A Expo Favela RS se encerra na noite desta sexta-feira (29), no Centro de Eventos da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em Porto Alegre.
Na ocasião, serão anunciados os 10 projetos selecionados das comunidades da periferia para representar o Estado na Expo Favela Innovation Brasil, que será realizada em dezembro, em São Paulo.
Na manhã desta sexta, os visitantes puderam acompanhar uma série de apresentações, atividades, conversas, atrações e até uma animada roda de capoeira no evento.
— A gente desenvolve um trabalho na comunidade de Alvorada há mais de 12 anos. Temos o projeto Gingando pela Vida, que atende as comunidades do Umbu, da Stella Maris e do Jardim Aparecida — contextualiza a professora de capoeira Maitê Disconzi, 39 anos.
Os capoeiristas que se apresentaram eram do grupo Umbu. Trata-se de mais de 50 alunos que são atendidos pelo projeto em um espaço público do município da Região Metropolitana.
— Eles (alunos) virem aqui e se identificarem com o que estão vendo, acho que eles levam para a vida. Assim como o que a capoeira consegue desenvolver com eles como ferramenta social — acrescenta Maitê.
Era possível ver grupos de alunos de escolas públicas conhecendo os estandes e conversando com os expositores.
Coletivo de aldeias indígenas
Entre os estandes, há exposição de artesanato caingangue. O Coletivo Territórios Ancestrais, que congrega aldeias indígenas de Porto Alegre e da Região Metropolitana, foi criado durante a enchente de maio, conta o caingangue Murilo Munìí, 28, que vive no Morro Santana:
— Tudo começou entre o apoio mútuo das tribos que já existem aqui em Porto Alegre e na Região Metropolitana. Conseguimos nos articular para o transporte das doações, da venda dos artesanatos e outros tipos de demanda para além da enchente — exemplifica.
Atualmente, cerca de 20 mulheres indígenas buscam, por meio do artesanato, a autonomia e o fortalecimento das culturas ancestrais. Mais informações podem ser encontradas no Instagram @territoriosdors.
Cerveja com memória afetiva
Outro estande destaca a cerveja preta artesanal sem álcool Pretinha, produzida em Novo Hamburgo. A responsável é a técnica em enfermagem Janaína de Oliveira, 43. A bebida tem sido produzida para consumo familiar, mas a idealizadora tem planos de expandir o negócio.
— A Pretinha surgiu com a ideia de resgatar uma tradição de nossa família. O meu avô, Valdemar de Oliveira, fazia cerveja preta para as festas de final de ano e aniversários para substituir o refrigerante. Porque ela é doce e sem álcool — recorda a neta.
Naquela época, a cerveja era produzida em garrafas de vidro que eram posteriormente enterradas para a preservação da temperatura durante a fermentação. Em outras vezes, a produção ficava armazenada em um galpão do avô. A receita foi passada para os filhos.
— Depois que ele morreu se perdeu essa tradição. Em 2022, eu resolvi fazer para ter em casa e relembrar. E surgiu a ideia de empreender — detalha Jana, como é conhecida.
A cerveja sem álcool é feita a base de lúpulo, quilaia (substância, com propriedades medicinais, extraída da casca da árvore de mesmo nome), açúcar e fermento. O produto é oferecido em garrafas PET de 500ml (vendidas a R$ 10), mas também sob encomenda para garrafas de dois litros (R$ 30). Por enquanto, a venda é feita para amigos, por meio da internet, ou durante participações em feiras. A produção é toda custeada pela idealizadora.
— A ideia é tentar expandir, mas estou um pouco assustada ainda com a repercussão. Estamos ouvindo alguns patrocinadores e donos de bares dando ideias. Estou vendo as possibilidades — comenta a expositora.
Quem quiser saber mais sobre a Pretinha pode acessar o perfil no Instagram @pretinha.cervejapreta.
Poesia para vencer o preconceito
A aposentada Eloíza Dalila de Oliveira, 53, aproveita a Expo Favela RS para divulgar seus livros de poesia com a temática da negritude.
O caminho para chegar até aqui não foi fácil. Vinda da periferia do interior do RS, filha de pai alcoólatra e violento, perdeu a mãe cedo e precisou ir para um semi-internato de freiras, onde viveu por mais de sete anos.
— Lá eu era a única negra de todo o internato. Fui bastante judiada naquela época com racismo — revela.
Já adulta, trabalhou como auxiliar de enfermagem por 29 anos em uma emergência pediátrica de um grupo hospitalar da Capital.
— Adquiri desde cedo o hábito de escrever. Escrevia poesias e tudo o que me acontecia de bom e de ruim, eu colocava num caderno — menciona.
Então, chegou a pandemia de Covid-19 e, ao mesmo tempo, a aposentadoria de Eloíza. Com restrições de interações sociais, ela releu tudo o que havia escrito e começou a participar de saraus e oficinas de escrita criativa de forma online. Entrou para a Associação Poemas à Flor da Pele, mas só teve coragem de lançar seu primeiro livro — Reinvente-se! Poesias Pós Pandemia — dois anos mais tarde.
— Todas as minhas impressões e o que aconteceu (durante a pandemia) foram tema do meu primeiro livro lançado — compartilha ela, que também integra a Academia de Belas Artes do RS.
Em 2024, a poetisa ingressou no Coletivo de Escritores Negros do Rio Grande do Sul e pôde participar do lançamento de antologia com os demais integrantes.
— Meu objetivo é divulgar o trabalho e que mais pessoas saibam a história real do negro. Fazemos pesquisas e visitamos quilombos. É conhecimento, divulgação e vendas, porque precisamos nos manter — conclui.
Quem quiser saber mais sobre o trabalho da poetisa pode acessar o perfil do Instagram @negradalilapoesias.