Foi sancionada a lei — aprovada pela Câmara dos Vereadores no começo de abril — que proíbe o comércio, a publicação, a distribuição e a circulação do conteúdo integral ou parcial do livro Mein Kampf (Minha Luta, na tradução do alemão), de Adolf Hitler, em Porto Alegre. As proibições previstas englobam igualmente as publicações em formato digital (e-books).
A Lei 13.493 foi publicada no Diário Oficial de Porto Alegre de quinta-feira (1º). O projeto havia sido proposto pela vereadora Mônica Leal (PP) em janeiro do ano passado.
— O que me preocupa muito é que, nos últimos tempos, um dossiê neonazista da polícia identificou 40 moradores do Rio Grande do Sul que integravam um movimento extremista. O objetivo dessa minha iniciativa é impedir que a obra circule, exalte, incentive e espalhe aquelas ideias de algo que jamais pode acontecer novamente com a humanidade — explicou Mônica, à época, sobre a motivação para propor o projeto de lei.
— Não é admissível qualquer comportamento que remeta ao nazismo hoje em dia. O nazismo despreza a democracia — completou a vereadora, salientando que a fiscalização ocorrerá a partir de denúncias.
De acordo com o texto sancionado, o descumprimento da determinação sujeitará ao infrator, independentemente da apuração da responsabilidade criminal, de forma sucessiva, a:
- apreensão material da obra que estiver em sua posse;
- advertência;
- multa;
- suspensão do alvará de localização e funcionamento do estabelecimento;
- cassação do alvará de localização e funcionamento do estabelecimento, em caso de reincidência.
Já existe uma proibição de venda e circulação da obra restrita ao município do Rio de Janeiro, em função de uma de lei municipal sancionada em 2022. Porém, o livro não está proibido de ser comercializado por lei federal.
O neonazismo é considerado crime no Brasil, conforme o artigo 20 da Lei 7.716/1989, com pena estabelecida de dois a cinco anos de prisão e multa.
A obra
A obra, que é considerada uma espécie de bíblia de propagação das ideias nazistas, caiu em domínio público em 1º de janeiro de 2016, após sete décadas da morte do antigo líder alemão.
Minha Luta foi escrito enquanto Hitler estava preso em Munique, na Alemanha, em 1924. O primeiro volume de dois tomos foi publicado pela editora do Partido Nazista — a Eher-Verlag —, no ano seguinte. A segunda parte saiu em dezembro de 1926.
As principais ideias do livro, em especial o antissemitismo, foram aplicadas durante o período em que a Alemanha esteve sob o jugo do nazismo e no decorrer da Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Os direitos do livro, que pertenciam a Hitler, foram entregues ao Estado da Baviera, por ordem do próprio líder. Mas a Baviera se recusou a republicar e a permitir republicações da obra. Em outubro de 1945, Minha Luta foi proibido de ser divulgado e vendido no território alemão.
Polêmicas em torno da obra
O livro Minha Luta sempre esteve envolto por polêmicas e é tido como um insulto às vítimas do Holocausto. Em janeiro de 2016, GZH publicou matéria dizendo que a publicação havia caído em domínio público. Em um trecho, o histórico da publicação no Brasil é contado:
"No Brasil, Minha Luta foi lançado pela Editora Globo, de Porto Alegre, em setembro de 1934. Proscrito pela ditadura Vargas em 1942, toda a tiragem foi queimada a mando do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Minha Luta só seria reimpresso em 1962, pela editora paulista Mestre Jou. A edição foi apreendida e proibida logo após a publicação de uma portaria de 26/07/1962. Com a ditadura militar, permaneceu vetado. Em 1983, apesar da interdição, foi publicado pela paulista Editora Moraes. Em 1987, a Editora Pensamento, de São Paulo, lançou sua versão, baseada na edição de 1934 da Globo. Em 1990, foi a vez da gaúcha Editora Revisão lançar a sua. Uma nova edição da Editora Moraes, rebatizada como Centauro, saiu em 2001, sendo reimpressa em 2004 e 2005. Novas tiragens foram suspensas após uma série de processos na Justiça em que os donos da Centauro foram acusados de racismo. Com a liberação dos direitos autorais, a largada na corrida pela publicação da nova edição brasileira foi dada pela Geração Editorial, editora paulista que tem por tradição publicar livros considerados 'polêmicos'."