Em comunicado conjunto divulgado à imprensa na manhã desta terça-feira (21), as sociedades brasileiras de Imunizações (SBIm), Pediatria (SBP) e Infectologia (SBI) decidiram tornar público o parecer encaminhado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre a imunização contra covid-19 de crianças de cinco a 11 anos, com a vacina da Pfizer/BioNTech, na ocasião em que foram consultadas sobre o tema.
As entidades “manifestam-se favoráveis à autorização por entenderem que os benefícios, no contexto atual da pandemia, superam os eventuais riscos associados à vacinação”. O documento reúne informações sobre a doença nesse grupo específico, avaliação de potenciais benefícios e riscos e condições a serem cumpridas pelos fabricantes após a aprovação.
O assunto gera polêmica no país há meses – incluindo ameaças ao corpo técnico da Anvisa, iniciadas em outubro –, e, em especial, desde que os laboratórios encaminharam o pedido para aprovação da agência, em 12 de novembro. Na última quinta-feira (16), a agência aprovou a solicitação, “após uma análise técnica criteriosa de dados e estudos clínicos”, o que permitiria o início da aplicação da versão pediátrica do imunizante no Brasil.
Até então, o governo federal não havia adquirido as doses específicas para essa faixa etária –em frascos e volume diferentes na comparação com as que são destinadas a adolescentes a partir de 12 anos e adultos. O Ministério da Saúde decidiu postergar o começo desta etapa da campanha, que dependerá, ainda, de audiência pública prevista para 4 de janeiro. O presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, vêm se manifestando criticamente à decisão da Anvisa.
Assinam a nota conjunta das sociedades Marco Aurélio Palazzi Sáfadi, presidente do Departamento Científico de Infectologia da SBP; Renato de Ávila Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP; e Rosana Richtmann, diretora do Comitê de Imunizações da SBI.
O trio argumenta que “a carga da doença na população brasileira de crianças é relevante, incluindo, até o momento, milhares de hospitalizações e centenas de mortes pela covid-19 no grupo etário em questão, além de outras já demonstradas consequências da infecção em crianças, como a covid-19 longa e a síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P), todas elas de potencial gravidade”.
Confira, a seguir, a íntegra do documento:
"Assunto: Autorização do uso da vacina Comirnaty (Pfizer) em crianças de 5-11 anos
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), em conjunto com a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), após análise e discussão sobre o material apresentado pela farmacêutica Pfizer sobre o uso da vacina COVID-19 utilizando plataforma de RNA mensageiro (Comirnaty) em crianças de 5 a 11 anos, faz as seguintes considerações:
- Impacto da covid-19 em crianças de 5 a 11 anos no Brasil: de acordo com os dados oficiais fornecidos pelo Ministério da Saúde em seus Boletins Epidemiológicos publicados, a carga da doença na população brasileira de crianças é relevante, incluindo, até o momento, milhares de hospitalizações e centenas de mortes pela covid-19 no grupo etário em questão, além de outras já demonstradas consequências da infecção em crianças, como a covid-19 longa e a síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica (SIM-P), todas elas de potencial gravidade neste grupo etário.
- Evidências dos potenciais benefícios e riscos da vacinação da população na idade de 5-11 anos com a vacina Comirnaty: existem publicados estudos de fase 1/2 e 3 em crianças deste grupo etário, mostrando que, após duas doses da vacina Comirnaty em uma apresentação com 10 µg (1/3 da apresentação utilizada em adolescentes e adultos), as crianças de 5-11 anos apresentaram uma resposta de anticorpos neutralizantes em concentrações similares às observadas em adolescentes e adultos de 16-25 anos, preenchendo os critérios propostos de demonstração de não inferioridade. Além disso, houve demonstração de eficácia de 90.7% (IC95%, 67,7 a 98,3%) para a prevenção da covid-19 pelo menos 7 dias após a segunda dose e em um período de aproximadamente 2-3 meses. Não foram observados nestes estudos eventos adversos graves associados à vacinação, com um perfil de reatogenicidade favorável. A empresa forneceu ainda à Anvisa uma base de dados de segurança em duas coortes de crianças de 5-11 anos, cada uma delas com aproximadamente 1,5 mil crianças vacinadas, sem identificar eventos adversos graves. Faz-se importante destacar que o tamanho amostral é limitado (cerca de 2,5 mil voluntários acompanhados), e o tempo de seguimento, relativamente curto para determinar segurança em longo prazo. Por outro lado, temos hoje mais de 5 milhões de doses aplicadas desta vacina em crianças de 5-11 anos nos Estados Unidos da América (EUA) e em outros países, com dados de farmacovigilância não revelando eventos adversos de preocupação.
- Condições a serem cumpridas pela empresa após a autorização de uso da vacina neste grupo etário: a SBP e a SBI entendem que, após a aprovação pela agência regulatória e uso na população da vacina Comirnaty em crianças de 5-11 anos, o fabricante deverá manter vigilância de eventos adversos indesejáveis pós-comercialização (fase 4), assim como não medir esforços para orientar, de forma clara e sistemática, questões relacionadas à conservação, diluição e aplicação deste imunobiológico, visto que utilizaremos, nas mais de 38 mil salas de vacinação do nosso país, vacinas com a mesma finalidade, porém em frascos de cores diferentes, para faixas etárias diferentes e com volume de aplicação distintos, minimizando, assim, possíveis erros de administração de vacina. Sugerimos também a realização de estudos que possam identificar a eficácia/efetividade na prevenção de infecção assintomática; possibilidade de coadministração com outras vacinas pediátricas; uso da vacina em esquemas alternativos, com intervalos de doses superiores aos utilizados no estudo; além de dados de resposta imune celular.
A SBP e a SBI têm entendimento de que, à luz dos conhecimentos ora vigentes, os benefícios da vacinação na população de crianças de 5 a 11 anos, com a vacina Comirnaty, superam os eventuais riscos associados à vacinação, no contexto atual da pandemia. Desta forma, as referidas sociedades apoiam a autorização da vacina Comirnaty para as crianças na faixa etária solicitada pelo fabricante.
Marco Aurélio Palazzi Sáfadi
Presidente do Departamento Científico de Infectologia da SBP
Renato de Ávila Kfouri
Presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP
Rosana Richtmann
Diretora do Comitê de Imunizações da SBI"