O tratamento com o antiviral remdesivir acelera a recuperação de pacientes hospitalizados com covid-19, de acordo com estudo divulgado na noite desta sexta-feira (22). Os testes realizados com 1.063 infectados, em 10 países, apontam que pessoas nas quais foi administrado o medicamento levaram, em média, quatro dias a menos para se recuperarem do que os tratados com placebo.
O estudo, conduzido pelo Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos, foi divulgado pela publicação científica New England Journal of Medicine. Os testes concluíram que os pacientes que receberam o antiviral, injetado por via intravenosa por 10 dias, tiveram tempo médio de recuperação de 11 dias, já os demais, em média, 15 dias.
— Isto faz com que, por exemplo, pessoas possam ficar menos tempo em UTI (Unidade de Tratamento Intensivo). Vai facilitar o atendimento e fazer com que seja mais difícil não haver vaga nos hospitais para casos mais graves — analisa o infectologista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Eduardo Sprinz.
Outro ponto positivo destacado pelo especialista sobre o estudo é que o medicamento se mostrou seguro nos pacientes nos quais foi testado e que menos pessoas evoluíram para quadros mais graves.
— Estamos engatinhando no tratamento da covid-19. Este é o primeiro estudo real, que mostra que um medicamento claramente é melhor do que nada. Isso é fundamental. Já que as cloroquinas têm que ficar no lugar delas. Esta é uma medicação que a gente tem mais confiança — avalia Sprinz.
Já o infectologista André Luiz Machado da Silva, do Hospital Nossa Senhora da Conceição, reconhece a importância do estudo, mas pondera que ele não alcançou o principal ponto buscado no enfrentamento à doença: a redução dos óbitos. A estimativa de mortalidade em 14 dias foi de 7,1% com remdesivir e 11,9% com placebo.
— Se viu que é uma medicação que recupera mais rapidamente os pacientes, mas na mortalidade não demonstrou diferença quanto ao placebo. São dados alentadores no sentido de que houve redução no tempo de doença, o que pode nos ajudar numa situação de liberação mais precoce dos leitos. É uma luz que se acende no fim do túnel — afirma.
Por outro lado, o especialista ressalta que, como parte dos pacientes não teve a análise finalizada até a divulgação desses resultados presentes na publicação, não foi possível apontar se o tempo de estadia no hospital também teve a mesma redução alcançada no período de melhora.
— Apesar daqueles que usaram terem tido tempo menor de doença, não necessariamente quem teve melhora conseguiu sair do hospital. Isto não está respondido plenamente. Se aguardam os resultados dos dados finais. É uma estratégia que tem sua posição nesta busca de medicamentos para tratar os indivíduos com covid-19. Mas é possível que o ideal seja a associação com alguma outra medicação — afirma.
O próprio estudo alerta que “dada a alta mortalidade, apesar do uso de remdesivir, está claro que o tratamento apenas com um medicamento antiviral provavelmente não será suficiente”. O medicamento é o mesmo autorizado em 1º de maio pelos Estados Unidos para ser usado em hospitais em caso de emergência. O remdesivir não possui registro no Brasil. Na linha de frente das autoridades científicas envolvidas na pesquisa deste medicamento nos Estados Unidos, está o médico natural de Bagé, na Fronteira Oeste, André Kalil. Especialista em doenças contagiosas, formado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em fevereiro ele explicou em entrevista a GaúchaZH como funcionaria o estudo, com uso de placebos e de remdesivir e quais os resultados almejados.
— Esperamos ter um paciente com menos febre, menos tosse, menos dor de cabeça, menos falta de ar, saindo do hospital e tendo uma vida normal — disse.
Entenda o estudo
Método
O estudo foi realizado em pacientes adultos hospitalizados com covid-19, com insuficiência respiratória. Os pacientes foram aleatoriamente designados para receber remdesivir, por dia por até nove dias ou placebo por até 10 dias. Todos os pacientes receberam cuidados de suporte de acordo com o padrão de atendimento do hospital onde estavam.
Perfil
A idade média dos pacientes foi de 58,9 anos e 64,3% eram do sexo masculino. A pesquisa foi aplicada nos Estados Unidos, Dinamarca, Reino Unido, Grécia, Alemanha, Coréia, México, Espanha, Japão e Cingapura. Dos pacientes, 79,8% eram da América do Norte, 15,3% da Europa e 4,9% da Ásia. A maioria apresentava outras comorbidades, como hipertensão (49,6%), obesidade (37%) e diabetes (29,7%). Novecentos e quarenta e três (88,7%) pacientes apresentavam doença grave no momento do início do estudo.
Resultados
A pesquisa envolveu 1.063 pacientes, mas o resultado se baseia em 1.059 deles – sendo 538 que receberam remdesivir e 521 placebo. Quatro pacientes não foram incluídos na análise porque não havia dados disponíveis. Aqueles que receberam o antiviral tiveram tempo médio de recuperação de 11 dias – variando entre nove e 12. Já os que receberam placebo tiveram tempo médio de 15 dias – variando entre 13 e 19.