Passado um mês desde que um ato simbólico no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, em 18 de janeiro, marcou o início da vacinação no Rio Grande do Sul, o Estado se prepara para o desafio de avançar no atendimento a novos grupos enquanto se concentra na imunização dos prioritários, ainda longe de terminar. Das 704 mil doses recebidas pelo governo estadual, foram aplicadas 358 mil – as restantes correspondem à segunda dose, necessária para se obter a resposta imune esperada para a prevenção da covid-19.
Mas, considerado o total de grupos prioritários no Estado, a meta está longe de ser alcançada. O Rio Grande do Sul tem quase 4,5 milhões de pessoas acima de 60 anos, profissionais de saúde, indivíduos com doenças graves, indígenas e quilombolas. Desses, cerca de 8%, apenas, começaram a ser imunizados.
A bióloga e imunologista Cristina Bonorino avalia que o ritmo de vacinação em todo o Brasil está abaixo do necessário para garantir a proteção dos grupos mais vulneráveis, o que pode incentivar novas variedades do vírus.
— O ritmo em que a gente está vacinando não é absolutamente adequado. Pelo contrário: é perigoso. Porque se a gente demora para vacinar a população, dá tempo de o vírus circular e evoluir para formas que podem ficar mais transmissíveis — estima Cristina, que é professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).
Ainda assim, no cenário nacional, o Rio Grande do Sul está entre os Estados que apresentam uma situação mais tranquila em relação ao estoque dos imunizantes e ao avanço do atendimento para novos grupos. Em outros, há falta de doses e risco de estoque zerado.
Apesar de ter saltado na frente entre os Estados com maior percentual de vacinação da população, ocupando atualmente o sexto lugar nacional, especialistas garantem que o Rio Grande do Sul precisa aumentar o estoque de imunizantes para aplicar as doses a mais pessoas – o que passa por desafios que preocupam o país inteiro.
— Raramente o Programa Nacional de Imunização (PNI) falhou. Mas, confesso que fico muito preocupado com a falta de transparência que existe no Ministério da Saúde. Para uma campanha nacional envolvendo, provavelmente, mais de uma vacina, e em duas doses, a logística é solucionável, mas não simples — garante o pesquisador do Núcleo de Bioética e Ética Aplicada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Reinaldo Guimarães.
A distribuição de doses aos Estados é responsabilidade do Ministério da Saúde. A expectativa é que a vacinação possa ser retomada e ampliada a partir de 25 de fevereiro, quando o Instituto Butantan prevê a produção de até 8,6 milhões de doses da CoronaVac, feitas no Brasil em parceria com a Sinovac, com insumos vindos da China no início do mês.
O governo federal trabalha com a perspectiva de entrega de mais 4,8 milhões de doses da CoronaVac aos governadores na próxima semana. E o Rio Grande do Sul deve receber cerca de 300 mil doses de vacina contra a covid-19 – informação confirmada pela secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, à coluna da jornalista Kelly Matos.
Mesmo em países europeus houve escassez de vacina. Isso está acontecendo no mundo inteiro, é o maior gargalo
CYNTHIA MOLINA BASTOS
coordenadora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs)
A coordenadora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), Cynthia Molina Bastos, explica que a dificuldade no envio de novas remessas não é um problema que atinge apenas o Rio Grande do Sul ou o Brasil.
— Vale lembrar que mesmo em países europeus houve escassez de vacina. Isso está acontecendo no mundo inteiro, é o maior gargalo. E faz com que aquele discurso de manter os cuidados seja ainda mais importante. Estamos correndo contra o vírus — explica a médica.
Cynthia explica ainda que a imunização da população não passa apenas apenas por vacinar lenta ou rapidamente, mas por buscar manter os cuidados como uso de máscara, álcool gel e distanciamento.
— Se a gente baixa a transmissão e dá tempo de vacinar, é uma coisa. Mas se aumenta a transmissão e pega a vacinação em baixa, é outro cenário. A vacinação é mais um motivo para nos cuidarmos ainda mais.
Em Porto Alegre, que nesta semana ampliou a faixa etária para a imunização, que agora permite a vacinação dos idosos com 83 e 84 anos, 62,54% da população-alvo com 83 anos ou mais já foi vacinada, conforme dados da Secretaria Municipal de Saúde atualizados até o início da tarde desta terça-feira (16). Entre os profissionais da saúde, o percentual é maior: com mais de 57 mil trabalhadores vacinados, chega a 69,63% o total de imunizados.