Porto Alegre é a terceira capital que mais aplicou duas doses da vacina contra a covid-19 em toda a população, mostra levantamento de GZH com base em dados do Ministério da Saúde. Até esta terça-feira (31), 43,4% dos porto-alegrenses já fizeram as duas doses ou receberam dose única da Janssen.
O controle da prefeitura de Porto Alegre traz percentual ainda maior, com 57,3% da população tendo o esquema vacinal completo. Situação que também é observada em outras cidades, como São Paulo, onde a prefeitura informa cobertura da população é de 74,8% com a primeira dose e de 37,5% com duas aplicações.
Como o andamento das campanhas é dinâmico, pode haver maior demora no registro das doses aplicadas no painel do Ministério da Saúde. Pelo acompanhamento local, Porto Alegre aplicou 1.053.803 primeiras doses e completou duas doses em 648.314 pessoas.
Com a chegada da Delta, não há consenso sobre a meta de imunidade coletiva, mas autoridades vêm pontuando a necessidade de vacinar ao menos 90% de todos os habitantes com duas doses, o que necessariamente inclui adultos, adolescentes e crianças – estes dois grupos, ainda não contemplados.
O desempenho da capital gaúcha é superado apenas por Vitória (ES) e Campo Grande (MS), onde a prefeitura recebe R$ 2,10 do Estado por cada dose aplicada, assim como outros municípios sul-mato-grossenses.
Capitais do Sul e Sudeste predominam entre as coberturas mais altas, enquanto cidades do Norte e Nordeste estão entre as mais baixas – o pior desempenho é em Boa Vista (RR), onde apenas 14% dos habitantes receberam duas doses. Na aplicação da primeira dose, Porto Alegre cai para o nono lugar, com 67,8% de cobertura. Em primeiro lugar, está São Paulo (veja no gráfico).
Estados do Norte e Nordeste costumam atrasar o abastecimento de estatísticas, o que eleva a possibilidade de subnotificação, mas áreas mais ricas são beneficiadas em grandes políticas públicas, destaca o médico Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
— Sul e Sudeste tradicionalmente abastecem sistemas de informação mais oportunamente do que cidades do Nordeste. Mas, em geral, Estados com bom sistema de saúde e logística são mais ágeis. Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Ceará têm programas de imunização bem estruturados — diz Kfouri.
A disparidade entre as capitais é negativa e está relacionada também a fatores como disponibilidade de imunizantes, capacitação de profissionais e esclarecimento da população sobre as vacinas, diz Fabiano Guimarães, médico e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC).
As capitais com mais de 70% da população com a primeira dose, como São Paulo, Vitória e São Luís, têm estrutura de atenção básica mais robusta e postura pró-vacina, destaca o médico.
— Temos um fator nacional que acabou interferindo mais ou menos a depender da capital e, por isso, causou esse contraste (nos percentuais). Se a gente tivesse um forte controle, uma forte determinação do Ministério da Saúde, teríamos menos disparidade nos dados — ressalta Guimarães.
Com o avanço da Delta, que reduz a eficácia das vacinas, especialistas destacam que é ainda mais importante que brasileiros tomem duas doses – estudos apontam que o esquema completo traz grande proteção contra hospitalizações e óbitos. Foi para acelerar a cobertura do esquema completo que o Ministério da Saúde reduziu o intervalo entre as aplicações da AstraZeneca e da Pfizer de 12 semanas para oito, o que não foi posto ainda em prática.
— O sistema de vacinação de Porto Alegre sempre foi considerado modelo nacional. Temos estrutura para ir na vila. Mas, com a cobertura atual, ainda não dá para permitir grandes eventos e aglomerações. Talvez depois de reforço e com mais pessoas com esquema vacinal completo — comenta o médico Eduardo Sprinz, chefe da Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
O desempenho distante entre a cobertura de primeira e segunda dose na capital gaúcha pode estar associado a movimentos anti-vacina, sugere Paulo Petry, professor de Epidemiologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— Cabe um elogio ao sistema de saúde de Porto Alegre, sem entrar em questões políticas. Mas essa disparidade entre primeira e segunda dose intriga. Houve politização em relação às vacinas. Ao mesmo tempo, Fortaleza tem mais primeiras doses, mas muito menos segundas doses, o que sugere que, em Porto Alegre, quem se vacina se conscientiza mais para a segunda dose — diz o epidemiologista.
O secretário municipal da Saúde de Porto Alegre, Mauro Sparta, reconhece a tradição da capital gaúcha em vacinar e observa que a cidade só não têm melhor cobertura porque faltam imunizantes e porque chega ao limite da população apta a se vacinar.
Até esta terça-feira, 93% dos adultos com 18 anos ou mais receberam uma dose e 57% receberam duas ou a dose única da Janssen em Porto Alegre. A expectativa é de que a vacinação de adolescentes de 12 a 17 anos seja liberada nos próximos dias. Ainda não há autorização no país para imunização de crianças.
— Vacinamos todos os dias desde 19 de janeiro, seja sábado, domingo ou feriado. Enquanto isso, outras capitais param no fim de semana ou em feriado. Vitória e Campo Grande, que estão à nossa frente, são menos populosas. Nossa população de Porto Alegre se educou sabendo que precisa fazer vacina contra doenças respiratórias de inverno. Em 2009, tivemos a H1N1, que foi um trauma — diz o secretário.
Sparta destaca que a prefeitura expandirá cada vez mais locais de vacinação para chegar aos porto-alegrenses que não conseguem se deslocar a postos de saúde. Ele cita o Rolê da Vacina, ação que cria pontos itinerantes ao longo da semana. Só entre sexta-feira (27) e sábado (28), a tenda na Orla do Guaíba vacinou mais de 2,2 mil pessoas. Os próximos “rolês” incluem escola de samba e até igreja.
— Estamos propagando locais diferentes para atingir a população o mais rápido possível e, assim, aumentarmos a cobertura e voltarmos o quanto antes a um normal — diz Sparta.
A despeito dos bons indicadores de Porto Alegre, especialistas são unânimes ao afirmar que a população precisa evitar aglomerações, preferir ambientes ao ar livre e usar corretamente a máscara.
— Embora haja bons índices em Porto Alegre, a população precisa seguir os cuidados. A vacinação ainda não segura sozinha a epidemia. Nenhuma vacina protege 100%. Elas detêm a progressão da doença em grandes números, mas não dão conta de tudo — destaca o epidemiologista Paulo Petry.
Colaborou Jhully Pinto