Um medicamento milionário apontado como a cura de uma das doenças genéticas mais letais teve sua venda aprovada nos Estados Unidos e já leva esperança a famílias de todo o mundo. Ao custo de US$ 2,1 milhões (cerca de R$ 8,4 milhões a dose, que é única), o Zolgensma promete eliminar a atrofia muscular espinhal (AME), doença que afeta 1 a cada 10 mil recém-nascidos, podendo levar à morte ou exigir o uso de aparelho de respiração artificial.
A Food and Drug Administration (FDA), órgão americano que fiscaliza alimentos e remédios, informou que a segurança do Zolgensma foi comprovada por teste clínico em curso e outro já concluído, do qual participaram 36 pacientes com idades entre duas semanas e oito meses. O grupo farmacêutico suíço Novartis está à frente da medicação e anunciou, na semana passada, o aval das autoridades regulatórias americanas para a terapia genética.
O preço foi explicado por se tratar de um novo tipo de tratamento transformado que resultaria em economia de 50% em comparação com atuais terapias. Nos EUA, o custo total de US$ 2,1 milhões poderá ser pago em parcelas anuais de US$ 425 mil (R$ 1,7 milhão).
— Zolgensma é um avanço histórico para o tratamento da AME e uma terapia genética histórica — disse o diretor-executivo da Novartis, Vas Narasimhan.
A maior evidência de efetividade apontou que “os pacientes tratados demonstraram uma melhora significativa em sua capacidade para alcançar as bases motoras para o desenvolvimento”, incluindo o controle da cabeça e a capacidade de sentar sem apoio.
— É uma terapia inovadora, e eles acrescentam um lucro bem alto. Temos experimentado isso com outros medicamentos também, como o Spinraza, que era a única medicação até agora para essa doença. Foi lançada há cerca de dois anos por R$ 600 mil a dose, hoje já se fala em metade disso. A gente não sabe o investimento para fazer a pesquisa e o novo remédio, não divulgam o valor real — afirma o médico neurologista da Santa Casa de Porto Alegre Ricardo Santin.
Santin reconhece que o Zolgensma é inovador e diz que o remédio usa um vírus para transportar uma proteína para dentro da célula. O resultado é uma correção do DNA afetado, uma cura genética nos casos de tipo 1 – que pode se manifestar no bebê no útero da mãe. Mas ele afirma que a tendência é de os resultados se repetirem nos tipos 2 e 3, que englobam crianças entre sete e 18 meses de idade em diante. Significa que crianças que não andariam e mal conseguiriam respirar sozinhas ganham de volta a plena capacidade muscular e uma vida sem limitações:
— A luta agora é termos o diagnóstico precoce, que é possível por meio do teste do pezinho expandido. Só que esse teste não chegou ainda no SUS, custa R$ 80 a mais do que o teste tradicional.
A presidente da Associação Brasileira de Atrofia Muscular Espinhal (Abrame), Fátima Braga, celebra a nova droga:
— Uma criança tratada com esse novo medicamento poderá ter uma vida normal, como eu e você. Teremos uma parcela dos paciente curados! Eu nunca pensei que fosse ver uma coisa dessas em toda a minha vida, parece coisa de ficção científica.
O Zolgensma ainda não está à disposição no Brasil. Segundo a Abrame, a Novartis já encaminhou o pedido de registro do medicamento à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o primeiro passo. Até agora, só havia uma droga para combater a Ame, chamada Spinraza, que é de uso contínuo e consegue conter o avanço da doença. Cada dose tem o custo de R$ 318 mil.
Saiba mais sobre a doença
- A atrofia muscular espinhal (AME) é uma doença genética e hereditária que resulta em fraqueza progressiva dos músculos e atrofia, podendo levar à morte por falência respiratória.
- Ela é causada por mutações em um gene, o SMN1. Pessoas com apenas uma única cópia alterada do gene não terão sintomas da doença, mas são portadoras. Caso tenham filhos com outra pessoa que também tem uma cópia mutada, há 25% de chance dos filhos manifestarem a Ame.
- É classificada com base na idade de início:
TIPO 1 – Forma severa que pode se manifestar no bebê ainda no útero da mãe.
TIPO 2 – Forma intermediária que se manifesta entre 3 e 15 meses de idade.
TIPO 3 – Forma menos severa, a partir dos 2 anos até a vida adulta.
- Sem uma cura definitiva, o tratamento exige fisioterapia e aparelhos ortopédicos. O único medicamento no mundo disponível até agora, o Spinraza, atua para impedir que a degeneração progrida, sendo de uso contínuo. É necessária internação e anestesia geral para que o medicamento seja injetado.
- O Zolgensma é aplicado diretamente na corrente sanguínea, sem necessidade de internação ou aparato mais complexo. Ele tem a capacidade de corrigir o DNA danificado que causa a doença.
- Com ambos os medicamentos, o diagnóstico precoce é fundamental. Para isso, é necessário o chamado teste do pezinho expandido, que atualmente não é oferecido pelo SUS e custa aproximadamente R$ 80 a mais do que o teste tradicional.