A imagem de um punk montado num cavalo entrando no Parque Farroupilha com a chinoca na garupa não passaria despercebida pelos motoristas da Osvaldo Aranha, por mais apressados que estivessem. Seria a concretização de uma profecia feita por quatro guris há mais de 30 anos. Amigo Punk virou o grande sucesso da Graforréia Xilarmônica, conquistando todas as gerações de jovens gaúchos que surgiram desde então.
— Acho que é um caso clássico de música mais famosa que a banda — admite o guitarrista Carlo Pianta.
Pianta, Frank Jorge, Marcelo e Alexandre Birck não tinham no repertório da Graforréia músicas gauchescas. As influências, conta Frank, eram Beatles, Mutantes, Jovem Guarda e rock progressivo. Até que alguém lhes provocou a atentar a uma cena nativista que ganhava corpo.
— Me senti desafiado a fazer algo gauchesco, mas misturando toda essa variedade de riquezas musicais — acrescenta Frank.
Registrada pela primeira vez na fita demo Com Amor, Muito Carinho (1988), Amigo Punk foi lançada no disco de estreia tardio da Graforréia Xilarmônica, Coisa de Louco II (1995). Foi cantada no começo do mês em apresentação da banda no Ocidente, onde foi ambientado o trecho da música. Um ponto que junta uma galera jovem, mas que, há trinta e poucos anos, era ainda mais efervescente.
— Além do Ocidente, por ali tinha o Bar do João, o Lola, enchia de maluco até de manhã. Eram muitos punks, pessoal cheirando cola, e chegava uma hora em que o pessoal realmente atravessava a Osvaldo Aranha e entrava no Parque Farroupilha, numa época em que ainda era possível fazer isso — relata Pianta.
O trio já levou esse pedaço do Bom Fim para o Brasil inteiro: Salvador, Belém, Recife, Cuiabá e por aí vai.
— Acho que não era comum uma banda, digamos urbana, de rock, com baixo, guitarra, bateria, cabelo assim, assado, o cara estar mencionando "chinoca", "farroupilha". Por mais que não seja totalmente premeditado, acabou trazendo um universo regional rio-grandense rural, misturando com essa urbanidade e boemia que a gente viveu aos 20 e poucos anos ali — acrescenta Frank.
No aniversário de Porto Alegre, Frank deseja que os moradores se apropriem dos seus espaços (quando a pandemia de coronavírus passar. Até lá, fique em casa!).
Já Pianta, um "porto-alegrensaço total", nas palavras dele, tem um desejo bem específico: queria que a cidade voltasse a ser palco do Fórum Social Mundial:
— Eram bons tempos, de liberdade.
Amigo Punk
Graforréia Xilarmônica
Amigo punk
Escute este meu desabafo
Que a esta altura da manhã
Já não importa o nosso bafo
Pega a chinoca, monta no cavalo
E desbrava esta coxilha
Atravessa a Osvaldo Aranha
E entra no Parque Farroupilha
Amanhecia e tu chegavas em casa com asa
A tua mãe dá bom dia
E se prepara pra marcar
O gado com o ferro em brasa
E não importa se não tem lata de cola
Eu quero agora é sestear nos meus pelego
Com meu cavalo galopando campo afora
O meu destino é Woodstock, mas eu chego
Aonde eu ouço a voz da cordeona
Já escuto o gaiteiro puxando o fole
Vai animando a gauderiada no bolicho
Enquanto eu sigo detonando o hardcore