Por Mauro Weiss
Médico urologista, diretor clínico do Hospital Moinhos de Vento
No último dia 18 de março, movido pela proteção pessoal e de meus familiares frente à pandemia da covid-19, entrei em isolamento preventivo (tenho 62 anos) e, desde então, estou em casa. Algo impensável para mim, que normalmente acordo às 6h, chego ao Hospital Moinhos de Vento às 7h e não tenho hora para sair, acumulando, com muito prazer, as funções normais de urologista desde 1985 e diretor clínico há quatro anos.
Nesse contexto de crise que tanto afeta os profissionais da saúde, passamos a manter atividades em home office, atendendo via telemedicina, realizando reuniões virtuais e, acima de tudo, lendo muito. Tudo o que antes se restringia à atualização em minha especialidade, com breves incursões nos jornais e aplicativos de notícias, transformou-se em busca diária e obsessiva pela informação sobre a pandemia.
Três textos e uma entrevista me chamaram atenção em especial, gerando o meu ímpeto de escrever. Rodrigo Lopes e Cristina Bonorino foram brilhantes em suas recentes avaliações em GaúchaZH sobre o tema “guerra versus luta da ciência”. Recomendo também a entrevista dopresidente da França ao Financial Times. Emmanuel Macron sublinha que “a economia é uma ciência moral, a solidariedade está em jogo no mundo”. E, no dia 17 de abril, uma nota publicada num dos periódicos de maior prestígio na medicina, o Journal of the American Medical Association, escrita pelo diretor médico de um hospital americano, Dr. Andrew Artenstein, serviu como impulso final dessa minha pretensão.
O colega descreve a verdadeira “odisseia” que foi a compra de equipamentos para seu hospital, o qual encontrava-se com estoque baixo de máscaras e ventiladores. O relato é dramático, tipo filme Missão Impossível: reunião secreta num armazém, interrompida pelo FBI, caminhões disfarçados e com rotas de viagem separadas para evitar interceptação, transferência bancária e apelo político de última hora para impedir o confisco de bens. Me coloquei na pele do médico gestor e, confesso, senti angústia. Vieram à mente os textos de GaúchaZH aqui citados. Não devemos comparar a luta da ciência com uma guerra e tampouco usar terminologias bélicas. O que quero fazer é enaltecer o quanto reconhecemos quem está por trás de nossa atividade médica.
O Moinhos de Vento conta com a equipe certa na hora mais incerta. Nossos administradores têm demonstrado competência ímpar, admirável e esperada, pois trabalham num hospital referência em saúde no Brasil. O planejamento estudado no último semestre de 2019 já evaporou. Até o momento, a instituição abriga um terço dos casos de coronavírus de Porto Alegre, apesar de os preços de insumos estarem em patamares astronômicos. Por trás de cada doutor que estende a mão e pede um tubo endotraqueal para colocar o paciente em ventilação estão nossos superintendentes administrativos, financeiros e de operações monitorando voos pelo mundo, redirecionando cargas aéreas para evitar desvios de remessas, controlando estoques minuto a minuto, para não deixar o doutor de mãos vazias, sem EPIs, e o paciente, desassistido. A ciência não pode correr, mas a logística deve voar. Temos uma TI atualizada e presente. E, quando somos orientados pela enfermagem de como colocar e retirar adequadamente os EPIs, por trás está a superintendência assistencial, realizando treinamentos, cursos de atualização, alterações de escalas, atendendo aos colaboradores e seus familiares.
Não devemos comparar a luta da ciência com uma guerra e tampouco usar terminologias bélicas. O que quero fazer é enaltecer o quanto reconhecemos quem está por trás de nossa atividade médica.
Não paramos de realizar pesquisas e de gerar conhecimento, buscar tratamentos, coletar e divulgar dados, sob a tutela de gestores médicos e de ensino. Não deixamos de aprender medicina devido à pandemia. Temos a humildade necessária para estarmos sempre estudando. E seguimos dando atenção às famílias dos pacientes, cumprindo normas de atuação, prevenção e controle.
Pois é nesse sentido que vem o meu muito obrigado sincero a todos da “retaguarda”. Eles também merecem panelaços e palmas nas janelas. Têm nossa eterna gratidão e reconhecimento. Sabem que a missão do Hospital Moinhos de Vento segue inquebrantável: cuidar de vidas. E ninguém está em guerra: todos vestimos branco!