O Viaduto Imperatriz Leopoldina, que passa sobre a Avenida Loureiro da Silva, no centro de Porto Alegre, receberá uma lanchonete no mesmo lugar onde, há seis anos, 700 pessoas em situação de rua recebem almoço gratuito aos sábados. O investimento tem aval da prefeitura, que pretende qualificar e aumentar a ocupação do vão de viadutos da cidade por meio da concessão dos espaços à iniciativa privada.
A novidade pegou de surpresa os voluntários da Prato Feito das Ruas, que cozinham cerca de 1,2 mil marmitas por semana. Em reunião na quinta-feira (26), contudo, a situação ficou esclarecida.
— Fiquei sabendo desse processo quando cheguei na sede para largar mantimentos, na tarde do último dia 11 (de janeiro), uma quarta-feira, e vi funcionários sem identificação da prefeitura, com um guindaste, fixando dois contêineres enormes ali. Sou uma pessoa de diálogo e acredito que vamos resolver tudo com a política da boa vizinhança — contou Rose Carvalho, organizadora do PF das Ruas desde 2016, antes da reunião.
Segundo a secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, a instalação dos contêineres abaixo do viaduto "nunca colocou em risco" o projeto social.
— É importante destacar que, há duas semanas, o empreendedor está se estabelecendo no local e, neste período, não houve descontinuidade da ação (do PF das Ruas). Ocorreu apenas uma readequação para compatibilizar a obra com a atividade social. Vamos ocupar os espaços para revitalizar e conviver pacificamente — disse a secretária.
Na reunião que estabeleceu diálogo entre a prefeitura, os responsáveis pelo empreendimento vencedor do edital e o projeto social, na tarde passada, foi esclarecido que as marmitas poderão seguir sendo oferecidas à população de rua naquele local. Ao mesmo tempo, os contêineres irão operar.
A possibilidade de coexistência entre o empreendimento privado e o projeto voluntário de assistência social existe porque a lanchonete deve posicionar suas mesas e atender o público próximo à Avenida Loureiro da Silva, enquanto o PF das Ruas reúne centenas de pessoas em vulnerabilidade na outra extremidade, no lado voltado para o Centro Histórico.
A permanência do projeto na região era uma reivindicação de Rose e também dos assistidos pela iniciativa. Em reuniões anteriores, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social chegou a oferecer sedes maiores, mas em locais afastados, como o bairro Cavalhada e o Terminal Triângulo, na Assis Brasil.
— Quando circulamos pelas pensões do Centro, a grande maioria me conhece. Isso mostra o efeito que este prato de comida tem na vida deles. Estamos trabalhando também na ressocialização destas pessoas. Queremos uma formalização de permissão da prefeitura para que nós sigamos ali. Pois o prefeito vai mudar e quero que nossa causa siga ali, pois estamos ajudando muitas pessoas — afirmou Rose.
A voluntária segue tentando obter autorização documentada do Executivo municipal para ter garantido espaço para o trabalho embaixo do viaduto. Na reunião de quinta-feira, foi estabelecido que haverá novo encontro da PF das Ruas com a Secretaria Municipal de Parcerias (SMPar) para tratarem da qualificação física daquele local, com menos divisórias que impedem a circulação e mais estruturas para higiene dos moradores de rua.
Adotantes apoiam os voluntários
Os adotantes do viaduto, Joice Eltz e o marido, Danúbio da Silva, proprietários do futuro Xis da Imperatriz, afirmaram respeitar a iniciativa dos voluntários.
— Se depender de nós, o movimento ainda irá melhorar ainda mais. Quanto mais ocupação, mais segurança o viaduto terá. Durante a semana, o local fica abandonado. Queremos mantê-lo sempre limpo, urbanizado, seguro e organizado — comentou Danúbio por meio da comunicação da SMPar.
Concessões avançam na cidade
A SMPar é quem regulamenta as concessões à iniciativa privada dos espaços chamados de "baixo viaduto". Em outras elevadas como a José Loureiro da Silva, que conduz a Avenida Duque de Caxias sobre a João Pessoa, ou a Dom Pedro I, que ergue a Padre Cacique sobre a José de Alencar, e o Viaduto Tiradentes, sobre a Avenida Protásio Alves, iniciativas parecidas já começaram a operar, oferecendo em troca a revitalização arquitetônica do local.
Sem viaduto, mas com a mesma proposta, a Travessa Mário Cinco Paus, ao lado da Rua Uruguai, no Centro Histórico, também foi concedida à iniciativa privada. Um dos próximos locais com esta troca será o viaduto que leva a Avenida Carlos Gomes sobre a Avenida Nilo Peçanha.