As noites no ponto alto do bairro Teresópolis, zona sul de Porto Alegre, são mais iluminadas em dezembro. Na esquina das ruas Antônio Divan e Helena Petenuzzi Santiago, uma casa se destaca, visível mesmo a distância, com estrelas, guirlandas, bonecos de neve e árvores de Natal revestidas por 5 mil lâmpadas pisca-pisca. A sacada, o corrimão da escada e as plantas do jardim também são adornadas para a época de festas. Portas e janelas igualmente levam a moldura colorida.
A tradição de espalhar os enfeites foi iniciada pela professora aposentada Ivani Rocha de Araújo, 73 anos. Natural do Pará, a educadora se mudou para a capital gaúcha em 1972. Recém-casada, trouxe na mala apenas roupa de cama e algumas vestimentas. Trabalhou com educação de séries iniciais e do Ensino Médio e, com esforço, construiu a casa de dois pisos na qual vive desde 1988.
Mais do que exibir a residência, desde o primeiro ano no novo endereço, decorá-la teve um incentivo particular:
— Comecei porque lembrava minha infância, com meus irmãos. Naquela época, a gente usava galho de árvore para decorar e colocava algodão pra ficar mais bonito. Esse espírito sempre ficou comigo — relembra a aposentada.
No Rio Grande do Sul, Ivani teve um filho e um neto, Edson Lang Trindade Vieira — e foi para ele a primeira decoração natalina: uma roupa de Papai Noel, costurada pela avó e usada pelo menino de então dois meses de vida, como mostra uma fotografia guardada com esmero pela família. Na pandemia, o uniforme de bom velhinho vestiu um boneco "consciente", protegido por uma máscara cirúrgica.
O neto, hoje com 20 anos, assumiu o papel de decorador da casa, para evitar que a avó se arriscasse ao pendurar as luzes pelas paredes e no pátio. O jovem autônomo fala com orgulho da responsabilidade adquirida:
— Vale muito a pena. A gente faz para alegrar a vizinhança, ainda mais em um ano tão difícil.
Há mais de três décadas, a montagem dos itens obedece o ritual cristão: no primeiro domingo do Advento — período de quatro semanas antes do Natal —, a casa começa a ser enfeitada.
— O mais legal são as crianças, que passam e até perguntam se neste ano vai ter a casa de Gramado — diz Edson sobre a comparação feita pelos vizinhos.
Enquanto sua mãe e seu filho eram entrevistados na Rádio Gaúcha, na manhã desta quarta-feira (9), o empresário Emerson Vieira, 47 anos, se divertia com os amigos no grupo de WhatsApp:
— Por isso tem tanta queda de luz na região — brinca sobre a mensagem de um dos colegas de futebol, e, na sequência, explica que as lâmpadas, modernas, consomem pouca energia.
O empresário reforça o que foi observado pela reportagem de GZH nas últimas semanas: poucos locais não-comerciais mantêm o hábito de distribuir enfeites por suas áreas externas. Em anos anteriores, concursos buscavam a casa mais decorada da cidade. Atualmente, encontrar uma residência repleta de luzes foi um desafio na Região Metropolitana.
— Ontem (terça-feira), circulei do aeroporto até aqui a Zona Sul e não achei uma casa parecida — complementa Vieira.
O dia de desmontar a estrutura montada pela família de Ivani obedece a data que celebra a chegada dos Três Reis Magos a Belém, em 6 de janeiro, quando entregaram presentes ao Menino Jesus, segundo a tradição cristã.
Até lá, a cozinheira Leci Souza, 70 anos, poderá seguir observando encantada o trabalho dos vizinhos:
— Muito linda, né? No geral, o pessoal ficou mais sem vontade nos últimos anos, que bom que eles continuam decorando.
Ouça a entrevista da avó e do neto na Rádio Gaúcha: