Convocada por e-mail pouco mais de 15 minutos antes de ocorrer, após uma tarde tumultuada na Câmara Municipal, uma sessão extraordinária fora da plenária e sem a participação da oposição foi o cenário da aprovação do projeto de lei complementar que prevê o aumento da contribuição previdenciária dos servidores municipais. A proposta foi aprovada por 20 votos a seis na noite de quarta-feira, na Sala das Comissões.
Contrárias ao projeto, as bancadas do PSOL e do PT criticaram a atitude do presidente da Casa, Cássio Trogildo (PTB), de realizar a convocação minutos antes, depois de uma sessão marcada pelo conflito – alguns servidores chegaram a invadir a tribuna e o espaço da Mesa Diretora. Para a líder da oposição, Fernanda Melchionna (PSOL), o chamamento em cima da hora infringe as normas internas do Legislativo. Alegando não terem sido convocados, os vereadores Aldacir Oliboni e Alexa Fraga ingressaram com requerimento pedindo a anulação da votação na tarde desta quinta-feira.
– Fazer uma sessão na calada da noite, cercada pela polícia, que devia estar fazendo o policiamento da cidade, é uma manobra autoritária – avaliou Melchionna.
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Apesar do contexto incomum – as sessões extraordinárias são frequentes, mas geralmente ocorrem no plenário –, a reunião que aprovou o aumento de 11% para 14% da contribuição previdenciária não fere o regimento da Câmara Municipal. Segundo o diretor legislativo, Luiz Afonso Peres, diferentemente das convocações extraordinárias, que exigem um período mínimo de 48 horas de antecedência para serem convocadas, sessões extraordinárias podem ocorrer a qualquer momento. Também não há impeditivo para que as votações sejam realizadas fora do plenário, desde que dentro das dependências da Casa.
– Pode-se questionar se o tempo de antecedência foi razoável para que todos pudessem participar. Mas, olhando do ponto de vista frio do regimento, não tem nenhum problema – disse.
A votação que aprovou o projeto estendeu a tensão que marcou a tarde na Câmara. No comando dos trabalhos durante a ausência de Trogildo – que analisava um recurso da oposição –, o vereador Valter Nagelstein (PMDB) resolveu pôr fim à discussão antes da votação, depois de uma confusão: a certa altura, parte dos servidores que assistiam à sessão invadiram o local reservado aos vereadores. Houve empurra-empurra, e uma funcionária chegou a subir na mesa de votação.
Ao fim da sessão, Nagelstein chamou alguns líderes para uma reunião na sala da presidência. Sem a presença da oposição, as lideranças aprovaram a convocação de uma sessão extraordinária para apreciar a proposta. O chamado foi enviado por e-mail aos vereadores às 19h58min. O encontro estava marcado para as 20h15min.
– O trabalho foi violentamente interrompido sem motivo. Os vereadores solicitaram que fizéssemos a sessão extraordinária porque só faltava a votação. Tanto é que foi resolvido em menos de meia hora – disse o presidente Trogildo.
Conforme o parlamentar, a opção de fazer a votação fora do Plenário Otávio Rocha se deu em função da "invasão" dos servidores – alguns permaneceram no local após o encerramento dos trabalhos. Para o líder do PMDB, Idenir Cecchin, a opção foi acertada:
– Participei da reunião de líderes: estavam todos, menos o PT e o PSOL, que estavam junto com os invasores. A Câmara tinha de fazer a votação ontem, porque o parlamento não pode se dobrar ao grito. Achei que foi uma resposta tranquila e serena – argumentou.
Dispersos após a sessão, alguns vereadores da oposição se disseram surpreendidos pela convocação. Para a vereadora Sofia Cavedon (PT), que acompanhava um servidor detido e levado ao Palácio da Polícia quando recebeu a convocação para a votação, não havia condições de se realizar a apreciação do projeto na quarta-feira.
– Para essa reunião de líderes, não fomos chamados. Estava cada um em um lugar quando veio a convocação por e-mail. Fiquei sabendo por um assessor. A Fernanda (Melchionna) e o (Aldacir) Oliboni ficaram no plenário, com medo de dar conflito com a polícia. Em momentos de consenso, já suprimimos os prazos do regimento para votar projetos. Mas, sem consenso, não – relatou.
O projeto que eleva a alíquota de contribuição dos servidores já chegou à mesa de votação em meio a controvérsias. Segundo o parecer da Procuradoria da Câmara, que analisou a parte técnica, a proposta é inconstitucional. A avaliação foi a mesma do relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Márcio Bins Ely (PDT). Como o relatório de Bins Ely dividiu opiniões – três integrantes da CCJ se mostraram favoráveis, e três contrários –, a posição da CCJ não foi considerada, o que possibilitou a votação. Caso tivesse sido reprovada pela CCJ, o documento teria de passar por outras comissões antes de ser apreciado.