A revogação do edital de concessão do Mercado Público de Porto Alegre, lançado no ano passado pelo então prefeito Nelson Marchezan, não é um ato isolado da gestão de Sebastião Melo. A ação faz parte de um amplo projeto de revitalização do tradicional ponto turístico e de compras no Centro Histórico. O projeto também prevê, além da pintura e da readequação estrutural, a abertura do segundo piso ainda neste ano.
À frente do programa, que envolve quatro pastas da atual administração municipal, o secretário de Planejamento e Assuntos Estratégicos, Cezar Schirmer, explica que a decisão está alinhada com uma nova visão sobre o complexo:
— A administração entendeu que o modelo proposto de concessão não era o mais adequado. Nem ao Mercado, nem ao interesse público.
Agora, foi dada a largada para uma série de melhorias. Para isso, será celebrado, já na próxima semana, um termo de conversão de área pública (TCAP) com a Multiplan. Trata-se de uma das maiores construtoras de shoppings centers do país, administradora de 5,7 mil lojas, que recebem cerca de 180 milhões de consumidores ao ano. No Estado, é a proprietária do BarraShoppingSul, na Capital, e do ParkShopping, em Canoas. A ideia é que a empresa faça as obras necessárias, principalmente, na parte elétrica, em elevadores e em escadas rolantes, em troca de uma área do município.
Todo procedimento é pensado para viabilizar a aguardada reabertura do segundo piso, fechado desde o incêndio de 2013. O fato também elevaria o potencial econômico do Mercado. Isso ocorre porque os 106 permissionários, hoje, geram receitas de R$ 300 mil aos cofres públicos.
A intenção é reduzir a inadimplência crescente, em razão da pandemia, e adequar valores de aluguéis para elevar a arrecadação em pelo menos 66%, chegando a R$ 500 mil mensais.
Depois de concluído o cronograma, Schirmer diz que existe a possibilidade de efetivar a contratação de uma empresa especializada em administração condominial para fazer a zeladoria do espaço:
— Isso ocorreria nos termos definidos pela prefeitura em edital. O importante é que a gestão, os investimentos e a cobrança dos permissionários, que antes seriam concedidos, seguem públicos.
O Mercado é público
A decisão da prefeitura de Porto Alegre de revogar a concessão do Mercado Público não encerra apenas o imbróglio judicial estabelecido desde junho de 2020. Mais do que isso, o ato, publicado no Diário Oficial de sexta-feira (11), devolve, segundo a Associação do Comércio do Mercado Público Central (Ascomepc), a sensação de segurança aos estabelecimentos instalados no local.
— Recebemos a notícia com gratidão. Por 12 meses, ninguém dormiu tranquilo. Hoje, esse fantasma que desfiguraria o nosso Mercado Público não existe mais. O Mercado continuará público e democrático — desabafa a presidente da Ascomepc, Adriana Kauer.
Os motivos de tamanha desconfiança, segundo ela, estavam nas linhas do próprio edital, lançado no ano passado pelo então prefeito Nelson Marchezan, embargado pela Justiça e pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). Adriana comenta que, para ela, as regras eram pouco claras. Uma delas previa que a empresa vencedora de licitação pudesse reavaliar o modelo de negócio a cada cinco anos:
— Isso também nos assustava. Daqui a pouco, o investidor poderia decidir construir um espigão.
Por essa razão, em janeiro, a Ascomepc apresentou proposta para assumir a gestão do prédio. O levantamento indicava a necessidade de R$ 30 milhões em melhorias estruturais. Já o edital, agora revogado, contemplava aportes de até R$ 80 milhões. Para Adriana, quem acabaria pagando a diferença seriam os próprios "mercadeiros" nos aluguéis:
— Isso oneraria de tal jeito que para permanecer seria necessário alterar o tipo de loja e, eventualmente, modelos que fogem à natureza do Mercado, que é vender para a população com valores acessíveis, para que todos os estratos da sociedade sejam atendidos.