Quando o despertador soou, na madrugada desse sábado (22), Sérgio Bica ignorou o frio de 4°C: sabia que logo estaria com calor, pedalando desde sua casa, no bairro Mathias Velho, em Canoas, até o Morro Santana, em Porto Alegre. O jardineiro de 55 anos percorre o caminho diariamente de bicicleta, ora para a Zona Leste, ora para a Zona Sul, conforme a demanda dos condomínios que utilizam seus serviços. O veículo, avalia, é mais que um meio de transporte.
— O exercício me deixa com esse pique todo. Chego lá e ainda trabalho o dia todo. To bem, né? — comenta.
Casado e pai de três filhos, o homem que esbanja energia inicia o trajeto antes das 6h. Veste luvas, uma jaqueta reforçada, máscara negra e um escudo facial de acrílico.
A bike simples, com sinais de ferrugem, carrega uma caixa plástica com o símbolo da Central de Abastecimento do Estado (Ceasa). O baú improvisado transporta uma garrafa de dois litros de suco de uva e uma mochila com as próximas refeições: feijão, arroz com carne e aipim.
Algumas noites, dependendo do serviço previsto para o turno seguinte, ele dorme na propriedade em que atua. Além dos materiais de trabalho, como facão e demais apetrechos, duas bandeiras do Brasil tremulam afixadas nas laterais do caixote.
— A gente tem que torcer pelo Brasil. É o nosso país, não importa o que aconteça — afirma.
O trabalho com jardinagem começou há 15 anos, associando o gosto pelas plantas à necessidade de sustentar a casa. A atividade de segunda a segunda tornou o morador do bairro mais populoso de Canoas milionário. Do jeito que ele define.
— Sou rico sim: tenho saúde e uma família em paz. Dinheiro não é tudo — diz.
Em um período em que o desânimo atinge parte da população, afetada pelas restrições impostas pela pandemia de coronavírus, Bica deixa uma mensagem otimista.
— Não fiquem chateados, se cuidem, e quem tiver que trabalhar saia com disposição. Tendo saúde nada mais falta — orienta, feliz, retomando a pedalada a caminho do trabalho.