Apesar do cenário triste nos bairros Humaitá e Vila Farrapos, com o excesso de lodo, cheiro forte e entulho espalhado, o domingo (23) foi marcado por um sentimento de esperança no local, com o tempo seco e uma corrente de solidariedade. Cerca de 2 mil voluntários passaram pela região, na zona norte de Porto Alegre, para limpar as ruas e 200 residências que foram devastadas pela enchente. O mutirão aliviou um pouco a dor dos moradores, que estão há mais de um mês nessa situação.
— A gente não conseguiu limpar. Ficamos muito abalados. É muito importante essa ajuda. Eu cheguei, entrei ali, conseguimos abrir a porta e já fomos embora. Porque não tem como... Sei lá, é muito triste, né. É uma coisa que tu leva a vida toda (para construir) — afirmou o motorista Carlos Rubem dos Santos, de 61 anos, que mora na Rua Affonso Robles Filho há quatro anos.
Ele e a esposa vivem no local com os três filhos, mas a casa ficou debaixo d’água por muito tempo e eles acabaram perdendo tudo. Para recuperar as residências é necessário realizar uma limpeza pesada, uma vez que muitas estão com camadas grossas de lama e mofo no piso e nas paredes. Os voluntários se reuniram em grupos de 10 pessoas para cada casa.
Eles se encontraram às 9h deste domingo em frente à Arena do Grêmio, na Avenida Padre Leopoldo Brentano, onde formaram uma fila para pegar os materiais de limpeza e proteção. Depois, atuaram na força-tarefa até o final da tarde. Classificada como a maior faxina solidária do Rio Grande do Sul, a ação foi organizada pela plataforma gaúcha Meu Lar de Volta.
— É muito gratificante ver o sorriso de uma pessoa quando a gente ajuda, não tem preço. As pessoas perderam tudo, estão sem nada. Mas, mesmo assim, elas agradecem a gente e ficam felizes. Ainda mais depois de toda essa chuva que teve durante a noite, é muito bom ver esse tempo seco e poder ajudar o próximo — conta a voluntária Patrícia Neves, de 27 anos, que foi junto da mãe se unir à mobilização. Ela diz que se inscreveu assim que ficou sabendo do mutirão.
Com auxílio do Instituto Vakinha, foi realizado um levantamento prévio dos moradores que estavam precisando de ajuda para fazer a limpeza, que serviu para preparar a lista com 200 endereços na região — a mais atingida da Capital. A marca Ypê foi responsável pela doação de 2,5 mil kits de produtos de limpeza, incluindo sabão em pó, água sanitária, desinfetante e detergente líquido.
Os voluntários também receberam equipamentos de proteção individual. Além da Ypê e do Instituto Vakinha, a startup Trashin, o Grêmio, o Exército e a Marinha do Brasil contribuíram com a ação. Cerca de 300 militares da Operação Taquari participaram da iniciativa voluntariamente, ajudando no transporte dos materiais e no mutirão de faxina.
Além disso, a Marinha forneceu três veículos leves, quatro veículos pesados, uma carreta, duas retroescavadeiras e um caminhão basculante para auxiliar no transporte dos entulhos recolhidos. O Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) também participou da ação, com equipes e máquinas atuando no local.
Os resíduos recolhidos são encaminhados aos terrenos temporários da Capital que ainda estão recebendo detritos. Chamados de “bota-espera” pelo DMLU, os três locais provisórios ficam na Rua Sérgio Jungblut Dieterich, 1201 (Sarandi); na Rua Voluntários da Pátria, S/N, Acesso 4 (Humaitá); e na Avenida da Serraria, 2517 (Serraria).
Moradores e empresas podem fazer o descarte de resíduos pós-enchente nestes pontos. A partir de segunda-feira (24), uma empresa terceirizada ficará responsável pelo recolhimento dos materiais para realizar a destinação final.