A comunidade do Morro da Cruz, na zona leste de Porto Alegre, está sendo submetida a um experimento para amenizar as altas temperaturas e a sensação de abafamento durante o verão. Uma pequena casinha de madeira no Beco das Pedras, nas imediações da Rua Padre Mascarenhas, foi a primeira a ter o forro preenchido por lã de ovelha.
— Veio aqui um senhor que é criador de ovelhas e não sabia o que fazer com a lã. Então tiveram essa ideia e implementaram em uma casa, onde diminuiu muito o calor — afirma Nira Martins Pereira, 63 anos, vice-presidente da ONG Coletivo Autônomo Morro da Cruz, que participa da iniciativa.
O senhor a quem Nira se refere é o advogado e idealizador do projeto Francisco Antônio Stockinger, 72 anos. Filho do falecido escultor Xico Stockinger, ele tem cerca de 50 ovelhas em uma propriedade em Bagé. A lã empregada é natural e passa por um processo de lavagem para retirada das impurezas. O material foi trazido da região de caminhão.
— A ideia surgiu a partir do aproveitamento da lã de ovelha que tem excesso de produção na região da Campanha. Comecei a pesquisar usos alternativos e em alguns lugares existe como isolamento térmico. Assim resolvemos fazer um teste aqui — explica Francisco.
Nesta terça-feira (16), a reportagem de GZH esteve no local para conferir a ação e medir a temperatura. A lã de ovelha já havia sido instalada no final do ano passado em três peças da ONG Coletivo Autônomo, onde a medição foi realizada (confira mais abaixo os resultados).
— O teste está dando certo, tem diferença de 5ºC a 6ºC de temperatura entre um ambiente e outro. Oferece conforto térmico e proteção acústica — detalha Francisco, acrescentando que o experimento será realizado também durante o inverno.
O arquiteto Igor Nicolini, 25 anos, participa de projetos voltados à comunidade do Morro da Cruz, onde desenvolveu seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) sobre planejamento urbano. Ele também esteve envolvido no acompanhamento da instalação da lã de ovelha e compartilha que, na periferia, muitas residências ficam insalubres durante o verão.
— A iniciativa procura fazer um tipo de isolamento de baixo custo, com material que seria desperdiçado e que pode gerar um tipo de economia sustentável para o Estado se der certo — observa.
A lã é distribuída entre o forro de madeira de pinus e as telhas de fibrocimento da casa. No espaço em que é colocada, fica com cerca de 15 a 20 centímetros de altura. A quantidade média é de três quilos de lã por metro quadrado.
Alívio para os moradores e as visitas
A aposentada Magda de Medeiros, 74 anos, mora com o neto Levy, 17, na casa de madeira de quatro peças que recebeu a lã há pouco tempo. Ela está feliz da vida com o frescor percebido diariamente no ambiente.
— Ficou bem melhor, inclusive as minhas visitas vinham e permaneciam do lado de fora por causa do calor. Antes, o ventilador ficava ligado dia e noite — recorda.
Magda vive há 28 anos na comunidade do Morro da Cruz, os últimos cinco anos nessa casa. A residência dela apresentava risco de queda, por causa da ação dos cupins, e foi reconstruída recentemente por uma rede solidária vinculada à ONG.
— Às vezes, a gente mede oito graus de diferença na casa da minha mãe na comparação com a minha — conclui a filha Nana Clara de Medeiros, 44, que mora ao lado e não tem lã de ovelha instalada no forro.
Medição
Confira as medições realizadas por GZH, às 11h30min desta terça-feira, na ONG Coletivo Autônomo Morro da Cruz. A temperatura na peça com lã de ovelha estava 6,3°C mais baixa do que no ambiente sem a instalação. Já a diferença da umidade relativa do ar registrada foi de 23,1%.
Sala com lã de ovelha
- 27,5°C (temperatura)
- 79,2% (umidade do ar)
Sala sem lã de ovelha
- 33,8°C (temperatura)
- 56,1% (umidade do ar)