Tem alguma coisa que viajante despreze mais do que atraso de voo? Sim. Talvez se sentar em um avião sujo ou ao lado de alguém que esteja tossindo, espirrando ou coisa pior.
Comissários e passageiros passam por (e geralmente registram) todo tipo de afronta à saúde pessoal e à higiene no confinamento de uma cabine aérea – desde traços de sangue na mesinha retrátil a fralda suja no bolso traseiro do assento, passando pela mulher que, descalça, fica mexendo nos dedos e nas unhas dos pés.
Agora imaginem a coreografia complexa envolvida na limpeza de uma aeronave como um Boeing 737, com mais de 160 lugares, nos poucos minutos entre a chegada ao portão e sua partida. É uma tarefa complicada e os riscos, enormes. Afinal, esse inverno está sendo marcado pela "atividade gripal disseminada", segundo descrição do Centro de Prevenção e Controle de Doenças – e, no mês passado, duas pessoas aterrissaram no Aeroporto Internacional O'Hare, em Chicago, com sarampo.
Embora os especialistas afirmem que o maior risco para a saúde do passageiro na cabine seja a exposição aos outros viajantes, esse perigo pode aumentar se as superfícies e banheiros não estiverem propriamente limpos.
Geralmente as companhias aéreas contratam empresas terceirizadas para fazer os "giros rápidos" (a limpeza entre voos) e a limpeza noturna, como também a higienização profunda, que ocorre uma vez por mês. E fazem questão de saber a opinião dos clientes quanto ao serviço; além disso, acompanham e inspecionam as contratadas por conta própria.
Algumas delas, porém, incluindo Delta, JetBlue e Southwest, se recusaram a escalar um representante para discutir a limpeza de seus aviões; entretanto, a associação que representa parte das companhias nos EUA, a Airlines for America, disse, através da porta-voz Alison McAfee: "A segurança e o bem-estar dos passageiros e tripulantes são sempre nossa prioridade; sabemos que a limpeza dos aviões e dos componentes da cabine são importantes para os clientes."
Segundo Michael Taylor, especialista em viagens do J.D. Power, um estudo sobre a satisfação com as empresas aéreas realizado pela sua companhia descobriu que há "uma tendência significativa de alta na percepção e satisfação do passageiro com a limpeza da cabine e dos banheiros" nos últimos três anos. Essa mudança é, em parte, consequência da introdução agressiva de novos aviões, que "realmente ajudam a melhorar a avaliação simplesmente pelo fato de a aeronave ser mais nova", afirma ele.
Membros antigos e atuais das equipes de limpeza entrevistados pelo New York Times descrevem o ambiente de trabalho, cuja remuneração não supera o salário mínimo: a moral é baixa e a rotatividade, alta. O Sindicato Internacional de Empregados de Serviços vem dando assistência a seus integrantes para a melhoria de benefícios, condições de trabalho e sindicalização.
Sameer Yousef, funcionário da ABM, uma das empresas contratadas pelas companhias aéreas, supervisiona uma equipe de quatro pessoas que higieniza as aeronaves da United no Aeroporto Internacional de San Francisco. Segundo ele, em média, o grupo limpa a cozinha, os pisos, os banheiros, assentos e janelas de mais de doze aviões por dia de trabalho.
— O ideal seria ter de dez a quinze minutos, mas nos dão de seis a sete, às vezes menos, para o giro rápido. É uma pressão imensa porque não nos dão mais pessoal.
Yousef confessa que o trabalho é duro.
— A gente acaba tendo problemas nas costas. Também, é o dia inteiro arcado, limpando as bolsas nas costas dos assentos, arrumando os cintos de segurança, tem que abaixar para olhar o fundo das cadeiras, subir para ver os compartimentos de bagagem.
Eles também são responsáveis pelas varreduras de segurança periódicas realizadas em cada aeronave, mas Yousef afirma que nem ele, nem seus funcionários recebem lanternas ou espelhos para a tarefa. Ele usa a iluminação que lhe oferece o celular.
Um relatório de 2015 do Government Accountability Office (órgão responsável pela auditoria, avaliações e investigações do Congresso norte-americano) descreveu em detalhes o "tempo limitado" que o pessoal da limpeza tem antes da chegada dos passageiros do voo seguinte observando que as equipes podem precisar pedir "um período adicional necessário para a descontaminação" do avião. Os limpadores relataram ao GAO que "após casos em que o passageiro passa mal durante o voo, nem sempre a tripulação avisa sobre a presença de fluidos corporais com potencial infeccioso que contaminaram a cabine". O documento concluiu que aos EUA faltam "um plano de ação nacional abrangente para prevenir e conter a disseminação de doenças através da viagem por ar".
De acordo com Robert W. Mann Jr., consultor do setor de aviação baseado em Port Washington, Nova York, a primeira coisa que o passageiro nota é a limpeza ou sujeira do ambiente e é essa percepção que vai permear toda a sua experiência.
— Quando o passageiro percebe falta de higiene, ele associa isso à percepção de que a companhia pode não fazer a manutenção das aeronaves, o que não é boa coisa — , comenta. E completa: — O bom do design moderno é a facilidade de limpeza; não há mais tantas reentrâncias e saliências que armazenam sujeira.
Apesar disso, muitos viajantes mais experimentados resolvem a questão com as próprias mãos, literalmente. Karla Schaus, blogueira de Toronto e dona do Studio Beauty Co., descreve-se como "germofóbica" e muitas vezes denunciou as condições de aeroportos e aviões no Twitter.
— A rotatividade é muito grande. É uma coisa que sempre me preocupa quando voo. Tento nem pensar em quantas pessoas já sentaram na minha poltrona.
Schaus conta que compra higienizador de mão profissional e recentemente começou a andar com uma caixa de lenços desinfetantes, depois de ter visto outras pessoas limpando o assento e as superfícies que tocam com eles.
— Dá a sensação de que você está fazendo o que pode para se proteger da melhor maneira possível. Se mexe no cinto, se tira a mesinha, pelo menos sabe que foi você mesmo que limpou — diz ela enquanto cumpre o novo protocolo. E fica toda feliz em compartilhar os artigos de limpeza.
Ela explica também que usa a saída de ar para manter o ar "(mais ou menos) fresco" durante a viagem.
— Já foram várias vezes que pedi para trocar de lugar por causa das más condições de higiene ou por estar ao lado de uma pessoa doente. Na minha opinião, os germes não discriminam. Primeira classe, executiva ou econômica, nada protege contra a falta de limpeza.
Para a Dra. Phyllis Kozarsky, professora de Doenças Infecciosas e diretora médica da clínica TravelWell da Faculdade de Medicina da Universidade Emory, as companhias aéreas criam um ambiente de "desmotivação assustador" para o viajante que tem que alterar seus planos, cobrando multas altas.
— Com isso, mesmo doente, a pessoa viaja.
McAfee, da Airlines for America, diz que a capacidade de mudar a data ou cancelar o voo depende da situação e que os passageiros devem entrar em contato com a empresa porque cada caso é analisado "individualmente".
O Dr. Martin Cetron, diretor da divisão global de migração e quarentena do Centro de Prevenção e Controle de Doenças, diz que o maior risco para a disseminação de doenças infecciosas em aeronaves está nos passageiros, e não no ambiente.
— No geral, dados os milhões de pessoas que estão voando o tempo todo, o número de doenças infecciosas associadas ao ambiente da aeronave é relativamente pequeno em relação ao volume constante.
Para ele, as doenças respiratórias, como a gripe, são as mais preocupantes no ambiente da cabine. Sarampo e tuberculose também são especialmente preocupantes porque "tem a capacidade de se manter e sustentar no ar por grandes períodos".
Cetron diz que o passageiro que limpa o ambiente à sua volta no avião pode ter "algum tipo de vantagem maior", contanto que não sejam medidas que substituam os "benefícios protetores mais amplos", como a higiene básica das mãos, vacinação em dia e manter-se em casa se cair doente.
— Não adianta muita coisa limpar toda a superfície do assento e da mesinha se você não se vacina contra a gripe ou o sarampo. Sem dúvida, é o tipo de esforço em vão.
Por Joshua Brockman