Cientistas comprovaram a eficácia de uma nova substância para tratar o ependimoma, um dos mais severos tipos de câncer em crianças. Testes in vitro e com camundongos mostraram que um anticancerígeno produzido com glândulas salivares do carrapato-estrela é eficaz no tratamento de um tipo de câncer cerebral infantil que atinge um tecido do sistema nervoso central.
Os pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e do Instituto Butantan, também na capital paulista, aguardam investimentos que possibilitem a infraestrutura para a produção da droga e consequentes testes clínicos com humanos.
As propriedades anticancerígenas da proteína codificada por genes do carrapato Amblyomma sculptum, nome científico do carrapato-estrela, foram descobertas nos anos 2000 e tinham sido comprovadas com tumores agressivos, como o câncer de pâncreas e o melanoma.
— Quando descobrimos a possibilidade dessa droga, decidimos investigar suas ações contra o ependimoma — diz o neurocirurgião Sérgio Cavalheiro, da Escola Paulista de Medicina, da Unifesp.
Segundo o médico, o ependimoma representa cerca de 10% dos tumores infantis do sistema nervoso central — e até 30% dos tumores cerebrais nas crianças com até 3 anos. Quando esse câncer atinge o cérebro, ou cerebelo, e o tronco encefálico, “a situação é catastrófica”, disse Cavalheiro. O neurocirurgião destaca que a alternativa é cirúrgica, combinada com radioterapia e quimioterapia. Mesmo assim, a operação pode deixar sequelas neurológicas e não salvará o paciente.
— A gente fica sempre em busca de um medicamento para evitar as recidivas — explica.
Dossiê para solicitação de análise
Os testes com camundongos mostraram que o tratamento foi muito mais efetivo do que qualquer outro remédio utilizado atualmente. Com os medicamentos existentes, é possível inibir a viabilidade das células tumorais em cerca de 30%. A nova substância, batizada de Amblyomin-X, por sua vez, atingiu 70%.
Os pesquisadores desenvolveram um protocolo que garante a produção em escala para disponibilização da substância para os testes clínicos. Para submeter à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) um dossiê para solicitação de análise dos resultados obtidos até agora, é necessário a comprovação da produção da molécula de Amblyomin-X em condições de boas práticas, garantindo a escala industrial e condições de manutenção e estabilidade da fórmula.
— Não foi feito até hoje porque não tivemos infraestrutura ainda para produzir a proteína recombinante. Pelo menos aqui no Butantan, a gente está agora se organizando, não especificamente para esse (estudo), mas qualquer projeto que vier dessa mesma natureza. Mesmo a empresa que a gente tem parceria não tem essa infraestrutura — explica a coordenadora do Centro de Excelência para Descobertas de Alvos Moleculares, no Instituto Butantan, Ana Marisa Chudzinski-Tavassi.