O Brasil já atingiu 595,9 mil mortes por coronavírus, 46% a mais do que as estatísticas oficiais, de acordo com estudo realizado pelo Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME, na sigla em inglês) da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, divulgado na manhã desta quinta-feira (6).
Conforme os pesquisadores, quando as estatísticas oficiais informavam 408.680 mil vítimas da covid-19 no Brasil, o que ocorreu na última terça-feira (3), o número real era de 595.903 óbitos. Os números mais recentes, de quarta-feira (5), apontam 414,4 mil óbitos pela doença no Brasil.
Na menção ao Brasil, o estudo afirma que "há claro e significativo registro tardio de mortes desde junho de 2020". Na prática, a cada 100 óbitos por coronavírus no país, há 146.
Segundo a análise, o coronavírus causou 6,9 milhões de mortes durante a pandemia, mais do que o dobro reportado pelas estatísticas oficiais dos países. A subnotificação das vítimas, dizem os cientistas, é uma constante em praticamente todas as nações.
— Se não há testes suficientes, não há como rastrear as mortes, algo muito comum em países em desenvolvimento. Parte da subnotificação ocorre por rastreamento baixo e parte é sobrecarga do sistema de saúde — afirmou Cristopher Murray, diretor do IHME.
Até setembro, a previsão é de que o total de vítimas do coronavírus chegue a 9,4 milhões no mundo. Segundo o cientista, a atual pandemia deve rivalizar com a gripe espanhola em termos de números brutos de mortes.
Os países com mais mortes subnotificadas são também aqueles com os piores desempenhos da pandemia, mas algumas nações com epidemias “menores” tiveram um grande aumento na mortalidade em termos proporcionais.
Com base na análise da Universidade de Washington, o Brasil deixa de ser o segundo país com mais mortes no mundo, atrás dos Estados Unidos, e se torna o quarto – atrás de Estados Unidos, Índia e México.
Os Estados Unidos, a despeito de registrarem 574 mil mortes por coronavírus, já teriam chegado a 905,2 mil, um aumento de 57%. A Índia teria um crescimento de quase 200% e a Rússia, de 443%.
Ainda levando em conta as subnotificações, o Brasil deixaria de ser o 13º país com maior mortalidade por 100 mil habitantes e não figuraria entre as 20º nações com maior indicador – a prévia da análise não mostra a nova posição do Brasil.
A lista das nações com maior mortalidade em termos proporcionais é dominada por países asiáticos e do Leste Europeu, como Azerbaijão, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Albânia e Cazaquistão.
— As políticas de resposta nestes países foram menos vigorosas e as taxas de mobilidade eram maiores, então talvez não seja surpresa que a epidemia deles tenha sido pior. Mas de nenhuma forma eu acho que seja confortável para o Brasil saber que há países no Leste Europeu com taxa de mortalidade maior — afirmou Murray em resposta a questionamento de GZH.
O modelo matemático do IHME é acompanhado por cientistas e governos do mundo inteiro por conta da relativa precisão ao prever mortes para países e Estados.
Para chegar ao número de mortes subnotificadas, os pesquisadores analisaram o “excesso de mortalidade”, um indicador que leva em conta o número de mortes esperadas para um período com base no mesmo intervalo do ano anterior.
O excesso de mortalidade foi então ajustado para remover os óbitos por outras doenças indiretamente afetadas pela pandemia, em razão da sobrecarga do sistema de saúde.
— Em janeiro, identificamos que as novas variantes, como a P.1, mudariam o comportamento da pandemia e impediriam atingir a imunidade de rebanho — acrescentou Murray.
O médico e economista Bruce Duncan, professor de Epidemiologia na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que a subnotificação no Brasil não é pouca, mas que ainda assim é menor do que em outros países, muito por conta da existência do Sistema Único de Saúde (SUS).
— Estamos em uma situação horrível e bem pior do que o necessário. Nosso presidente faz um gol contra depois do outro. Tínhamos muito mais para dar certo, e não demos certo. Mas a subnotificação no Brasil é menor do que em outros países, o que fala sobre o sistema de saúde de cada país. O número de mortes na Índia triplicou, e sistema de saúde público da Índia não chega perto do SUS — avalia Duncan.
A subnotificação de mortes no Brasil não é tão alta como em outras nações porque a política de testagem é focada justamente em casos graves, afirma a estatística Suzi Camey, professora de Epidemiologia na UFRGS. Fosse analisada a subnotificação de casos, o cenário seria outro.
— Nosso programa de testagem está direcionado para pacientes graves, então a testagem para quem morre de covid é bastante boa. Estamos bem no sentido de notificação, mas péssimos no sentido de quantidade de mortes. Se achamos 400 mil mortes um absurdo, 600 mil é pior ainda, é avassalador. Se a Índia está péssima, nós estamos muito ruins. Nosso número de mortos é muito grande, independentemente da métrica. Faz sentido a Nova Zelândia olhar para essa tabela e dizer que está bem, mas não o Brasil, com 400 mil mortos — analisa a epidemiologista.