O temporal que atinge o RS causou transtornos a moradores zona sul de Porto Alegre nesta terça-feira (30). Nas ruas de chão batido do Lami, quem não tem carro precisou de ajuda. Cadeirante com atrofia congênita nas duas pernas, Igor Saldanha, 30 anos, recebeu apoio do vizinho para sair de casa.
O ambulante enumera as ruas do bairro que sofrem com os constantes alagamentos, vias que são batizadas por letras: A, B, C e assim em sequência, e que pelo relevo irregular parecem receber pouca manutenção.
— Quando bate o inverno, tenho que rezar a Deus, porque é um sufoco. Muitos tem carro e passam batidos por mim. Nem para perguntar se quero ajuda. Vou recorrer a quem? A rua não tem calçamento. É bem difícil para mim — diz, emocionado.
Saldanha vive com o pai na Rua 11, que, iIdoso, depende do filho no dia a dia. A única renda dos dois é a do autônomo, variável conforme o sucesso das vendas dos bilhetes de loteria. A cadeira de rodas motorizada, comprada por R$ 9 mil, estragou em um dos tantos alagamentos que ele enfrentou.
— Um alagamento só e o motor estragou, deu perda total. Fiquei sem ter como sair de casa, sem trabalhar. Aí agora tenho que pagar aluguel (da cadeira que usa) — relembra.
Os vizinhos confirmam o relato e dizem se revezar para não deixar o cadeirante desassistido.
— A cadeira era novinha. Tudo que ele disse é real, a gente sofre muito aqui — conta o vendedor de gás Vagner Bertoluci, 29 anos, na parada de ônibus ao lado de Saldanha.
Na chegada e saída do Lami, pela Avenida Edgar Pires de Castro, asfalto deformado e grandes bolsões d’água atrapalharam o fluxo dos automóveis. No bairro Campo Novo, calçadas ficaram interditadas pela chuva acumulada e o acesso a comércios limitado.
Próximo a Estrada Costa Gama, na entrada do bairro Restinga, muita água na pista foi vista também. No bairro Ponta Grossa, ao menos uma dezena de ruas ficou submersa, próximo a Estrada da Serraria, às 9h. Nos terrenos mais baixos, a água cobria o piso, a poucos centímetros da soleira das portas.
Os moradores reclamam de abandono do poder público, pois a situação se repete a cada novo temporal. Desempregado, Olivio Santos, 50 anos, cruzou a Rua Jacinto de Freitas a pé, com água no limite do cano da bota de borracha.
— Aqui é sempre assim — conta, encharcado dos pés a cabeça.
Após um plantão de 12 horas, a técnica em enfermagem Eliamar Prates, 43 anos, teve de aguardar ainda outras duas horas para chegar em casa: o trecho que percorre a pé, na Estrada Retiro da Ponta Grossa, ficou intransitável para veículos de passeio.
— Todos os anos é a mesma coisa. Não adianta reclamar, nós do extremo sul somos esquecidos (pelo poder público) — afirma, enquanto espera o marido buscá-la na parada do ônibus.
Questionada sobre a situação, a prefeitura da Capital encaminhou a nota abaixo:
"As ruas A, B, C, 11 e outras próximas à Estrada Armando Inácio da Silveira, no Lami, fazem parte de um loteamento irregular, onde não existem redes oficiais de esgoto e pavimentação. A comunidade se organizou para regularizar a área. O projeto topográfico e as soluções possíveis para o local estão em análise nos órgãos competentes. Para tentar amenizar a situação da população, a prefeitura realiza rotineiramente, por meio de diversos órgãos, ações paliativas de limpeza de valas para melhorar a drenagem e patrolamento da via, que poderá ser feito apenas com tempo mais seco."