De máscara negra, debruçado sobre uma lista de endereços, o ex-morador das ruas de Porto Alegre Edisson Campos, 35 anos, organiza a rota de entregas. O trabalho começou antes das 7h desta terça-feira (17). Ele mesmo vai pedalar até a casa dos clientes do Amada Massa – Clube de Pães, projeto gerido por pessoas em vulnerabilidade que tiveram a realidade modificada nos quase três anos de atividade da iniciativa, idealizada em 2017, com os primeiros alimentos produzidos no ano seguinte.
– Essa oportunidade mudou a minha vida, mas a gente precisa de mais assinantes - diz o integrante do grupo.
Na segunda (16) e terça-feira (17), pães caseiros multi-grãos foram produzidos, oferta da semana. Há, dependendo do rodízio de sabores, massa à base de batata doce, milhos, pão de maçã com canela e recheados com tomate, cebola e orégano. A base da comida é orgânica, e os ingredientes, veganos, com fermentação natural. Cada unidade chega a ter meio quilo.
Ao se aproximar do espaço onde os pães são assados, Beiço, como Campos é identificado no quadro da escala de tarefas, é interpelado pelo colega, Jones Barbosa, 39 anos, o Dentinho.
– Coloca a touca aí - orienta o amigo.
Ambos deixaram de viver sob marquises, debaixo das quais dormiam protegidos por pedaços de papelão, após receber apoio da padaria. Ganharam cursos e hoje se consideram “padeiros quase profissionais”.
– Mas não adianta só ter a oportunidade, o cara tem que querer trabalhar - afirma Dentinho, que diz ser o madrugador da equipe, de pé já às 5h.
Em abril de 2019, GZH contou os passos do grupo no primeiro ano de funcionamento a pleno. O sucesso inicial, no entanto, foi afetado pela pandemia de coronavírus - o número de novos assinantes reduziu, e as despesas com gás, luz, água e insumos para a produção consomem quase toda a verba arrecadada.
No Instagram, um vídeo chama atenção dos seguidores: nele são detalhados os custos, que alcançam R$ 6,5 mil. Há 90 assinantes fixos, renda que chega perto dos R$ 5 mil. Para complementar o valor, quinzenalmente são produzidos pães para venda unitária, aos não sócios, ao custo de R$ 12 se coletado na sede.
– Sempre fazemos um pouco mais para quem quiser comprar direto com a gente - complementa Campos.
O pagamento dos sete integrantes também sai da mensalidade: R$ 45 dá direito a retirar um pão por semana, diretamente na sede do projeto, entre 7h30min e 18h30min, na Rua Dr. Sebastião Leão, 90, bairro Azenha. Caso deseje receber em casa, desde que viva na área coberta pelos entregadores, o freguês paga R$ 55 por mês.
Na Zona Sul, foi selada uma parceria com o 2T Armazém (Rua Dr. Mario Totta, 675, loja 01), comércio de produtos naturais que também serve agora de base para retirada dos pães da Amada Massa.
Exposição em feiras, produção de pizzas para eventos e produtos sazonais, como panetones e chocotones ajudam a manter o negócio. A venda de hambúrgueres para auxiliar uma das integrantes, internada após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC), também já foi realizada, no início de novembro.
Mais detalhes sobre como assinar podem ser encontrados no site www.amadamassa.com.br ou pelo telefone (51) 9-9800-8670 (com WhatsApp).
Parte da clientela que apoia o Amada Massa pede que os alimentos sejam doados a instituições de auxílio a pessoas em vulnerabilidade. A colaboração incentiva principalmente o público que não mora em Porto Alegre, mas que demonstra interesse em ajudar.
Dan de Oliveira, 25 anos, define o projeto em uma frase:
– É o exercício da coletividade.