Uma "tempestade perfeita" ameaça desandar todo o progresso já feito pela proteção da saúde óssea dos norte-americanos: conforme a população acima de 50 anos aumenta, diminui o número de adultos que correm o risco de perda óssea avançada e fraturas que estão passando pelo teste da densitometria, resultando em um declínio no diagnóstico e tratamento da osteoporose, mesmo entre aqueles que já tiveram fraturas.
Se essa tendência não for revertida logo, com uma campanha mais incisiva e direcionada aos que sofrem do mal e seus médicos, o resultado pode ser desastroso, gerando uma verdadeira epidemia de ossos quebrados, visitas a consultórios, consultas em hospitais, internações em casas de repouso e até mortes prematuras. Atualmente, muita gente que corre risco de fratura – e, por tabela, seus médicos – não está conseguindo perceber os benefícios do tratamento de ossos frágeis por causa dos perigos amplamente alardeados dos medicamentos de preservação óssea.
Uma grave consequência já parece estar andamento: a estagnação e possível reversão do que foi um declínio de 15 anos em fraturas de quadril em mulheres na pós-menopausa, de acordo com um novo estudo com todas as inscritas do Medicare hospitalizadas com fratura de quadril osteoporótica entre 2001 e 2015.
Os dados revelam que houve um declínio significativo nesse tipo de lesão em mulheres acima de 65 anos que passaram pelo sistema público de saúde: em 2002, eram 931 em cada 100 mil; em 2015, esse número caiu para 730/100 mil. No início de 2012, porém, a proporção para a faixa etária estagnou repentinamente. Se o declínio tivesse continuado, calcula-se que 11.464 não teriam sofrido fratura entre 2012 e 2015, afirmaram os pesquisadores na edição de dezembro da publicação Osteoporosis International.
— Cerca de 80% dos pacientes com fratura de quadril nunca foram tratados da osteoporose, embora praticamente todos sofram do mal e corram o risco de repetir a quebra — afirma E. Michael Lewiecki, diretor do Centro de Osteoporose e Pesquisa Clínica do Novo México, em Albuquerque, e principal autor do estudo.
Embora a medicação para preservação óssea reduza o risco de uma segunda fratura, um estudo com 22.598 pacientes revelou que seu uso caiu "do que já eram irrisórios 15%, em 2004, para insignificantes 3% no último trimestre de 2013", escreveu o Dr. Sundeep Khosla, especialista da Clínica Mayo, em Rochester, Minnesota, em 2016, na publicação Journal of Bone & Mineral Research. E comparou a situação ao não tratamento de pacientes hipertensos ou com colesterol elevado após um enfarte. Referindo-se à situação como "uma crise no tratamento da osteoporose", ele prossegue:
—Apesar do desenvolvimento de diversos fármacos eficazes para a prevenção de fraturas, muitos pacientes, inclusive aqueles que inegavelmente precisam de tratamento, não estão recebendo nenhuma prescrição para remédio contra a osteoporose e, quando isso acontece, se recusam a tomá-lo.
O problema é grave, tanto para pacientes como a sociedade como um todo. Em termos só da fratura de quadril, dependendo de como é tratada, os custos médicos diretos dos seis primeiros meses variam, em média, entre US$34.509 a US$54.054, dos quais o Medicare arca com a maior parte, escrevem os autores do estudo. Todo ano, mais de 300 mil pessoas acima de 65 anos, 75% sendo mulheres, são hospitalizadas com fratura de quadril.
Os custos pessoais são muito mais altos: entre 20% a 30% dos pacientes morrem dentro de um ano após o incidente e, como relatam os pesquisadores, "dos que sobrevivem, muitos não recuperam a agilidade que tinham antes. Metade dos pacientes fraturados não consegue mais andar sem assistência e 25% vão exigir cuidados em longo prazo".
São vários os fatores que podem ter contribuído para queda de fraturas que acabou em 2012, segundo Ethel Siris, uma das autoras do novo estudo e diretora do Centro de Osteoporose Toni Stabile do Centro Médico da Universidade Columbia, em Nova York.
— A população pode estar se tornando mais saudável, com as pessoas praticando mais exercícios e talvez tomando mais cuidados para evitar quedas — sugeriu, em entrevista.
Entretanto, ela e seus colegas acreditam que o principal motivo tenha sido o lançamento, em 1995, do Fosamax, um bifosfonato que retarda ou previne a perda da densidade óssea, resultando em ossos mais fortes.
O medicamento hoje está disponível na versão genérica, o alendronato e, ao lado de diversos outros remédios, é capaz de fortalecer a estrutura óssea. Contudo, Siris disse:
—Sem dúvida, existe uma disparidade no tratamento. O número de receitas caiu, e mesmo os pacientes que correm risco de fratura se recusam a tomar o remédio.
Milhões de pacientes que poderiam se beneficiar dos remédios para a preservação óssea hoje têm medo de tomá-los. A desconfiança provavelmente é resultado de um marketing agressivo e dos médicos receitando bifosfonatos nos estágios iniciais da perda óssea, para um problema chamado osteopenia, com tratamento continuado por muitos anos mais do que hoje é considerado apropriado. No início dos anos 2000, novos relatórios pareciam ligar o uso contínuo dos bifosfonatos a dois problemas ósseos raros: uma fratura incomum no fêmur e outra condição, ainda mais excepcional, a osteonecrose mandibular. O medo dessas complicações resultou em uma queda de mais de 50% no uso do medicamento de 2008 a 2012, segundo Khosla.
Ao mesmo tempo, houve uma redução drástica no reembolso dos exames de densitometria óssea feitos através do Medicare – e os médicos que os faziam em consultórios particulares não tinham mais condições de arcar com a despesa, limitando assim o acesso, diagnóstico e tratamento de perda óssea grave, apesar das grandes melhorias nos tratamentos.
Nas mais de duas décadas desde que os bifosfonatos foram lançados, "aprendemos muita coisa em relação a quem deve ser tratado e como", afirma Khosla. E a osteopenia não é mais um problema que garante medicação por si só, a não ser que outros fatores indiquem que o paciente esteja correndo riscos cada vez mais sérios de fraturar um osso.
Segundo os especialistas, ele deve iniciar tratamento se a densitometria indicar osteoporose no quadril, coluna ou antebraço.
— Mas mesmo que o resultado indique somente osteopenia, a pessoa deve ser considerada osteoporótica se tiver tido uma fratura não traumática no quadril, coluna, ombro e, às vezes, no pulso, ou se tiver um valor alto no FRAX (calculador de risco de fratura on-line) para saber o prognóstico para os próximos 10 anos — diz Siris.
Seu conselho se resume a três cuidados:
—Medicação quando necessária, consumo adequado de cálcio e vitamina D, e muito cuidado para não cair.
— O tratamento deve ser individualizado. Um paciente é diferente do outro; cada um tem um histórico familiar, diferentes fatores de risco e velocidade da perda óssea, preocupações pessoais. Se o foco for nos pacientes com risco elevado de fratura, a evidência é clara. Os benefícios do tratamento com o remédio superam, em muito, os riscos — conclui Khosla.
Por Jane E. Brody