Secretário da Fazenda desde o início do governo Marchezan, Leonardo Busatto passou a ocupar interinamente a pasta da Transparência após a saída do titular, Sandro Bergue, em fevereiro. A seguir, o secretário fala sobre as inconsistências do Portal Transparência, que exibe 1.580 funcionários lotados em estruturas anteriores à reforma administrativa de 2017, e as medidas planejadas pela administração municipal para a área. Confira os principais trechos:
Como o senhor avalia a situação atual da transparência de Porto Alegre, mostrando informações relativas a secretarias extintas?
A gente tem que separar a realidade das questões formais. A forma como se classificam os cargos em comissão no município é peculiar. Quem vem do governo do Estado como eu se surpreende, porque, em geral, os cargos em comissão não são carimbados para um determinado lugar. No Estado, nunca apareceria um cargo em comissão ligado a uma estrutura específica. Aqui no município, é. Com a reformulação administrativa, que foi muito profunda, uma série de decretos e normativas internas teriam que ter sido alterados. Estamos atrasados nisso, a gente reconhece. Os sistemas que estavam montados para uma estrutura anterior estão sendo reformulados, com as nomenclaturas corretas. A gente tem a necessidade de publicar esses decretos com a nomenclatura correta e adequação do sistema. Porém, estamos mudando a forma como isso existe no município. Essa definição do cargo em comissão para funções, além de ser diferente em relação ao Estado, engessa de maneira absurda. Por quê? Tenho, por exemplo, um CC ligado a uma operação de crédito, a um empréstimo que já se encerrou. Tipo o Pisa (Projeto Integrado Socioambiental), que está se encerrando agora. Mas tem um CC criado exclusivamente para o Pisa. Então, a função vai se encerrar e eu não posso pegar esse CC e realocar. Eu tenho que mudar a lei.
A ideia não é extinguir esses cargos em comissão de atividades encerradas?
A gente tem um levantamento de todos os cargos que foram economizados neste período. E a questão que estamos colocando internamente é se enviamos projetos para extingui-los, se bloqueamos os cargos administrativamente ou deixamos para o próximo gestor que quiser usar ou não. A nossa posição — e é uma determinação do prefeito — é de não ocupar todos os cargos em comissão, pela dificuldade financeira. Só que fazer essa extinção de cargos em comissão, que nunca nenhum prefeito fez, pode ser encarado como uma medida populista e prejudicar um outro prefeito no futuro que tenha essa necessidade. O próprio cargo do MetroPOA, que foi o caso mais simbólico, já existe desde que criaram o MetroPOA. Até podemos questionar se tinha que ter criado o MetroPOA e se devemos extinguir ou não o cargo. É uma discussão a ser feita. Agora, o nome do cargo, eu defendo que deveríamos ter mudado no Portal da Transparência. Se tu fores olhar (no Portal) vai ter gente trabalhando na antiga Smic, na Seda, e tão lá. E isso não reflete a transparência necessária que a gente quer dar no governo e a gente tem essa missão de ajustar isso. Vi que Porto Alegre recebeu prêmios de transparência. Com todo o respeito a quem deu o prêmio, mas Porto Alegre está longe de ser transparente. Hoje, no site da prefeitura, ninguém sabe quantas escolas nós temos, quais os professores que dão aulas, que matérias que dão, que horários, quem são os diretores, os servidores, para permitir que a própria população seja fiscal do serviço. O objetivo do prefeito, que está enfrentando barreiras jurídicas, de sistema e até dificuldade de estruturar a secretaria, é que o cidadão chegue no posto de saúde e saiba na porta quais os médicos que atendem lá, quais os enfermeiros, a especialidade, quantas consultas ele teria que atender naquele dia, se está lá, se está atrasado, quanto custa o posto. A gente tem uma visão sobre finanças de que, se não conseguirmos dizer quanto custa uma repartição pública, a gente não consegue fazer um diálogo sobre finanças públicas. Porque uma escola, um hospital, a coleta de lixo, tudo custa caro. E esse custo é suportado com recursos da prefeitura. Até para o cidadão questionar o custo e o resultado. A prefeitura disponibilizar que o cidadão faça o que no inglês se chama de accountability. Quem pode avaliar o trabalho do médico é o cidadão que tem a consulta médica.
