A presença de mercadinhos dentro dos condomínios consolidou-se de vez em Porto Alegre. A operação funciona durante as 24 horas do dia em uma pequena sala ou até em um contêiner. Os moradores podem acessar produtos como alimentos, bebidas, itens de limpeza e higiene sem a necessidade de deslocamentos até supermercados ou pontos de venda. Os imóveis com esses ambientes inclusive estão mais valorizados no mercado.
Na terça-feira (23), o estudante Matheus Ricoi, 18 anos, acessou o estabelecimento dentro do condomínio onde vive, no bairro Agronomia. O jovem chegou descalço e rapidamente encontrou o produto que procurava.
— Vim buscar óleo para fazer comida. Venho principalmente aos finais de semana para pegar doces — compartilha, dizendo ser uma opção cômoda por não precisar sair para a rua para comprar.
O condomínio onde o estudante mora tem cerca de 260 unidades. Ou seja, muitas pessoas frequentam o espaço de 18 metros quadrados, e oito freezers. Também há algumas mesinhas no lado de fora. Nos dias quentes, os moradores pegam sorvetes, sentam nas cadeiras e aproveitam o momento de lazer.
Em outro condomínio localizado no Jardim do Salso, a estudante Martina Guimarães Martins, 16, ingressou no espaço onde fica o mercadinho em busca de alguns artigos. As compras dela foram papel higiênico, um pacote de biscoitos de polvilho e uma lata de refrigerante.
— Meu pai faz bastante jantar para os amigos. Venho buscar coisas que faltam como temperos. Mas quando estou com amigas costumo pegar bebidas — diz, estimando visitar o local pelo menos três vezes por semana.
O mercadinho conta com sete equipamentos de refrigeração. Ao contrário do anterior, este não ocupa um contêiner e está abrigado em uma sala de 30 metros quadrados. Produtos como sorvete, crepe congelado, sopa de moranga congelada e até pratos prontos refrigerados estão à disposição. A reportagem de GZH chegou a ver uma bandeja com salada de maionese pronta para ser consumida.
Este condomínio conta com aproximadamente 300 apartamentos. Há espaço até para quem quiser tomar o café da manhã no próprio ambiente do mercadinho. A praticidade é uma das marcas desse negócio que parece ter caído no gosto dos frequentadores.
Normalmente, o contêiner utilizado para a operação do Quadrado Express possui 12 metros quadrados, enquanto as salas cedidas nos condomínios ficam em torno de 15 metros quadrados. A startup instala minimercados autônomos em condomínios residenciais e corporativos em Porto Alegre. A empresa existe há quatro anos e já instalou 85 mercadinhos, sendo 15 deles no interior de contêineres.
— O mercadinho tem um posicionamento intermediário entre o supermercado tradicional e o posto de gasolina — define o diretor-executivo do Quadrado Express, Gildo Sibemberg.
Para pagar, o condômino cadastra o cartão uma única vez no aplicativo pelo celular. Os mercadinhos possuem totens de autoatendimento que oferecem a possibilidade de pagamento por crédito, débito e até Pix. Não há atendentes, ou seja, o processo é automatizado. Câmeras de videomonitoramento acompanham toda a movimentação. Os produtos mais procurados são bebidas alcoólicas, sem álcool e a parte de bombonière.
— O mix contempla 500 itens e até carne fresca e carvão. Se o condômino chega em casa e resolve fazer um churrasquinho de última hora, ele vai encontrar vazio, pão de alho e linguiça — ilustra Sibemberg, citando que o atendimento ocorre muitas vezes de forma emergencial.
Na soma da Capital com a Região Metropolitana, o Quadrado Express, que começou a oferecer o serviço durante a pandemia da Covid-19, estima que existam atualmente 250 mercadinhos em condomínios em pleno funcionamento.
— É um mix bem testado, já sabemos o que vende — comenta Roberto Noll, um dos sócios da empresa.
A SmartStore também atua no ramo. A empresa trabalha dentro de condomínios e de companhias. As operações iniciaram um pouco antes do começo da pandemia. O padrão de tamanho utilizado nas estruturas é de pelo menos cinco metros quadrados, mas há outras opções.
— Trabalhamos em quatro formatos de lojas: espaços cedidos, compartilhados, loja parede (geralmente ficam no hall de entrada) e a opção do contêiner — afirma Ana Paula, integrante do departamento comercial da SmartStore.
