Além da dor da perda do pai, a assistente administrativa, Patrícia Tomazzini Rosa, de 47 anos, convive com um sofrimento adicional. Ela não se conforma que a covid-19, responsável pela morte de Martinho Osório Cardoso, aos 78 anos, tenha sido detectada tarde demais, quando o quadro de saúde se mostrou irreversível.
Ela conta que o périplo começou em 29 de março, quando levou o pai para o Hospital de Pronto Socorro de Canoas com diarreia e vômitos.
– Expliquei que ele era hipertenso e tinha diabetes. O que mais precisava para fazer o teste? – questiona.
Patrícia lembra que o hospital alegou que Martinho não tinha sintomas do coronavírus. Ele teve sangue coletado, foi tratado para infecção intestinal e liberado para casa. Patrícia decidiu cuidar do pai em casa, no bairro Bom Jesus, em Porto Alegre. Mas ele seguiu adoentado. Sem apetite, não comia e vomitava até a água que bebia.
Patrícia conta que levou o pai a um posto de saúde perto da Bom Jesus. Martinho recebeu soro e remédio para estancar a infecção intestinal e mandado embora. Ele quis voltar para Canoas, onde vivia com a mulher Verônica, no bairro Harmonia.
– Ele passou a noite gemendo de dor pelo corpo. Na manhã seguinte, voltamos a Canoas e o levamos para a UPA do bairro Rio Branco – recorda.
Ali, afirma Patrícia, foi aplicado teste que deu resultado positivo para o coronavírus. Martinho foi internado de imediato no Hospital Universitário de Canoas. Nos três primeiros dias, o aposentado se alimentava e conversava normalmente, mas logo passou a se queixar de falta de ar e foi entubado.
Patrícia conta que a família não podia visitar o pai e nem telefonar para saber notícias, que seriam repassadas por um médico.
– Em 7 de abril, nos avisaram que ele sofreu duas paradas cardíacas.
Três dias depois, a família foi chamada ao hospital. A notícia não era boa. Martinho não resistira. Morreu às 4h40min daquela Sexta-feira Santa. Não teve nem reconhecimento de corpo, levado direto para cremação, afirma a filha.
– Nos pegou de surpresa. É muito dolorido. Há duas semanas, ele estava brincando, rindo. Toda Sexta-feira Santa vamos lembrar esse fato muito triste nas nossa vidas. Se tivessem feito teste antes...– lamenta Patrícia.
Martinho era vendedor aposentado. Deixou oito filhos (três do primeiro casamento e cinco do segundo), 10 netos e dois bisnetos.
O que diz a Secretaria de Saúde de Canoas
A Secretaria de Saúde de Canoas esclarece que segue as recomendações do Ministério da Saúde e da Secretaria Estadual da Saúde para o enfrentamento à pandemia, seguindo os princípios operacionais do Sistema Único de Saúde do Brasil. Dessa forma, todas as ações exercidas pelos profissionais da saúde em qualquer município seguem as determinações de instâncias superiores que determinam que:
Os testes sejam realizados SOMENTE em: profissionais da saúde e de segurança que apresentarem sintomas e em pacientes internados, conforme nota informativa da SES de 23 março de 2020 e a portaria 54 do Ministério da Saúde.
Quanto aos procedimentos relativos ao velório, a determinação obriga que os caixões sejam fechados e somente os profissionais responsáveis pelos preparativos tenham o contato com o corpo, de acordo com a Nota Técnica 01/2020 da Vigilância Estadual em Saúde.
Desta forma, no caso em questão, os profissionais e unidades de saúde de Canoas seguiram rigorosamente as determinações da Ministério e da Secretaria Estadual. Cabe informar que: o paciente foi testado no dia 4 de abril, logo após ter dado entrada na UPA e ter a recomendação de internação feita pela equipe médica de plantão.
Questionamentos relativos às condutas mencionadas devem ser encaminhadas diretamente aos órgãos elaboradores de tais protocolos.