A projeção de que Porto Alegre fechará o mês no vermelho pela primeira vez no ano levou a prefeitura a anunciar parcelamento dos salários de servidores municipais ainda para junho.
Isso acirrou os ânimos em uma relação já abalada após o envio de projetos à Câmara em abril, que atingiriam a categoria. O primeiro foi retirado pela prefeitura diante da certeza de derrota, mantendo o reajuste automático da inflação nos salários. Os vereadores ainda devem votar a proposta que prevê a elevação da alíquota previdenciária dos servidores
Confira os argumentos e opiniões de prefeitura, servidores e parlamentares
O prefeito
Mesmo antes de assumir a prefeitura, Nelson Marchezan já anunciava como nebulosa a situação financeira de Porto Alegre – em dezembro, a comparou à crise do Estado, dizendo que é "percentualmente bem pior". Começou a gestão suspendendo, por 90 dias, o pagamento de dívidas herdadas do governo José Fortunati e apostou em medidas como a diminuição no número de CCs e o corte de despesas. Em abril, enviou para a Câmara um pacote de projetos.
– A situação de Porto Alegre é caótica. Se não tiver um conjunto de ações, nós não vamos sair do fundo do poço em que nos encontramos – diz o prefeito.
Mas parte dos projetos enviados à Câmara é bombardeada por servidores públicos, assim como o anúncio de parcelamento. Marchezan é acusado pela oposição de ter "elegido o funcionalismo como inimigo". Sobre isso, afirma:
– Do ponto de vista de um sindicato absolutamente partidarizado, é um bom discurso.
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A líder da oposição
A vereadora Fernanda Melchionna (PSOL) critica o discurso e as medidas do governo – que, segundo ela, atacam direitos dos trabalhadores e criam "uma bola de neve" prejudicial à economia da cidade:
– Ele (o governo) pinta o caos para justificar o não cumprimento de suas promessas de campanha e não ataca a crise onde tem de atacar.
A parlamentar defende cobrança de IPTU progressivo, ampliação da receita por meio da dívida ativa, discussão de isenções municipais e diz que é necessário reaver os recursos da corrupção.
– É um projeto contrário ao que Marchezan está fazendo. Ele apoia um projeto que, na verdade, é o caos: arrocho salarial, ataque ao serviço público e privatização – ressalta.
O servidor
O assistente administrativo Guilherme Menezes da Silva, 34 anos, repete algumas vezes a expressão "angústia" ao falar da vida de servidor público de Porto Alegre nas últimas semanas.
Ele acompanhou apreensivo o envio à Câmara Municipal de projetos que atingiriam a categoria à qual pertence e se preocupa com os parcelamentos de salários que a prefeitura anuncia:
– Tem gente que tem filho, que tem um milhão de coisas. O pessoal vai ficar muito bravo.
Formado em Ciências Sociais, o funcionário da Secretaria Municipal de Esportes (SME) relata que é oneroso trabalhar em um ambiente tomado pelo clima de insegurança e acredita que até mesmo para o governo seria mais vantajoso "atuar com o funcionalismo estando em paz".
Guilherme defende auditoria na situação financeira e audiências públicas:
– Há vários caminhos antes de chegar ao funcionalismo.
O líder do governo
Na quarta-feira, Clàudio Janta (SD) precisou pedir a retirada de votação do projeto que desobriga o Executivo a conceder reajustes anuais automáticos de acordo com a inflação. O governo corria contra o tempo para adotar a medida já em 2017 (a data-base da reposição é maio), mas não conseguiu reunir os votos necessários. Janta credita ao "ritmo" dos parlamentares a derrota:
– As coisas foram muito rápidas. Esse projeto tinha data.
A Câmara vem de um ritmo de governo, agora tem um ritmo mais moderno, mais ágil, e a Câmara não se adaptou.
O vereador defende que a crise tem remédios – "alguns, inicialmente, amargos".
– Ninguém é malvado, ninguém quer atrasar salário de funcionário público ou deixar de dar reajuste para as pessoas. Mas é uma das saídas – conclui.