Por que não temos isso ainda?
Temos um problema sério de sistema: os sistemas da prefeitura são desarticulados. O sistema de folha de pagamento não está ligado no sistema de materiais ou de despesas _ que diz quanto custa a energia elétrica, a água, o telefone. Tem um embrião que está sendo feito para as escolas. Só que o trabalho depende de alterações no sistema. Aí a Procempa, nossa companhia de dados, que já tem dificuldades de entrega, para piorar, está em greve. Também temos uma dificuldade de estrutura, os servidores não tinham essa visão (de transparência), além da própria Secretaria de Transparência, que é nova e está com uma parte ainda sendo estruturada, seja por problemas de definição do secretário (titular), seja por problema de remuneração, já que a secretaria nova não tem nenhuma gratificação, o que dificulta colocar servidores lá. Então, a gente sabe que tem uma defasagem na entrega dessa questão da transparência.
Quando o senhor projeta a implementação dessas medidas?
Não quero dar prazos, mas estamos próximos de um programa embrionário de definição de custo por escola. Ainda não é o ideal, mas é uma sinalização. Não gostaria de dar prazos porque vou entrar em áreas de sistema, normativa e de estrutura, já que temos uma dificuldade enorme de reposição de servidores. Mas a gente sabe que está devendo nessa área. Agora, o foco está totalmente voltado para resolver a questão financeira, com os projetos na Câmara. Talvez após essa fase, a gente possa tentar buscar (as soluções).
Mas, até o fim da gestão, isso será feito?
Não vou prometer, mas tenho fé que a gente consiga entregar. Não imagino que em mais dois anos e meio de gestão a gente não consiga fazer. Acredito que a gente possa colocar, minimamente, naqueles serviços essenciais _ saúde, educação, coleta de lixo, segurança _ que o cidadão saiba quem está prestando o serviço e em qual horário. Talvez a gente tenha algum avanço neste ano, mas até o final da gestão a gente vai conseguir colocar na Transparência essas informações que o prefeito tanto bateu na campanha, e até avançar em outras questões.
Tem um projeto de estruturação da Secretaria de Transparência aguardando encaminhamento no Gabinete do Prefeito, não?
Exatamente. Esse projeto que está lá depende de envio para Câmara de Vereadores. Estamos aguardando essas pautas dos projetos de finanças para avançar nas mudanças de estrutura da Secretaria.
Por que não se divulgam as agendas diárias do prefeito e dos secretários?
Dos secretários, não vejo problema em divulgar as agendas. Do prefeito, confesso que não sei te responder. Posso perguntar para ele. Sei que a agenda do prefeito é muito dinâmica, mas não sei porque não é publicada.
Parece, ao senhor, interessante a divulgação?
As reuniões formais eu acho que não haveria problema de divulgar.
Esse problema de transparência das lotações dos servidores e CCs é um problema de outro setor da prefeitura, da Gestão, que se reflete na Transparência?
Não dá para colocar só em um setor (a responsabilidade). A gente tem uma dificuldade normativa de como a prefeitura se organiza. Temos um grande problema de sistema. A gente não consegue vencer algumas coisas que parecem meio óbvias para o cidadão comum, que é transformar informações internas em algo palatável para o cidadão comum, e temos uma dificuldade estrutural de pessoas. A gente sabe que está devendo nesse ponto, o prefeito cobra insistentemente melhorias, e tento dar andamento no que é possível como secretário interino, mas não há como negar que há problemas que não conseguimos vencer, em um ano e meio.
A gestão já tem um ano e meio e só houve secretário titular de Transparência por seis meses. Temos perspectiva de um secretário titular?
Sempre foi a intenção ter um secretário que pudesse tirar do papel as promessas colocadas em campanha e no plano de governo. Não é fácil. Tem uma série de dificuldades de (achar) secretários. Quem não é um servidor do Estado, que é cedido, vir pelo salário de secretário não é todo mundo que se dispõe. Profissionais qualificados ganham mais em outros lugares. E tem também a questão do perfil. O prefeito não quer colocar alguém a mais. Um político para preencher uma lacuna. O prefeito prefere tentar achar uma pessoa ideal do que botar alguém que não vai atender (a expectativa) e depois trocar.