Local onde ficam concentradas a pista de skate e as quadras esportivas, o trecho 3 da Orla do Guaíba, em Porto Alegre, segue em reformas em função dos estragos da enchente de maio. Os espaços dos bares, dos sanitários de uso público e da sala onde funciona a Secretaria Municipal de Esporte, Lazer e Juventude estão sendo reconstruídos. Os trabalhos começaram em 4 de novembro.
A revitalização é uma contrapartida da Cyrela Goldsztein em troca da construção de três empreendimentos, situados nas ruas Marquês do Herval, Florêncio Ygartua, Castro Alves, Mariante e Avenida Getúlio Vargas. O serviço tem previsão de término em seis meses e investimento de R$ 5,2 milhões.
O diretor de Áreas Verdes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade, Alex Souza, comenta sobre os impactos sofridos pelos bares localizados no trecho 3 durante a cheia.
— A Avenida Edvaldo Pereira Paiva é um dique e serve como uma proteção. Os bares foram feitos na cota dessa proteção do Guaíba. Então, eles sofreram muito com essa inundação. Tiveram as redes de água e de esgoto obstruídas e as partes elétrica e de ar-condicionado comprometidas — compartilha.
Os três bares impactados receberão esquadrias de vidros mais resistentes e removíveis. A ideia é que em caso de futura inundação, haja tempo hábil para os empreendedores retirarem os equipamentos e móveis de dentro. Enquanto os espaços passam por reformas, os permissionários optaram por oferecer as operações de forma provisória em contêineres (leia mais abaixo).
— Temos os permissionários dos bares e os ambulantes. Foi facultado a oferta de contêineres para todos, mas houve só dois interessados para colocar (o equipamento) na Orla — afirma Souza, acrescentando:
— Esse contêiner é temporário. Assim que as obras estiverem finalizadas, os bares voltam para os seus lugares.
Segundo a prefeitura, as bancadas que eram em granito estão sendo substituídas por tampos de concreto. As paredes de alvenaria comum serão agora de bloco de alvenaria estrutural, com agulhas e presas de forma mais robusta no piso. Os banheiros receberão revestimento com cerâmica para facilitar a limpeza.
O paisagismo do trecho 3 também passará por intervenções. A grama será substituída, exceto a das quadras esportivas, que é sintética e já foi trocada. Haverá plantio de mata ciliar às margens do Guaíba, recomposição dos taludes e o solo será descompactado para a realização do processo. As mudas nativas a serem plantadas serão trazidas do Viveiro Municipal.
— Na mata ciliar tem o colchão reno (conhecido ainda por colchão de gabião, tem como objetivo revestir, proteger e estabilizar as margens e encostas de canais, rios e córregos), que segura para a água não ir levando a terra para dentro. Eles (colchões reno) também sofreram danos e serão recuperados — assegura o diretor de Áreas Verdes da Smamus.
"É como se estivéssemos iniciando mesmo", diz empreendedor sobre recomeço em contêiner
Dois contêineres na cor preta já estão em funcionamento na Orla. Tratam-se dos espaços improvisados dos bares Espartano e Sunset POA. A reivindicação para operar nesses locais partiu dos próprios empreendedores, para terem algum faturamento enquanto não podem trabalhar nos pontos originais e em reforma.
Um dos sócios-administradores do Espartano, Ramon Nobre, explica como encara a situação de ter de operar de forma improvisada. O espaço foi aberto há duas semanas junto ao ponto impactado, porém na parte alta do trecho.
— É como se estivéssemos iniciando mesmo. Vamos ter de investir novamente. Enfim, pelo menos está todo mundo bem e poucos funcionários foram atingidos. O que a gente mais quer agora é voltar a trabalhar — revela, completando:
— Por mais que o contêiner seja provisório, talvez a gente tente brigar para que ele fique. A gente tem medo de que, se acontecer de novo (enchente), como vai se comportar (o local). É isso, é voltar a trabalhar.
Poder operar com o contêiner não foi tão simples quanto aparenta. Além de ser necessário autorização da prefeitura, o Espartano precisou comprar o equipamento. O preço foi R$ 23 mil, sem contar o frete para trazer de Itajaí, em Santa Catarina, até Porto Alegre. Os valores totais devem chegar aos R$ 35 mil, calcula Nobre.
— A prefeitura vai refazer toda a parte elétrica e colocar uma bancada, o que não tinha ali antes. Vamos ter que investir mais uns R$ 120 mil pelo menos — estima o empreendedor, em relação ao ponto em obras.
Os impactos da enchente ainda obrigaram o Espartano, que ocupa o ponto em frente à pista de skate desde 2021, a transferir os funcionários da unidade da Orla para a operação na Avenida Protásio Alves. Mas após dois meses e com dificuldades de faturamento, quase todos foram demitidos, exceto o gerente. Mais de seis meses após o começo da inundação, o cenário é de recomeço.
Nesta terça-feira (26), às 10h30min, o funcionário Luiz Fernando Filipini de Oliveira atendia no contêiner do Espartano. Enquanto a reportagem de Zero Hora conhecia a estrutura, chegavam insumos como laranjas, ovos e outros itens utilizados na preparação de comidas, lanches, drinks e sucos para os frequentadores da Orla.
Dentro do equipamento podem ser vistos dois congeladores, três geladeiras, uma chopeira, um balcão e uma pia, além de equipamentos e utensílios de menor tamanho. Não há ar-condicionado e a eletricidade vem do ponto original.
— Finalmente, estamos com contêiner aqui. Eu era do Espartano e fui atingido diretamente e indiretamente (pela enchente). Perdi meu trabalho. Foi um ano bem conturbado, mas é muito bom ver isso aqui de novo. Fico muito grato de poder estar aqui de novo — comemora o funcionário.
A situação do Sunset POA é semelhante. Os dois espaços no trecho 3 (situados em frente à quadra 20 e à pracinha) da Orla, além de outro localizado no trecho 1, foram danificados pela inundação. Nenhum ainda foi reaberto. A solução foi comprar um contêiner da mesma empresa onde o Espartano adquiriu o equipamento e dividir o frete com o vizinho de operação.
O sócio-proprietário Leandro da Silva de Oliveira conta que foram inúmeras as dificuldades desse período sem poder operar nos três estabelecimentos.
— O contêiner é um efeito paliativo. É uma coisa para amenizar a nossa situação. Não vamos conseguir operar com a mesma estrutura, até por causa do tamanho, mas já é alguma coisa para começar a arrecadar e diminuir o prejuízo que estamos tendo — observa Oliveira.
O Sunset POA também foi obrigado a fazer algumas demissões em razão dos impactos da cheia e enxerga o atual momento como um recomeço. A ideia do empreendedor é manter o equipamento por mais tempo mesmo após o espaço estar reformado.
— Dentro do bar, a água destruiu tudo e derrubou parede, os balcões. O que a água não levou, o pessoal saqueou. Foi tudo depredado — recorda.
Questionado sobre o sentimento de estar sem poder trabalhar mais de seis meses após o começo da enchente, Oliveira ressalta que não é uma experiência fácil.
— Passamos pela pandemia e agora isso. Deixa uma apreensão muito grande e uma insegurança. Será que vai voltar ou não. Será que poderemos contar com a prefeitura ou não — questiona.
— Vocês viram, é uma retomada devagar. Meio acanhada — conclui.