Em abril de 1964, o velho Salgado Filho — que encerrará sua história de seis décadas nas próximas semanas — testemunhou, em menos de 24 horas, uma montanha-russa de emoções. Na madrugada do dia 2, o presidente João Goulart, o Jango, recém deposto pelos militares, chegou de Brasília ao aeroporto em um avião Avro da Força Aérea Brasileira (FAB).
Era esperado no Rio Grande do Sul por Leonel Brizola e pelo comando do Terceiro Exército, que permanecia aliado ao presidente. Um movimento semelhante ao de 1961, na Campanha da Legalidade, se formava: o povo se mobilizava nas ruas pela permanência de Jango no poder, comenta Flávio Tavares, autor de livros como 1964: o Golpe.
— A tensão toda se voltava para o aeroporto, para a chegada de Jango — conta.
De acordo com reportagem do jornal Última Hora, o avião pousou precisamente às 3h15min. Cinco tanques e aproximadamente 200 soldados esperavam Jango para garantir sua segurança. Primeiro a desembarcar, o presidente deposto entrou no saguão do aeroporto abraçado com o então deputado Leonel Brizola, "sorrindo largamente".
Tavares, o último jornalista a conversar com Jango na saída do Palácio do Planalto, afirma que ele partiu para Porto Alegre se dizendo disposto a resistir — mas não foi o que ocorreu. Após reuniões e dormir por duas ou três horas na Capital, Jango retornou ao Salgado Filho e foi no mesmo avião a São Borja. De lá, seguiria para o exílio no Uruguai. O prefeito de Porto Alegre, Sereno Chaise, leu o pronunciamento do presidente, em que justificava ter optado pelo não derramamento de sangue.
— A decisão do Jango de tomar o Avro da FAB e ir para São Borja mudou a história do Brasil naquele momento, porque deu o triunfo ao golpe de Estado. Se não tivesse viajado para São Borja, se não tomasse o avião, teria necessariamente que resistir — diz Tavares.
A partida de Jango foi um dos maiores acontecimentos presenciados ali pelo jornalista Nelson Moura, que, entre as décadas de 1950 e 1970, foi setorista de aeroporto. Sua função na Folha da Tarde era fazer plantão praticamente todos os dias no terminal antigo do Salgado Filho, atrás de entrevistas inéditas e furos de reportagem com passageiros ilustres que partiam ou chegavam.
Assim flagrou Ted Kennedy, senador americano de 1962 até 2009 e irmão do presidente assassinado John Kennedy, tomando uma cerveja Faixa Azul em uma conexão entre o nordeste brasileiro e Buenos Aires. Também aparece em fotos ao lado do meio-campista Didi, cercado de crianças deslumbradas, pouco após a Seleção Brasileira conquistar o mundial na Suécia, em 1958.
Quando Ernesto Geisel, à época ainda presidente da Petrobras, se recusou a dar entrevista, Moura não poupou nas folhas do jornal: "chegou mal-humorado a Porto Alegre".
— O aeroporto era o cartão de visitas de Porto Alegre e uma fonte de informações importantes. Tudo acontecia aqui, furos internacionais, passagem de artistas, de políticos. Aqui termina a história dele, é uma lástima. Mas vai para o progresso, para um mais novo, né?! — diz o jornalista aposentado, aos 88 anos.
O movimento inusitado de Marlene Dietrich
Estrela de filmes como O Anjo Azul (1930), Marrocos (1930), O Expresso de Xangai (1932) e Desejo (1936), a atriz e cantora alemã Marlene Dietrich ficou minutos em Porto Alegre, mas levou uma multidão ao Salgado Filho em 1959. Na ocasião da morte da artista, em maio de 1992, o crítico teatral e comentarista Claudio Heemann lembrou da passagem dela pelo aeroporto, contando que, quando chegou o avião, o público invadiu a pista.
Ela ficou sorrindo no alto dos degraus por um momento antes de descer — pausa antes do "jogo de conquista", nas palavras de Heemann. Fingiu ter de arrumar a cinta-liga, mostrando as famosas pernas. E "desceu triunfal aos fãs com a naturalidade de quem iria passear na Rua da Praia".
Cercada de gente por todos os lados, a estrela não conseguia se deslocar até a sala de desembarque para carimbar o passaporte. Então usou uma tática improvável: tirou um dos sapatos, levantou acima da cabeça e atirou para o lado. O público correu para disputar o objeto, enquanto ela, capengando com o pé descalço, voltou para o avião. Alguns minutos depois, reapareceu com novos sapatos e um sorriso irônico, dando tempo para a Brigada Militar fazer um cordão de isolamento.
Bênção do Papa a quem estava na pista
A Zero Hora de 6 de julho de 1980 destacava que, na despedida da visita ao Rio Grande do Sul, João Paulo II "mostrou sua espontaneidade". Quebrando o protocolo, o carismático líder religioso fez questão de ir aos operários que esticaram o tapete vermelho sobre o qual pisaria e abençoou-os. Crianças furaram o isolamento para abraçar o Papa e uma pequena multidão se juntou na pista, onde ele deixou "uma confusão generalizada, sorrisos, emoções, lágrimas", conforme descrição da reportagem.
Depois de se despedir de alguns políticos e militares, o Papa subiu a escada do Boeing da Presidência da República. Parou após alguns degraus, abençoou quem estava na pista, recomeçou a subida. Parou de novo, abriu os braços, fez o sinal da cruz. Chegou à porta do avião e, por quase um minuto, permaneceu acenando antes de desaparecer. Às 15h30min, partiu para Curitiba, depois de 22 horas no Rio Grande do Sul.
Recepção com canto do hino do clube
Havia um apelo dos dirigentes do Grêmio para a torcida não ir até o aeroporto Salgado Filho, mas era óbvio que ninguém escutaria. O avião com o time do Grêmio campeão do mundo em Tóquio chegaria ao meio-dia de 15 dezembro de 1983, mas às 9h já tinha gente disputando pelos melhores lugares no terminal para saudar seus heróis. Quando desligaram as turbinas do DC-10 da Varig e a escada foi encostada na porta do avião, milhares de torcedores começaram a cantar o hino do Grêmio.
O presidente Fábio Koff foi o primeiro a descer, trazendo nas mãos a taça de campeão do mundo, símbolo da conquista mais importante do futebol gaúcho até aquele momento. De Renato Portaluppi ao goleiro Beto, todos os jogadores tiveram seus nomes gritados por "uma multidão enlouquecida", de acordo com reportagem da ZH à época. Os jogadores desfilaram em caminhão de bombeiros pelas principais ruas da cidade até o Estádio Olímpico.
Em 2016, torcedores do Inter fizeram festa para receber de volta um dos maiores ídolos da história do clube. Pouco antes das 13h do dia 20 de dezembro, Andrés D’Alessandro desembarcou em Porto Alegre e participou da festa no já denominado terminal 2. O jogador retornava após 10 meses emprestado ao River Plate. Em 2006, após ser campeão do mundo no Japão, o desembarque do Inter não foi no terminal 2.