Após a ocupação de um tradicional prédio no Centro Histórico de Porto Alegre, houve um confronto entre manifestantes e a Guarda Municipal na manhã deste sábado (16). Secretários da prefeitura foram ao local para dialogar com o grupo. Foi acordado que uma reunião, com a presença do prefeito Sebastião Melo, ocorrerá na segunda-feira (18), às 17h, para definir o futuro do local.
Ainda nesta manhã, ficou combinado, entre as partes, que após a reunião de segunda-feira o grupo deve desocupar o local. Além disso, conforme o secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, André Machado, Melo definiu, durante o diálogo, retirar o prédio da lista de imóveis que a prefeitura quer leiloar. Também deve ser aberta uma investigação para apurar possível abuso de autoridade por parte da Guarda durante a ação.
No começo da manhã, integrantes do Movimento Nacional De Luta Pela Moradia (MNLM) entraram no prédio onde funcionava a Cia de Arte, na Rua dos Andradas, número 1780. Conforme a Guarda Municipal, houve denúncia da ação e servidores foram ao local.
A prefeitura não informou desde quando o local estava desocupado e nem o motivo para ter esvaziado o espaço. Neste ano, o Executivo havia divulgado que o imóvel seria leiloado, e estimou valor de R$ 5 milhões pela venda. Em março, um anúncio da prefeitura informou que ao menos 12 imóveis seriam ofertados, e que a iniciativa integrava "o planejamento de modernização administrativa da gestão municipal".
Na ação desta manhã, os integrantes do movimento argumentaram que o prédio, há anos, serve para promover cultura e arte, com atividades e oficinas de teatro realizadas nas salas do local. Para eles, o espaço deve seguir com essa atuação e também servir como espaço de moradia popular.
Depois da invasão ao prédio, os manifestantes afirmam que equipes da Guarda Municipal teriam agido com excesso de força, usando gás de pimenta e munição de dispersão não-letal no grupo. O conflito teria começado quando um grupo de pessoas tentou ingressar na rua, que estava isolada, e ir até o prédio para levar comida aos ocupantes. Segundo o grupo, essa entrega de suprimentos havia sido acordada com a prefeitura e a Guarda Municipal previamente, mas não respeitado por guardas que estavam no local.
Em vídeos feitos por quem estava no tumulto, é possível ver agentes aspergindo spray de pimenta e ouvir som de tiros de borracha.
Em uma das imagens, é possível ver a deputada estadual Laura Sito se afastando de agentes após o uso de spray.
— Levei tiro de bala de borracha nas pernas e muito spray de pimenta no rosto, estou enxergando por apenas um olho. Toda essa violência porque eu estava acompanhando uma luta por moradia popular. Mais companheiros do movimento também foram agredidos e vamos denunciar. É um absurdo o que ocorreu aqui — disse ela, que se deslocou até o Palacio da Polícia para registrar ocorrência.
Quem também afirma ter sido agredida é a advogada Marina Dermmam, vice-presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH).
— A Guarda Municipal tinha conhecimento sobre a entrega dos suprimentos, isso estava combinado. Mas no momento que faríamos isso, fomos proibidos de nos aproximar do prédio. Recebi spray de pimenta no rosto, outro colega que estava acompanhando levou ainda um soco no rosto. A Guarda Municipal descumpriu o acordo. Por fim, precisamos subir as marmitas por uma corda, jogada pela janela do prédio.
Prefeitura diz que prédio será destinado a moradia popular
Conforme a prefeitura, o prédio tem a venda autorizada, mas ainda não tinha seu leilão marcado. Nesta manhã, no entanto, o secretário de Habitação, André Machado, conversou com os ocupantes no local e anunciou uma mudança de posição por parte do Executivo.
Segundo ele, Melo foi acionado e concordou, durante o diálogo, que o prédio não irá mais a venda.
— Nós nos comprometemos, hoje, a retirar esse prédio do processo de venda e passa a integrar o plano de habitação de interesse social. O prefeito está ciente dessa decisão e foi ele quem bateu o martelo. Na reunião de segunda iremos definir como essa mudança será feita. Lamentamos que isso não tenha sido feito, desde o começo, em uma mesa de negociação, mas em um processo de ocupação. Mas estou esperançoso que a gente caminhe em um bom sentido.
A ideia é que o imóvel passe por um processo de retrofitagem, em que um espaço é reformado e adaptado para o objetivo almejado, no caso a habitação social. Essa melhoria pode ser feita pela própria prefeitura, por exemplo. Mas há também uma proposta, feita pelo grupo, de comprar o prédio e adaptá-lo, que será analisada pela pasta, segundo Machado.
Neste sábado, a proposta inicial da prefeitura era que o grupo desocupasse o prédio ainda pela manhã e passasse a dialogar com a prefeitura na próxima semana. Diante de uma negativa, ficou acordado que eles deixam o local somente após da reunião com o Executivo.
Guarda Municipal vai investigar atuação de agentes
Em relação a atuação de servidores da Guarda Municipal, um procedimento administrativo será instaurado para apurar as circunstâncias da ação. Cerca de 20 agentes atenderam a ocorrência deste sábado.
— Este tipo de abordagem foge à normalidade das ações da corporação, que são pautadas no diálogo. Nenhum de nós tem interesse no conflito, na violência. Vamos garantir a segurança de todos até a conclusão do processo. Já estamos buscando imagens que tenham captado a ação e demais materiais que nos ajudem durante a apuração - afirmou o comandante da Guarda Municipal, Marcelo Nascimento.
A investigação será realizada pela corregedoria da corporação.