Em uma manhã de domingo de cara amarrada, com céu carregado, Lorenzo Iracet Ferreira, 10 anos, coloriu a Redenção, em Porto Alegre, com sua fantasia de Gurilício: uma mistura entre o personagem Guri de Uruguaiana, interpretado pelo humorista Jair Kobe, de quem o menino é fã, e o palhaço Francilício, um amigo da família.
Com enormes sapatos amarelos, nariz de plástico vermelho e chapéu de palha, o menino chegou ao parque com um carregamento de pirulitos em formato de coração aos quais estava grampeada uma mensagem: "Autismo não é doença, é apenas uma diferença". A ideia para a distribuição das guloseimas partiu do próprio Lorenzo, aluno do 5º ano de uma escola regular da Capital, que participou com os pais, na manhã deste domingo (7), de algumas das atividades que vêm marcando a passagem do Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo (2 de abril) promovidas pelo Instituto Autismo & Vida, da Capital.
Henrique Ferreira, 51, gestor de segurança privada, e Isabel Cristina Perceval Iracet Ferreira, 52, servidora pública, costumam se engajar em iniciativas que promovem a divulgação de informações sobre esse transtorno de desenvolvimento, diagnosticado no filho caçula quando ele tinha dois anos e quatro meses — as professora da Educação Infantil perceberam a introspecção e a dificuldade de interação social do garoto e alertaram os pais.
— Apesar dos limites, é possível conviver e integrar as pessoa de fato, não só na legislação, que é pífia — afirmou Henrique.
Isabel salientou a importância de outras pessoas, que desconhecem o autismo ou sabem pouco a respeito, terem a oportunidade de conversar com as famílias de autistas e de se informar.
— É uma luta diária. Difícil, mas não impossível — contou a mãe, destacando o numeroso time de profissionais que acompanham Lorenzo, tais como neurologista, psiquiatra, psicólogo, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, educador físico, psicopedagogo e fisioterapeuta.
Além da venda de camisetas, cartilhas e livros e da promoção de brincadeiras, o Instituto Autismo & Vida organizou uma caminhada, a partir das 11h, pela Rua José Bonifácio, entre o Monumento ao Expedicionário e a Avenida Osvaldo Aranha. A maior parte dos participantes vestia azul, cor que simboliza o autismo.
Vice-presidente do instituto, a advogada Claudia Meyer, 50, ressaltou a importância de as características do transtorno — que podem ser muito diversas, a depender do caso — sejam conhecidas pela população. É comum que um autista, por exemplo, não consiga lidar com excesso de estímulos visuais e auditivos, o que pode impedi-lo de acompanhar um filme no cinema e deixá-lo nervoso.
— Algumas crianças autistas não são birrentas, como muitos acham, elas apenas se desorganizam. Precisamos falar sobre o que as pessoas com autismo sentem para que os outros não sejam mais uma barreira — disse Claudia, mãe de Bruno, 22 anos, que é autista.
Entenda a condição
— O autismo é um transtorno de desenvolvimento que se manifesta, geralmente, antes dos três anos de idade. É comum os pais observarem alterações na criança a partir dos 18 meses, quando ela parece se "desconectar" do universo ao redor.
— Caracteriza-se por alterações na comunicação, no relacionamento interpessoal (pouca interação) e um repertório de interesses muito restrito, por vezes com a fixação em um único tema.
— Destacam-se também movimentos esquisitos e repetitivos do corpo, preferência pelo isolamento, intolerância ao toque ou a sons altos (a criança entra em pânico quando a mãe liga o liquidificador, por exemplo), caminhada na ponta dos pés, interesse maior por objetos do que por pessoas e fascínio por objetos que giram (ventilador de teto, roda de bicicleta). O primeiro sinal a despertar a preocupação dos pais costuma ser o atraso na fala.
— Mais da metade dos autistas apresenta déficit cognitivo, mas há também pacientes muito inteligentes e até superdotados.