Desde que virou uma explosão de cores na década de 1990, o Muro da Mauá já foi pintado e repintado diversas vezes. Só que em meio a esse troca-troca de artes na parede do Centro Histórico, em Porto Alegre, há um grafite com status de intocável: na altura da esquina com a Rua General Bento Martins, o rosto de Jesus está estampado há 23 anos.
— Há uma espécie de código de conduta entre grafiteiros. Não pode pintar sobre aquele desenho — diz o artista Paulo Ice, 43 anos.
Projeto do mestre em Artes Visuais Richard John, 52 anos, a pintura foi feita em 1996, na segunda intervenção artística no muro. Cinco anos depois, a parede foi quase toda coberta de branco para receber novos grafites. Mas os artistas optaram por manter aquela gravura. Nos mutirões seguintes — em 2002, 2012 e 2016 —, o velho desenho de Cristo seguiu longe dos novos pincéis.
— Nunca ficou como eu gostaria, mas já nem me importo mais. É gratificante saber que virou uma marca da cidade e que já está há tanto tempo estampada — comenta John.
Segundo o artista, o desenho foi feito por uma técnica de distorção. A imagem deve ser vista por um ângulo diagonal e se forma em diferentes perspectivas. Seja à direita ou à esquerda, o espectador pode ter a impressão de que Jesus retribui o olhar:
— Uma imagem de Cristo mexe com o imaginário das pessoas, e isso me desperta um interesse artístico em desenhá-la. Cada um projeta algo bem subjetivo sobre a figura, e o resultado disso, frequentemente, emociona.