Importante líder comunitária da Vila Pinto, na zona leste de Porto Alegre, Marli Aires Medeiros morreu na manhã desta quinta-feira (7), aos 65 anos, em casa, na Capital. Ela lutava contra um câncer no pâncreas havia oito meses.
Natural de Alegrete, Marli trocou o emprego como bancária no município da Fronteira Oeste em 1975 pelo trabalho como zeladora em um prédio no bairro Bom Fim, ao lado do marido. Na década de 1980, mudou-se para a Vila Pinto quando soube de um programa de habitação popular. Tinha início uma trajetória de intensa dedicação à comunidade.
— A primeira coisa que ela nos dizia antes de qualquer ensinamento era que a média das nossas conquistas nunca poderia ser o dinheiro, mas sim as pessoas que a gente conhece, que nos dão carinho, visão de mundo e amor — disse o neto Luiz Henrique, 26 anos.
Uma de suas primeiras iniciativas foi fundada nos anos 1990: o Clube das Mulheres. Marli comandava reuniões semanais entre mulheres que eram fiscalizadas de perto por traficantes. A estratégia para afastá-los era curiosa.
– A gente falava só de menstruação, de “placenta colada” e coisas do tipo até que um homem convidava o outro para fumar um cigarro e não voltavam mais. Aí, sim, a gente descobria quem havia expulsado quem de casa, quem havia sido espancada pelo marido, o filho de quem estava se envolvendo com bandido – contou à Revista Donna em 2017.
Reconhecida por estar sempre buscando investimentos para a região, Marli foi uma das primeiras líderes comunitárias a circular com desenvoltura pelo sistema de participação popular na destinação das verbas municipais, o chamado Orçamento Participativo.
Em 1993, participou por oito meses de um curso, ministrado pela ONG Themis, que promove assessoria jurídica e estudos de gênero. Marli se tornou então uma “promotora legal popular”, cargo criado por diferentes ONGs da América Latina para multiplicar em comunidades pobres o conhecimento de seus direitos.
Entre as muitas conquistas da líder comunitária, estão a criação do Centro Cultural James Kulisz, em 2002, a escola Vovó Belinha, de 2008, e o Centro de Triagem da Vila Pinto, construído em 1996.
Considerado uma das principais iniciativas encabeçadas por Marli, o centro de triagem teve o seu projeto entregue pessoalmente por ela ao então prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro (PT). Marli fiscalizou a implantação até o final.
Em entrevista à Revista Donna, a líder comunitária disse que "se orgulha de ter cumprido as metas ambientais e sociais do projeto para 20 anos em menos de 10. Com um diferencial importantíssimo. Hoje, o local processa mais de 130 toneladas de lixo para reciclagem ao mês e remunera por volta de 45 associadas.
Em 2016, Marli recebeu na Câmara Municipal o título de Cidadã de Porto Alegre. Mais um prêmio marcado pela dedicação ao outro e a valorização das mulheres.
Ela será velada na noite de desta quinta-feira, às 20h, no Cemitério Jardim da Paz, em Porto Alegre. O sepultamento será nesta sexta-feira (8), às 14h, no mesmo local.
Marli deixa o marido, Antônio Geremias Braga, os filhos Ana Cristina, Ana Regina, Ana Paula, Ana Gabriela e João Romário e oito netos (Luiz Henrique, Dimitre, Cristian, Marina, João Vitor, Caio, Guilherme, Gabriel e Arthur).
Prefeitura emite nota de pesar
A direção-geral do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU), que integra as secretarias municipais de Serviços Urbanos (SMSUrb) e do Meio ambiente e da Sustentabilidade (Smams), manifesta profundo pesar pelo falecimento da líder comunitária Marli Medeiros, coordenadora do Centro de Educação Ambiental (CEA) da Vila Pinto, ocorrido nesta quinta-feira (7).
Criado em 1996 graças à iniciativa de um grupo de mulheres lideradas por Marli, o CEA inclui a Unidade de Triagem (UT) Vila Pinto, conveniada ao DMLU. A UT possibilitou a geração de emprego e renda à comunidade, por meio da comercialização dos resíduos recicláveis recebidos no local via Coleta Seletiva.
Esta gestão reconhece o trabalho incansável de Marli, uma parceira de décadas na luta pela correta separação dos resíduos e defesa intransigente por uma cidade limpa e sustentável. Lamentamos a triste notícia e prestamos solidariedade aos associados da UT Vila Pinto, bem como aos demais familiares, amigos e toda a sociedade.
Marli deixará saudades.
René José Machado de Souza, diretor-geral do DMLU, Ramiro Rosário, secretário municipal de Serviços Urbanos, e Maurício Fernandes, secretário municipal do Meio Ambiente e da Sustentabilidade