrário a qualquer campanha de vacinação. Entretanto, posiciona-se que o legado do combate à pandemia não pode ser a supressão de direitos.
4. Por fim, esclarecemos que o Ministério jamais divulgou em seus canais institucionais qualquer orientação ao cidadão sobre o uso do Disque 100 no recebimento de denúncias relacionadas à vacinação."