Protegê-las foi um episódio histórico: mobilizou estudantes, imprensa, polícia e até um diretor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em uma ação ousada ocorrida em plena ditadura militar — e que, para parte dos envolvidos, terminou nas dependências do Departamento de Ordem Política e Social (Dops). Uma das tipuanas que resistiu à tentativa de derrubada para construção do Viaduto Imperatriz Leopoldina, porém, sucumbiu ao temporal do último sábado (27), 44 anos após o protesto. O vegetal caiu no meio da Avenida João Pessoa, atingindo o gradil de proteção do corredor de ônibus.
Ela foi uma das árvores preservadas depois que o então estudante de Engenharia Elétrica Carlos Dayrell subiu em um dos vegetais, que seriam suprimidos, na tentativa de evitar que fossem cortados. Até então inédita, a manifestação transformou o imponente conjunto em marco da resistência e símbolo da luta em favor do meio ambiente.
— Quando saí da Casa do Estudante, vi o Dayrell em cima da árvore, pedindo para que mais gente subisse. Pensei: "vamos nessa". Mas depois a coisa ficou séria — lembra o matemático aposentado Marcos Saraçol.
Juntamente com o colega mineiro e outra estudante, ele foi um dos que subiram em uma das tipuanas da João Pessoa. Ficou lá durante cerca de cinco horas, quando, ao descer, foi preso pela polícia, encaminhado ao Dops, fichado e liberado. A preservação dos vegetais foi uma exigência do hoje agrônomo e ambientalista Dayrell, o primeiro a descer, para encerrar o protesto.
Segundo funcionários da UFRGS, a queda de um dos vegetais ocorreu por volta das 7h, provocando um estrondo. Ninguém se feriu, e a prefeitura efetuou a retirada da árvore ainda durante a manhã. Da tipuana, restaram apenas as frondosas raízes em meio a uma pequena cratera, isolada por uma fita e três cones.
Enquanto algumas pessoas lançavam um olhar rápido para o cenário triste, houve quem sequer tivesse dado falta da árvore. Estudante do 5º semestre de Direito, Ana Santos só se deu conta que o vegetal tinha caído ao ser questionada por GaúchaZH.
— Não tinha reparado. Nunca prestei atenção nessas árvores, mas acho importante mantê-las — disse.
Menos indiferente, o estudante Antônio Cepeda, 20 anos, acreditava que a árvore tinha sido retirada "por um motivo totalmente arbitrário". Lamentou ao saber da queda espontânea.
— Que triste. Com certeza era mais velha que a gente — refletiu.
Em uma postagem no Facebook, o jornalista Paulo César Teixeira, que descreve o episódio em seu livro Esquina Maldita, relembrou a atitude "inédita e corajosa" do então estudante mineiro para proteger as tipuanas. Não foi, no entanto, a "árvore de Dayrell" a vítima do temporal. Aquela em que o hoje agrônomo e ambientalista subiu era das primeiras em direção ao Centro, enquanto o vegetal caído é o quarto no mesmo sentido.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (SMSURB) disse que "é importante lembrar que as demandas prioritárias são de urgência e emergência", e que as tipuanas da João Pessoa não se enquadrariam nesses critérios, e portanto, não tinham previsão de atendimento. Em razão dos acontecimentos de sábado, segundo a pasta, foi agendada para a primeira quinzena uma vistoria nas árvores da região. O serviço deve ser executado pelas equipes de manejo arbéreo da SMSURB.