A troca no comando da revitalização do Cais Mauá, em Porto Alegre, em fevereiro, ocorreu em meio a crescentes questionamentos sobre a atuação da empresa que administrava o fundo de investimentos destinado a financiar o empreendimento gaúcho.
Substituída dois dias antes da autorização para o início da obra na Capital, a ICLA Trust recebeu, naquele mesmo mês, uma inspeção do Tribunal de Contas do Estado do Tocantins (TCE/TO), mesmo Estado onde é ainda citada na Justiça por suspeita de perdas milionárias por operações em outras regiões do país. Nesta quinta, foi alvo da Operação Gatekeeper, da Polícia Federal, que investiga fraudes em fundos de investimento e cumpriu mandados de busca e apreensão em Porto Alegre e no Rio de Janeiro.
No Tocantins, a apuração para averiguar eventuais irregularidades foi aberta em razão de um aporte de R$ 30 milhões feito pelo Instituto de Previdência Social do Município de Palmas (Previpalmas) no projeto do Cais Mauá por meio da ICLA. Na Justiça tocantinense, tramita em paralelo um processo envolvendo prejuízos em investimentos geridos pela empresa quando ainda utilizava a denominação NSG, e que não têm relação com o cais de Porto Alegre.
A ICLA é uma administradora de fundos de investimento com sede no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro. A empresa capta recursos de investidores por todo o país, incluindo muitos fundos de pensão, e destina esse dinheiro a fundos de investimento em renda fixa, ações e participações em empreendimentos como o Cais Mauá. Nos últimos meses, se avolumaram as suspeitas sobre sua atuação.
A inspeção determinada pela Resolução 41/2018, publicada em 21 de fevereiro no Boletim Oficial do TCE tocantinense, foi solicitada pelo conselheiro Alberto Sevilha. As razões para o procedimento foram explicadas no Requerimento 02/2018, e acatadas pelo plenário do tribunal. Sevilha argumenta, no documento, que a ICLA Trust, quando utilizava o nome de NSG Capital, seria "suspeita de perda em aplicações no montante de R$ 400 milhões do Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Tocantins" (Igeprev).
Esse recurso teria sido aplicado, de forma temerária, em um fundo da churrascaria Porcão, que teve falência decretada pela Justiça do Rio de Janeiro no ano passado. O processo 0018056-93.2015.827.2729 da Justiça do Tocantins, porém, cita um valor menor de efetivo prejuízo. Na decisão em que aceitou a denúncia de improbidade administrativa envolvendo gestores do Igeprev, o juiz Manuel de Farias Reis Neto sustenta que a então chamada NSG "adquiriu ativos de empresas com alto risco de crédito como a Brasil Food Service Group S/A (Porcão) e Banco BVA, no total de R$ 49.570.000,00, sem consultar os relatórios de avaliação de risco de crédito (...) demonstrando-se a má-fé da requerida em realizar investimentos em um banco e empresa que já apresentavam previsão de perdas, causando, ao tempo, prejuízo ao Igeprev no montante de R$ 14.725.168,43".
Já na resolução que determinou a investigação do Tribunal de Contas sobre a ICLA, em fevereiro, ficou determinado que seriam apurados pontos como "verificar a existência de atestado de capacidade técnica da ICLA" e "comprovar a capacidade técnica dos gestores e apresentar declaração patrimonial de cada gestor".
O relatório, finalizado no mês passado, apontou suspeitas de irregularidades no aporte feito para a antiga gestora do Cais Mauá. Um dos principais problemas apurados é que uma norma estabelece que a entidade poderia aplicar, no máximo, 5% de seu patrimônio líquido em um mesmo fundo. Os R$ 30 milhões destinados ao cais representaram 15%. Outra inconformidade é o fato de que, pelo investimento prever um período de carência de 12 anos, teria de ter sido submetido ao Conselho Municipal de Previdência, o que não ocorreu. As conclusões foram submetidas ao Conselho de Previdência de Palmas para "subsidiá-lo nas tomadas de decisão acerca das providências cabíveis".
GZH entrou em contato com a ICLA, no Rio de Janeiro, e solicitou um posicionamento sobre as suspeitas. Até o momento, a empresa não se manifestou.