Por Gustavo Mini Bittencourt
Mestre em design estratégico, professor em comunicação digital na Unisinos
Por Gustavo Borba
Diretor do Instituto para Inovação em Educação da Unisinos
Sempre que se fala em inovação na área da saúde, automaticamente lembramos de soluções relacionadas à tecnologia. Por exemplo: entre as 10 inovações em saúde de 2021 escolhidas pelo hospital americano Cleveland Clinic estão marcapassos conectados, equipamentos para ventilação, expansão da telemedicina, além, é claro, de inovação farmacológica em medicamentos. O relatório State of Healthcare, da consultoria CB Insights, acompanha a inovação em saúde dando grande atenção a temas como inteligência artificial, aparelhos digitais e análise de dados. Além disso, as movimentações das big techs Apple, Amazon, Google, Facebook e Microsoft no campo da medicina vêm ganhando cada vez mais espaço no noticiário.
A pandemia ampliou o interesse na chamada health tech – mas também evidenciou seus limites. Embora, graças a novas tecnologias, a indústria farmacêutica tenha produzido vacinas em tempo recorde e estejamos vivendo na sociedade mais conectada da história, a desigualdade social e o negacionismo de alguns muitas vezes impõem obstáculos para a aplicação dessas tecnologias. Ou seja, se por um lado dispomos de avançado conhecimento científico e inédita capacidade de criação de medicamentos, por outro podemos estar regredindo no que diz respeito à capacidade de mobilização em benefício do coletivo.
A saída para esse paradoxo depende de outro tipo de inovação: a social. Diferentemente da inovação tecnológica, o foco da inovação social não está em aparelhos ou sistemas, mas na forma como cidadãos se organizam e transformam suas vidas positivamente trazendo também benefícios a todos. Na inovação social, no lugar dos gênios empreendedores alavancados por capital de risco e às vezes indiferentes ao impacto de suas criações, temos grupos unidos por necessidades e desejos em comum e comprometidos com resultados sustentáveis nos âmbitos social, econômico, cultural e ambiental. No lugar dos gadgets e dos softwares inovadores, temos modelos organizacionais e formas coletivas de atuação inovadoras. No lugar dos designers superstars, temos designers que projetam vidas melhores para suas comunidades.
Quando designers estão inseridos nos contextos sociais e projetam junto às pessoas, ampliam seu olhar. E a construção de soluções ocorre a partir do coletivo. Na saúde, isso é fundamental porque reduz o longo caminho que separa os assépticos laboratórios de inovação tradicionais dos ambientes reais para os quais suas criações se destinam.
Um caso que ilustra esse processo foi desenvolvido em uma pesquisa de mestrado na Unisinos por um grupo formado por cuidadores de pessoas com Síndrome de Prader Willi. Eles criaram, em um processo de Design para Inovação Social, um novo modelo de associação de pacientes que lhes permitisse desenvolver e gerir atividades voltadas à promoção da saúde dentro da própria comunidade de uma forma mais colaborativa e horizontal. Em vez de pensar apenas em soluções que encontraríamos em laboratórios clínicos ou consultórios, o grupo imaginou uma comunidade que poderia fazer viagens curtas juntas para aprender como lidar com as dificuldades da síndrome em situações reais, mesclando aprendizagem coletiva e lazer. No centro da solução, não estava a tecnologia e nem o usuário individual – mas a comunidade.
Mais do que tecnologias que se tornam obsoletas ao longo do tempo, precisamos de uma mudança de modelo mental que promova proativamente o cuidado, e de forma sustentável, a inovação nas relações sociais e no acesso público à saúde. Para isso acontecer, precisamos ampliar nosso foco, construindo novas dinâmicas sociais caracterizadas por um bem-estar sustentável que leve em consideração a valorização das relações e os laços que formam as comunidades e a promoção de um ambiente de criatividade, tolerância e saúde estendido a todos, e não apenas a alguns privilegiados.
A inovação social não é limitada aos que podem pagar pelo último gadget, pelo último app ou pelo último tratamento genético. É um processo democrático e para todos, como deve ser a saúde.