De tampinha em tampinha, o motorista de ônibus da Soul, de Alvorada, José Roberto Mello da Silva, 45 anos, enche muitas bombonas e troca o lucro da venda por caixas de leite. A arrecadação das tampinhas ocorre há mais de dois anos e, hoje, ele conta com uma rede de apoio, incluindo passageiros e comerciantes da Região Metropolitana.
Motorista há 26 anos, José ficou conhecido como Loro José, pois quando mais novo fez mechas claras no cabelo. Já sem o cabelo, o apelido ficou e é por ele que o motorista é reconhecido quando se trata do trabalho social que faz há anos.
– Eu participava de outros grupos que levavam comida a moradores de rua, mas achava que a frequência era pouca, acontecia mais no inverno. Queria ajudar de alguma maneira. Em 2019, fiz parte da criação do grupo O Amor e o Bem nas Ruas, e começamos a fazer comida e ajudar com doações de alimentos. Recebíamos bastante comida, que era suficiente para as ações, mas leite sempre muito pouco – relembra José, sobre quando teve a ideia de arrecadar as tampinhas para comprar leite e complementar as cestas básicas.
A ação de José começou a ganhar apoio de amigos, comerciantes e até dos passageiros das linhas Vila Elza, Jardim Aparecida e Umbu, de Alvorada a Porto Alegre. Segundo ele, no ônibus, a arrecadação passou a chamar a atenção de pessoas que ele nem conhecia, mas que gostaram da causa solidária. Dentro da empresa, também há uma bombona para receber as tampinhas trazidas pelos colegas de trabalho.
– Hoje, é difícil um dia que eu não receba tampinhas. No ônibus foi no boca a boca, uma pessoa me trazia doações e os outros viam. Como eu faço amizade fácil, é normal alguém sair do lugar e vir falar comigo – relata o motorista.
Referência
Fora do ônibus, durante os intervalos, José não descansa. Ele usa seu tempo para buscar tampinhas com pessoas que conhecem a causa. Além da distribuição do leite integral, o motorista se tornou referência para doações de leites especiais, fraldas geriátricas, cadeiras de rodas, camas hospitalares, móveis, entre outros equipamentos.
– E se alguma doação chega estragada, eu arrumo antes de entregar para quem precisa, pois sempre tem alguém necessitado. Quando eu levo a doação, tenho o costume de tirar uma foto e mandar para pessoa que ajudou para ela ver a realidade. Muitos que ajudavam diziam que as coisas depois de doadas eram vendidas, mas comigo não é assim. Acabei tendo a confiança de muita gente – explica, ressaltando que credita a doação a quem ajudou, não a si.
A parte de busca e entrega de doações ficou mais salgada com o aumento da gasolina. Mas José também usa dos materiais recicláveis para o combustível do seu carro.
– Na realidade, eu junto latinhas e garrafas pet caminhando, buscando nas lixeiras, nas ruas. Mas esse tipo de recolhimento é só para colocar gasolina. Estou usando bem menos o carro, pois quando dá para ir caminhando, vou a pé. Amigos também doam gasolina – relata.
Aos fins de semana e nas folgas, os trajetos são maiores e ele precisa do carro.
– Tenho os leites para entregar, as cadeiras de rodas e tampinhas para buscar. Vou em pontos na Zona Sul, na Juca Batista e até na casa de uma senhora de Guaíba que guarda tampinhas e lacres. O pessoal que me conhece dos ônibus e vai largando nesses pontos. Quando tem uma quantidade grande, vou lá e busco – conta.
780 quilos de tampinhas
Atento a objetos que podem ser reutilizados ou vendidos para reciclagem, Loro José incentiva conhecidos e passageiros com o exemplo das tampinhas.
– Esses dias no ônibus, um homem perguntou que tipo de tampa eu juntava, expliquei que poderia ser de qualquer tipo. No outro dia, ele me trouxe uma sacola grande com tampas que ele recolheu na obra onde trabalhava. E foi assim, ele disse que vai recolher em toda obra que for – recorda.
Com contatos de três pontos de reciclagem, o motorista também tem apoio dos trabalhadores que separam o material:
– É uma forma que eles encontraram de ajudar, mesmo podendo vender as tampinhas, me chamam para doar.
No mês de maio, Loro José conseguiu levar uma remessa de 780 quilos de tampinhas para a reciclagem, o que reverteu em aproximadamente 40 fardos de leite integral.
– Coisas que são jogadas fora, muitas vezes de forma irregular, podem ser recicladas e destinadas para um fim melhor. Dali dá para tirar alimento para crianças. É muito especial – finaliza.
Quer ajudar?
- Para entregar tampinhas para a compra de leites, basta ir até o endereço na Rua Costa Rica, 218, no Jardim Lindoia, em Porto Alegre, e procurar por Nina (esposa de José).
- Para combinar outras doações, entre em contato pelo número (51) 99513-1186 (Nina).