A empresa já conta com 13 lojas inauguradas em Porto Alegre. Outras cinco passam por processo de implantação, enquanto 18 minimercadinhos estão em negociação com o condomínio onde deverão ser instalados.
— Fizemos uma pesquisa junto às construtoras. De 10 pessoas entrevistadas, sete estão buscando comprar imóveis hoje em dia que já tenham esse espaço de minimercado automatizado dentro do projeto — revela Ana Paula.
O objetivo principal passa pelo custo zero ao condomínio. Dessa maneira, a empresa banca, por exemplo, a montagem do espaço e a manutenção dos equipamentos. A SmartStore tem mais de 1,6 mil mercadinhos licenciados no país e três lojas em Miami, nos Estados Unidos.
— Realmente é o futuro. É um local seguro e funciona 24 horas por dia de forma autônoma. E o abastecimento é feito conforme a demanda — menciona ela.
Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, até fevereiro deste ano, Porto Alegre contava com 5.182 mercados de rua. Porém, a pasta não tem dados sobre o número de mercadinhos presentes dentro dos condomínios.
— Não temos muitos dados, porque os mercadinhos são atividades de baixo risco e dispensam alvará. Mas vemos com muitos bons olhos qualquer atividade econômica na cidade que venha a facilitar para as pessoas fazer suas compras nos seus condomínios — observa a secretária Júlia Evangelista Tavares.
Para o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis (Secovi-RS), os mercadinhos de autoserviço representam uma iniciativa interessante ao promover o abastecimento de itens rápidos aos condôminos. A entidade ressalta a falta de indicadores para poder se avaliar esses estabelecimentos.
— Esses mercadinhos não têm ainda uma unidade que possa servir de base para estatísticas. Então, não sabemos quantos existem e quais condomínios dispõem desse serviço — esclarece o presidente do Secovi-RS, Moacyr Schukster.
Imóveis com mercadinhos estão mais valorizados no mercado
As próprias construtoras já preevem espaço para essas lojas autônomas na planta dos imóveis, assim como ocorre com áreas para salões de festa e academias de musculação. A necessidade desses mercadinhos veio com a pandemia, quando as pessoas não podiam interagir socialmente em razão dos riscos de contaminação.
A gerente de Condomínios Gestão Total da Auxiliadora Predial, Sabrina Barreto dos Santos, explica o caminho a ser percorrido para os condomínios poderem contar com esse serviço. Primeiro, é preciso se aprovar a ideia em assembleia. Em seguida, o síndico procura empresas especializadas, solicita propostas e leva aos condôminos para escolha.
— O síndico faz as entrevistas com as empresas e leva à assembleia para as pessoas entenderem como funciona. E até para ver as questões de custos, porque tem geladeira, luz, sinal de internet e o local para a instalação. A maioria não tem um lugar específico, então é preciso criar um — detalha a gerente.
As pessoas nos procuram e já perguntam por isso (espaço para conveniência) nos plantões de venda. Trata-se de um baita diferencial competitivo. Tu acaba tendo um condomínio-clube para os moradores
JOÃO PAULO MARIA
Gerente-geral de Negócios da Melnick
Na maioria dos casos, as próprias empresas instaladoras subsidiam as estruturas e até bancam o sinal de internet. Tudo isso é negociado antes do fechamento do negócio. Conforme estima Sabrina Barreto dos Santos, metade dos condomínios que atende têm mercadinhos automatizados. E, de acordo com ela, a valorização ocorre por duas razões.
— Pela comodidade e por que os preços são praticamente os mesmos de mercado das maiores companhias. O preço é atrativo e não superfaturado por estar dentro de um condomínio. Valoriza na hora de vender o imóvel ter um mercadinho — pondera.
O gerente-geral de Negócios da Melnick, João Paulo Maria, diz que a construtora não utiliza contêineres nos projetos. A empresa costuma oferecer o serviço em espaços entre 20 metros quadrados a 25 metros quadrados. Às vezes, opta por aproveitar uma parte do ambiente de área comum para colocar o mercadinho em funcionamento.
— As pessoas nos procuram e já perguntam por isso (espaço para conveniência) nos plantões de venda. Trata-se de um baita diferencial competitivo. Tu acaba tendo um condomínio-clube para os moradores — acredita João Paulo Maria.
A Melnick enxerga os novos empreendimentos já com a incorporação dessa oferta de conveniência. O objetivo é oferecer algo a mais para os condôminos, além da própria residência para viver.
— Essas facilitações que se têm realmente são um diferencial muito grande para as pessoas poderem morar. Elas estão procurando por isso — conclui.