O mutirão realizado pela prefeitura de Porto Alegre para resolver individualmente os empecilhos que impedem a remoção de 111 famílias da Vila Nazaré se mostrou um teste de resistência tanto para os moradores da região quanto para os servidores públicos.
A prefeitura tenta encerrar a transferência das famílias até o final de fevereiro para que, em março, se inicie a obra de ampliação da pista do Aeroporto Internacional Salgado Filho. A próxima remoção está marcada para terça-feira (19). As famílias estão sendo transferidas para o Irmãos Maristas, condomínio de apartamentos no bairro Rubem Berta.
Por volta das 9h30min, cerca de 30 pessoas aguardavam debaixo do sol em frente a um portão que dá acesso a uma área onde o Departamento Municipal de Habitação (Demhab) e a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) atendiam em contêineres. Porém, grande parte dos presentes tentava resolver problemas acima do escopo desses órgãos.
Era o caso de Nelson Laureano da Silva, 37 anos, que se diz impedido de morar no Irmãos Maristas por problemas de segurança que envolvem desavenças entre membros das duas comunidades.
– Eu sei que eu tenho que sair daqui, mas para lá eu não posso ir. Tenho amigos que foram e retornaram porque foram ameaçados. Não posso correr esse risco. Então o que eu quero é uma indenização. Eles me pagam e eu decido onde vou morar – declara o morador, que desejava ter sido transferido para o Condomínio Nosso Senhor do Bom Fim, no bairro Sarandi, para onde foram parte das famílias da Nazaré em 2019.
Já Marco Antônio Rosa, 63 anos, declara que não teria problemas para ser transferido aos apartamentos do Rubem Berta, mas foi excluído por ter renda familiar acima de três salários mínimos, conforme requerido pela Caixa Federal para ser removido ao novo endereço. Informado de que seu caso não teria como ser resolvido hoje, ele desistiu do atendimento.
– Teve gente que fez um cadastro para cada membro da família e ganhou um apartamento para cada um. Eu, que tentei fazer tudo certinho, me ferrei. E aí, como fico? Também sou morador daqui e também não tenho para onde ir.
Os moradores também reclamam das condições de vida na Nazaré ao longo do processo de remoção. Como as casas são demolidas após a transferência das famílias para evitar novas ocupações, quem ainda está lá vive em meio a escombros. Problemas no fornecimento de água e infestações de ratos são algumas das reclamações.
De acordo com a secretaria de Habitação e Regularização Fundiária, casos que não envolvem problemas burocráticos como documentações pendentes ou cadastros incompletos terão de ser resolvidos individualmente entre a Fraport, empresa que administra o Salgado Filho, e os moradores. Enquanto isso, a prefeitura trabalha em melhorias no Rubem Berta.
– Estamos negociando, por exemplo, a instalação de uma usina de reciclagem perto dali para que as pessoas não deixem de se mudar por perderem esse tipo de renda – declara o secretário André Machado, que esteve no local às 11h.
Também houve casos bem-sucedidos ou ao menos bem encaminhados para uma solução. Antes do atendimento, Elton Gomes, 36 anos, e a esposa, Elisiane da Rosa, 31, reclamavam ter sido ignorados pelos cadastros da prefeitura. Segundo Elton, que trabalha como tatuador e pintor, a mãe foi transferida, mas ele não teria como morar com ela com mulher e um bebê de nove meses em um apartamento de 37 metros quadrados.
– Se eles não têm meu cadastro, foram eles que não me cadastraram. Eu moro há 18 anos na Nazaré. Não tem quem não me conheça – declarava Elton antes do atendimento.
No final da tarde, o casal teve a casa cadastrada. Amanhã, deve retornar ao local do mutirão para dar andamento ao processo solicitando a remoção.
Ao final do dia, a prefeitura contabilizou 88 atendimentos - 64 no contêiner e 24 de porta em porta. O mutirão segue nesta sexta, a partir das 9h30min, no acesso à Vila Nazaré pela Avenida Sertório.